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Ensaios-->Leitura ou "lei-dura": entre a espontaneidade e a obrigação -- 11/04/2000 - 16:03 (Atila Tolentino) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos
LEITURA OU “LEI-DURA”:
ENTRE A ESPONTANEIDADE E A OBRIGAÇÃO
Átila Bezerra Tolentino*

I - LEITURA: FONTE DE SABER E REALIZAÇÃO

É inquestionável a relevância que a leitura tem para a sociedade e sobretudo para a realização pessoal de cada indivíduo. No processo de desenvolvimento de uma sociedade, principalmente nos dias atuais, em vista do grande progresso eletrônico e tecnológico, o conhecimento é de suma importância e o livro ainda é o caminho, o meio para se chegar a ele.
Na verdade, a leitura, através da história, sempre foi uma forma de aprendizagem e de se chegar ao conhecimento. Saber ler e escrever, já entre os gregos e os romanos, significava possuir as bases de uma educação adequada para a vida, educação essa que visava não só ao desenvolvimento das capacidades intelectuais, como também das aptidões físicas, possibilitando ao cidadão integrar-se efetivamente à sociedade, no caso à classe dos senhores, dos homens livres. Na Idade Média reservava-se a pouquíssimos o privilégio da leitura, suas bibliotecas ficavam em monastérios, acessíveis a uma pequena classe dominante, detentora do poder e do “conhecimento”. Mesmo depois do século do Humanismo, ela (a leitura) só era acessível a uma elite culta.
Somente nos últimos tempos, com o desenvolvimento tecnológico e econômico, o livro se tornou acessível à maioria das pessoas, devido à grande necessidade e à exigência que se faz da colaboração intelectual e da participação dos indivíduos no progresso da sociedade, em que os livros e a habilidade do leitor são essenciais. Os livros têm sido há séculos, portanto, portadores de conhecimento, transmitindo-o de uma geração para outra.
Por outro lado, não se deve considerar a utilidade da leitura apenas para o progresso da sociedade. A leitura é também um meio de desenvolvimento da personalidade, deve ser considerada importante tanto para a vida social e cultural do homem, como para a vida individual. Se assim não a considerarmos, estaríamos alfabetizando o indivíduo para que ele seja mais produtivo ao sistema: por exemplo, para que leia e compreenda instruções escritas no trabalho, para que leia e compreenda ordens e mandamentos que zelam a todo custo para a manutenção da ordem. Para além disso, a alfabetização não parece tão necessária: a manipulação ativa da escrita (o ato de escrever, por exemplo) se faz dispensável pela imposição de fórmulas já prontas, por modelos estabelecidos e já consagrados em manuais de ampla difusão . (Osakabe, 1986, p. 150)
O meio mais eficaz para o desenvolvimento da personalidade é a leitura da literatura. A literatura abre possibilidades de leitura, faz com que o leitor reflita, dialogue com o próprio texto e com outros leitores. O texto literário é plurissignificativo, permite diversas leituras justamente por seus aspectos em aberto, por isso acaba fornecendo ao leitor uma gama muito maior de informações. A riqueza polissêmica da literatura é um campo de plena liberdade para o leitor, o que não ocorre em outros textos. Daí provém o próprio prazer da leitura, uma vez que ela mobiliza mais intensa e inteiramente a consciência do leitor; sem obrigá-lo a manter-se nas amarras do cotidiano (Aguiar & Bordini, 1988, p.15).


