O BÊBADO E O FIM DO MUNDO
Renato Ferraz
O bêbado soube que o mundo ia se acabar.
Ele perambulava pela rua, não tinha onde morar.
Correu desesperado, entrou logo em um bar.
O primeiro que viu, pediu uma garrafa para tomar
Ganhou na insistência, depois que começou a chorar
Com o pensamento confuso, mas tentou raciocinar,
Para aguardar o fim do mundo, teria que beber devagar
A preocupação era morrer sem a garrafa secar
Resolveu, então, que iria pequenas doses tomar
Queria assistir de olhos abertos o mundo acabar
De repente o passado começou a lembrar
Seu pai morreu novo, também bebia sem parar
Outras coisas da vida, não conseguia lembrar
A memória mais recente era das calçadas de bar
Em seu último dia queria de saudade boa, lembrar
Consumiu metade da garrafa, viu um anjo chegar,
Com asas abertas, parecia vir lhe buscar
Alegrou-se, será um sinal, ele veio me salvar?
Ouvira que no último dia Jesus iria voltar
E que preferiria primeiro os bêbados hora de levar.
Lembrou o trecho de uma oração e começou a rezar
Emocionou-se muito ao sentir o mundo iria acabar
Falava alto, cantava, depois pôs-se a chorar
Chegou uma legião e ao seu redor se pôs a cantar
Passou um vulto, reconheceu a figura de Jesus passar.
Tentou correr atrás, mas não conseguiu levantar-se
Jesus estava sério, temeu que viesse com ele brigar.
Surpreso, morreria feliz, ele veio lhe abraçar
Fechou os olhos e em coma veio a desmaiar
Esse foi mais um porre que o pobre veio tomar
Acordou no hospital sem saber se tudo acabou ou iria acabar
Que foi abraçado por Jesus, disso conseguiu lembrar.
Tinha esperança de que após a morte tudo fosse mudar
Como era pobre ficaria rico, sua vez estava por chegar
Certeza não havia, ninguém voltou para confirmar
Esse foi o delírio de um alcoólatra que resolvi contar
Se exagerei na dosagem, peço ao leitor para me desculpar.
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