II. A TAREFA DA ESCOLA E AS QUESTÕES SOCIAL E CULTURAL

Sabemos que numa sociedade subdesenvolvida como a nossa, as dificuldades são maiores para o professor, principalmente o da escola pública, tanto por fatores de aperfeiçoamento profissional como pela escassez de recursos materiais. O professor deve ter em mente que ainda é atribuído unicamente à escola o difícil papel de levar o conhecimento ao indivíduo, quando a atuação da família e da sociedade também é de extrema importância. É necessário ao professor também saber como agir com a indisponibilidade financeira de seus alunos para comprar livros e como usufruir das bibliotecas, escolares e públicas, ainda que não possuam um grande acervo.
Partindo da premissa de que a leitura da literatura é importante para todos, pergunta-se por que a escola não tem conseguido grande sucesso na formação de leitores e por que os alunos têm aversão à literatura, como também o hábito da leitura é raro entre as pessoas. Isso evidencia que o ensino da língua portuguesa nas escolas de níveis fundamental e médio não anda tão bem, acarretando graves conseqüências para a vida do indivíduo e para a sociedade.
De uma certa forma, a escola sozinha não pode resolver eficazmente esse grande problema. Vários são os fatores que contribuem para o agravamento da situação. Primeiramente, há a questão social, que envolve programas nacionais de saúde pública e bem-estar social. Se a nossa sociedade não possui renda média suficiente nem para alimentação e moradia, a compra de um livro será um “luxo”, totalmente dispensável.
Daí decorre o segundo problema, de questão cultural: se a criança não vê o hábito da leitura na figura dos pais, nem em qualquer outro membro de sua família ou nas pessoas com quem convive, não há por que a criança ou o adolescente enxergar a sua utilidade. O exemplo começa sempre em casa. Deste modo, se a criança ainda não tem o contato com o valor da leitura quando do início da alfabetização, o trabalho da escola e, conseqüentemente, do professor será dobrado.
A biblioteca, por sua vez, também possui um importante papel. Ela não pode ser concebida apenas como um “depósito” do acervo bibliográfico ou como o órgão de prestação de serviços para o atendimento de necessidades momentâneas ou ainda, o que é pior, como o local de castigo para onde os professores mandam os alunos indisciplinados. A biblioteca é comumente tratada como o lugar do silêncio, não o silêncio da reflexão, mas o silêncio que tolhe, que emudece. Antes de tudo, ela deve promover situações objetivando o incentivo ao hábito da leitura, fazendo com que os livros circulem de suas estantes, tais como exposições e feiras do livro, encontros e debates com autores, seminários, concursos, jogos de leitura, com o objetivo maior de despertar a imaginação e a criatividade e conduzir ao gosto pela leitura. (Zilberman, 1989, p. 19)
Tudo isso demonstra a difícil tarefa que a escola tem, pois, de qualquer maneira, ela é que terá o papel de formar os leitores, é nela que o aluno irá adquirir a habilitação inicial na prática da leitura. Infelizmente é incumbido à escola superar todas essas dificuldades sociais e culturais. Assim, deve o professor estar ciente das complicações por que passará, cabendo-lhe proporcionar ocasiões para que seus alunos tenham acesso aos livros, procurando despertar neles o gosto e o costume pela leitura, e trabalhar conjuntamente com a biblioteca, de modo que os seus livros sejam usufruídos e lidos pelos alunos. Para tanto, há que se ter em mente que o importante é o aluno adquirir o gosto pela leitura através do prazer de ler, não em função de cobranças escolares. Deste modo, o aluno irá ler sempre e não somente quando for obrigado pela escola, para lhe acrescentar pontos à nota bimestral.
Na verdade, o que acontece é que quando o aluno aprende a ler (entendido aqui como a decifração da palavra escrita), começa o processo de destruição da literatura. A escola entende que ensinar a ler é ensinar a decodificar a palavra escrita. No entanto, isso o aluno aprende no primeiro ou nos primeiros anos de estudo e infelizmente a leitura não é mais ensinada a partir desse estágio.
O que a escola precisa saber é que a leitura se inicia antes mesmo que a criança aprende ler e continua por toda sua vida. Está impregnada nessa concepção a célebre frase de Paulo Freire : A leitura do mundo precede a leitura da palavra escrita. A criança, ao nascer, já começa a ler o mundo à sua volta: as feições da mãe, o atendimento de suas necessidades primárias, o clima, etc. E a leitura do mundo permanece, sempre. Com a aprendizagem da decodificação da palavra, começa, então, a leitura do escrito. Com a literatura, abre-se a porta para uma nova visão do mundo, o aluno encontra outra forma de leitura. No contato com a literatura, será permitido ao aluno a contraposição de sua visão de mundo com o que está escrito, pois a literatura, por si só, estimula o diálogo.
Porém não é assim que a literatura vem sendo concebida nas nossas escolas. Tal fato faz com que, uma vez alfabetizada, a maioria das pessoas se limite à leitura com fins eminentemente pragmáticos, mesmo suspeitando que ler significa interiorizar-se no mundo e deixar de enxergar com os olhos de outrem e construir sua própria visão.


III. TEXTO LITERÁRIO E ESCOLA: OBRIGAÇÃO OU PRAZER?

A leitura não é um projeto ingênuo, antes ela é um processo da leitura da ideologia que está subjacente à palavra. Uma das funções da literatura é desalienar as pessoas, promover a discussão do que está escrito e dos aspectos ideológicos que rodeiam esse escrito, explorando as diversas possibilidades de leitura que oferece o texto literário.
A escola, entretanto, insiste em permanecer no pedantismo gramatical. Nesse ponto, a literatura, em termos de produção, avança, e a educação regride, pois persiste na preocupação com ensino voltado à valorização da nomenclatura gramatical, ao ensino reprodução, que não procura buscar uma postura libertadora e crítica, soltando as amarras desse ensino que não promove a criação e, conseqüentemente, não gera o prazer.
A literatura sempre foi utilizada como muleta para o ensino da gramática ou simplesmente para a interpretação superficial do texto. Ela é tratada como um trampolim, um pretexto para ensinar outros assuntos - já é bem conhecida a clássica forma de se estudar análise sintática através dos sonetos de Camões ou sugerir (impor) a leitura de um romance para a elaboração de um resumo da obra ou preenchimento de uma ficha de leitura, de modo que se possam acrescentar pontos à nota bimestral do estudante. Que função, portanto, terá a literatura se assim for tratada? Servirá apenas para identificação dos termos da gramática normativa ou será uma fórmula para subsidiar a não reprovação de ano. Fora da escola o aluno não precisará disso, não terá essa necessidade, dessarte, não lerá.
Entra nessa questão a dicotomia entre obrigação e prazer. O aluno lê na escola (e somente na escola) porque é obrigado e não porque é estimulado. A leitura, conforme vem sendo encaminhada, não cumpre as suas mais fundamentais funções, nem mesmo a lúdica, posto que a leitura imposta, “para nota”, com objetivos previamente traçados, mata qualquer tipo de prazer que o desvendamento do texto escrito pudesse trazer.
Especificamente no ensino médio, as aulas de literatura privilegiam o ensino enciclopédico da literatura (Vieira, 1989). Os professores seguem o padrão dos livros didáticos, ou seja, tratam a literatura dividida em estilos de época, compartimentalizada como se cada estilo fosse uma gaveta, contendo os autores que produziram em sua geração. São consideradas literárias somente as obras produzidas segundo as características daquele determinado período. O que dizer, então, de Sousândrade, que está sendo descoberto agora, haja vista que sua obra em nada segue os moldes dos românticos? E quanto a Machado de Assis, que forçosamente foi enquadrado como um realista?
É necessário fugir da relação diacrônica em que a literatura é ensinada, romper com tal diacronismo. Nas escolas de ensino médio, é cobrado do aluno a repetição de uma história que na verdade nem é uma história da literatura, é um cânone estabelecido que ele nem sabe quem criou. O aluno tem de repetir uma história da literatura que não é artística nem científica. A literatura é engaiolada, posta em gavetas. Assim, do mesmo modo como ocorre no ensino fundamental, o aluno do ensino médio não cria e mantém-se o ensino reprodutor.
Ao ensino da literatura não deve ser atribuída a transmissão do patrimônio escrito já constituído e consagrado, antes deve ser priorizada a formação do leitor. Contudo, a escola não se preocupa com a formação do leitor. Tem como objetivo simplesmente que o aluno assimile a tradição literária, como se assim fazendo se transformasse em um apreciador da literatura.
Por esse prisma, o vestibular também será uma influência negativa no ensino de literatura. Os moldes desse exame ainda se pautam na valorização da história da literatura, portanto, o professor, além de, por um lado, já estar excessivamente preocupado com o cumprimento do programa, por outro é pressionado a transmitir a consagrada história da literatura, tendo em vista a necessidade dos alunos de obterem sucesso no vestibular.
Hajam vista problemas dessa natureza que à leitura na escola, sobretudo à leitura de obras literárias, não vem sendo dado o prestígio devido. A escola não se dá conta que a leitura exige um processo de discussão, de contraposição de idéias, de análise da ideologia do escrito. Em conseqüência, a literatura nunca é dialogada com os alunos, é apenas imposta. Já começa pela escolha da obra a ser lida, que não pode ser diferente das indicadas no programa, além de que a aula de literatura se resume à seqüência de atividades estáticas, ditada pelo livro didático.
Para reverter a situação, o professor de literatura precisa assumir uma postura de ensino que visa não repetir as mesmas falhas, em que os alunos não criam, apenas abstraem o conteúdo ensinado acriticamente, só acumulam informações e somente reproduzem, numa atitude passiva. O método que vai utilizar necessariamente tem que intuir o resgate do caráter emancipatório e libertador do ensino da literatura.
Ressalte-se que o ensino de literatura é essencialmente leitura. E a leitura aqui entendida não é aquela estéril, que apenas decodifica as letras impressas. A leitura é a que gera discussão e envolvimento com o texto, que propicia um ambiente de análise e descontração. A leitura assim tratada em sala de aula incentiva, paralelamente, a leitura individual em casa. Ademais, com a discussão do objeto lido, será quebrada aquela sisudez na sala de aula a que nossa sociedade está acostumada, em que o aluno disciplinado é aquele quieto, que faz o que o professor manda e se cala quando ele esta falando. O papel do professor em nossas escolas sempre foi representar, em qualquer condição, a cultura letrada, e como representante dessa cultura, o professor geralmente concebe a sua leitura como a única possível, impondo-a em relação à leitura dos alunos.
As perspectivas apontam para a mudança de postura do professor: em vez de ler para ou pelo educando, passa a ler com o educando. Assim haverá o compartilhamento de leitura do estudante com a de seus colegas e com a do professor, o qual é um leitor mais experiente (tem uma maior bagagem de leitura), que por isso mesmo não deve impor a sua leitura, mas fazer com que, aos poucos, os alunos abram os seus olhos para a leitura, tanto do texto como da realidade à sua volta. Desta forma, com certeza haverá intercâmbio de leituras, favorecendo a ambos e trazendo novos elementos para um e outro.


IV. A LEITRUA DO E COM O ALUNO

A leitura estimula o diálogo, a discussão com outros leitores e a contraposição de idéias das múltiplas leituras que um texto escrito pode fornecer, sobretudo o texto literário, em vista de seu caráter plurissignificativo. Por isso, o ensino de literatura deve deixar vir à tona as divergências literárias dos alunos, o que ocasionará descobertas libertadoras, em que o estudante poderá criar e expor as suas próprias idéias, o real objeto de sua criação.
As perspectivas para o ensino de literatura explodem para o contraste. O professor deve procurar trabalhar com temas, pois os anseios do homem em toda história, de uma certa forma, sempre foram os mesmos. O que muda é a forma de enfoque que o homem atribui a esses anseios. Do mesmo modo, os temas são recorrentes, o que muda são as formas de se tratar um mesmo tema.
As propostas de ensino têm de ser temáticas, uma vez que vários textos sobre um mesmo assunto fazem com que o aluno reflita sobre esse assunto, e depois produza o seu texto, a sua voz, o que pensa sobre as questões discutidas. Não obstante, não há uniformidade de método de trabalho no ensino de literatura. Há que se verificar o posicionamento do professor diante de seu objetivo de ensino e diante do aluno que tem à frente.
Maria da Glória Bordini e Vera Teixeira Aguiar apresentam, em sua obra “Literatura: a formação do leitor: alternativa metodológica”, cinco métodos de ensino de literatura: a) científico, b) criativo, c) recepcional, d) comunicacional e e) semiológico. Tais métodos têm em comum a concepção de educação ligada à noção de transformação sócio-cultural, através de um ensino voltado para a realidade do aluno e que deseja alcançar uma postura crítica entre o mundo e a sociedade. Eles efetivamente apontam para a mudança de postura do professor, bem como buscam tornar prazerosa a leitura do texto literário. O professor não lê pelo aluno, mas com o aluno. Todos são elaborados a partir do ponto de vista do educando, procurando abarcar as suas experiências já vividas e fazendo com que o aluno exponha e contraponha a sua leitura do objeto lido.
Ademais, esses métodos não visam simplesmente a atender as necessidades dos alunos, eles também procuram alargar os seus interesses, num processo interminável, de modo que o gosto e o prazer da leitura vão para além da escola, cumprindo esta o seu real papel: formar leitores. O fundamental nesses métodos é a leitura do aluno e o prazer que se obteve dessa leitura, um prazer de ler sem a preocupação de apresentar o produto dessa sensação agradável ao “professor-escola”.
A leitura deve ser efetivada para preencher uma lacuna na vida do estudante, precisa vir ao encontro de uma necessidade, de um desejo, emocional ou racional, de uma vontade de conhecer mais ou mesmo de apenas se entreter com o texto. Essas necessidades e interesses podem ser ampliados; a cada atendimento de uma necessidade ou, possamos dizer, a cada leitura efetuada, novas necessidades e interesses poderão surgir e, assim, a leitura se tornará um hábito imprescindível na vida do aluno. Além disso, é importante haver uma experiência acumulada, fazendo com que a quantidade de leitura gere a qualidade da leitura, vez que a qualidade (profundidade) do mergulho de um leitor num texto depende de seus mergulhos anteriores, mergulhos estes não só nas obras que leu, mas também na leitura que faz de sua vida” (Geraldi, 1987, p. 100). Esses são os pré-requisitos. A eles se acrescentam os estímulos e os percalços do mundo exterior cada vez mais desenvolvido tecnologicamente, suas exigências e recompensas. Nada, enfim, é gratuito, a não ser o simples prazer de ler.
Outro aspecto, o qual considero o mais importante, é o caráter emancipatório e dialético dos métodos. O ensino de literatura deixa de seguir a veiculação vertical de informações, baseada numa história da literatura consagrada, passando a valorizar o compartilhamento de idéias e as divergências literárias. A leitura do professor, e o que é pior, as respostas prontas do manuais didáticos, não serão as únicas possíveis. Antes, o que se valoriza é a leitura e a voz de cada aluno e a contraposição das leituras efetuadas. Dessa forma, o ensino de literatura quebra a base do ensino reprodutor em que está incluída a escola brasileira. Assim, o aluno deixará de ser um simples receptor de informações, também veiculará informações, irá aprender a partir da sua visão e leitura do mundo, através da exposição e contraposição de sua idéias, partilhadas com os outros colegas e com o professor. Desse modo, o estudante estará inserido num ensino produtor ou criador, e terá oportunidade de apresentar o objeto de sua criação. A sua voz não será emudecida, ao contrário, será ouvida.

V. CONCLUSÃO
FORMAÇÃO DO LEITOR: ESPONTANEIDADE E LEIUTRA DO MUNDO

“Dê um susto em seus pais: leia um livro!”. Esta é uma piadinha que se coloca em camisetas e que exemplifica bem a cultura em que está inserida a sociedade brasileira. A falta de tradição cultural e a alienação do processo educacional demonstram a existência da crise da leitura, da “mistificação” do livro, sacralizado como objeto de luxo, numa sociedade onde a estima espontânea pela leitura é rara.
É necessário, portanto, o professor ter consciência dos problemas que envolvem a literatura e pôr em cheque como ela vem sendo tratada na escola, considerando que poucos resultados positivos se têm conseguido. A educação, efetuada de acordo como os modelos consumistas da sociedade capitalista, faz com que o aluno procure sempre respostas prontas, não estimulando o questionamento e a capacidade de confrontar idéias recebidas com as suas próprias idéias e inteligência do mundo. Enquanto obra acabada [texto de leitura], ela se assemelha a registro de coisas passadas e sem efeito que não seja o de memória, passivamente conservada entre prateleiras e poeira. Deste ângulo, o livro de leitura torna-se insistente e primordialmente fonte de aquisição de saber, raramente contestável e contestado, e como tal será colocado na escola. Este feitio impositivo sendo o modo de aproximação ao texto, redunda em freqüente fracasso. (Yunes, 1984, p. 19/20 – original grifado).
Até mesmo muitas obras literárias (ou que pretendem ser) estão impregnadas de lições educativas e/ou informativas, enfatizando a obrigação e o dever, esquecendo-se do caráter lúdico e ficcional, distanciando-se da espontaneidade e do prazer. Essas obras geralmente já trazem uma visão de mundo pronta que reproduz a cultura e o sistema existente, com a manutenção de um status quo, em vez de estimular uma postura crítica e contraposição da visão de mundo do leitor com a leitura efetuada, pois há que se considerar que antes mesmo de decodificar a palavra escrita, o indivíduo tem a sua própria inteligência do mundo. Como vimos, o hábito da leitura se inicia antes mesmo que a criança aprenda a ler: “A leitura do mundo precede a leitura da palavra”.
Na formação de um leitor, o educador deve estar ciente, pois, que a leitura vai além do texto e começa antes do contato com ele. O leitor assume um papel atuante, deixando de ser mero decodificador ou receptor passivo de idéias. A leitura se realiza a partir do diálogo do leitor com o objeto lido. O contexto geral em que atua, as pessoas com quem convive passam a ter influência apreciável em seu desempenho na leitura. Isso porque o dar sentido a um texto implica sempre levar em conta a situação desse texto, do contexto e de seu leitor.
Diante de tudo isso é que se afirma que a liberdade de expressividade deve estar acima de tudo. A leitura do texto escrito deve ser espontânea como é a leitura do mundo, sobretudo para as crianças, às quais tudo é novidade. O relacionamento do livro com o leitor não pode ser através de imposição, como uma avaliação para a nota; se assim for, a leitura será antes um dever do que um prazer, e a possibilidade de um aluno procurar um livro fora da situação de obrigação será remota.
Tratando dessa forma a literatura, se algum aluno vier a perguntar por que ou para que ler (o que é difícil, pois o estudante inserido nesse contexto não é estimulado a questionar), nunca verá a leitura de um livro de literatura como uma necessidade natural, mas como um exigência escolar, sendo que fora desta situação não há por que ser lido. O pior é que o aluno certamente não produzirá uma leitura crítica, contrapondo suas idéias e vivência com o texto escrito. Ele estará atrás de respostas prontas, de modo a atender a sua necessidade imediata.
É imprescindível o prazer e a espontaneidade estarem em primeiro plano e posteriormente a exposição da leitura efetuada pelo aluno. Só assim se poderá construir leitores. O prazer pela leitura com certeza trará o conhecimento, será fonte de saber. O contrário dificilmente ocorrerá. O ato de manusear um livro, de degustá-lo, não pode ser reduzido a cobranças escolares, a preenchimento de fichas de leitura e acréscimo de pontos à nota bimestral. Sem falar que este ato sempre será insubstituível, mesmo com o desenvolvimento tecnológico, com chegada do CD-ROOM, vez que para se chegar à utilização desse equipamento a pessoa passará antes ao manuseio do livro, e, certamente, quando estiver apto a utilizá-lo, não trocará a leitura de uma obra de Machado de Assis, segurando um bom livro, meramente por estar à frente de uma tela de computador.


BIBLIOGRAFIA

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BAMBERGER, Richard. Como incentivar o hábito da leitura. Tradução de Octávio Mendes Cajado. Cultrix, São Paulo, SP: 1977, 1 ed.

FREIRE, Paulo. A importância do ato de ler: em três artigos que se complementam. Autores Associados/Cortez, São Paulo, SP: 1983, 5 ed.

GERALDI, João Wanderley. O texto na sala de aula. O circuito do livro e a escola. Assoeste, Cascavel, PR: 1987, 3 ed.

SILVA, Ezequiel Theodoro da. Leitura na escola e na biblioteca. Campinas, SP: Papirus, 1986.

VIEIRA, Alice. O prazer do texto: perspectivas para o ensino de literatura. São Paulo: E.P.U, 1989.

YUNES, Eliana. A leitura e a formação do leitor: questões culturais e pedagógicas. Antares, Rio de Janeiro, RJ: 1984.

ZILBERMAN, Regina. Guia de leitura para alunos do 1º e 2º graus. Cortez/INEP, São Paulo, SP: 1989.

ZILBERMAN, Regina (org.). Leitura em crise na escola: alternativas do professor. Porto Alegre: Mercado Aberto, 1986.

ZILBERMAN, Regina & SILVA, Ezequiel Theodoro da. Literatura e Pedagogia: ponto & contraponto. Porto Alegre: Mercado Aberto, 1990.
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