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Ensaios-->O cerco judeu -- 21/04/2002 - 03:30 (salim ibrahim) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos
O cerco judeu
Por- Francisco José Viegas (*)



O cerco à basílica da Natividade, em Belém, na Palestina, levanta alguns problemas sérios sobre o actual conflito do Médio Oriente. Lugar santo na tradição cristã, a basílica foi ocupada por cerca de duas centenas de refugiados palestinianos, a maioria deles armados e algumas dezenas figurando na lista de autores de atentados terroristas cometidos em Israel. O padre Joaquim Carreira das Neves, numas declarações na rádio, manifestou as suas apreensões e o seu choque. Compreende-se e tem toda a razão. O cerco à basílica é uma das expressões do mal que anda à solta na região _ e o chamado 'direito de refúgio' parece ser uma tradição religiosa invocada a este propósito. Evidentemente que, ao longo da história da Igreja, esse 'direito de refúgio' terá sido concedido a gente indefesa e desarmada _ mas, claro, nunca a judeus perseguidos quer pelo anti-semitismo europeu dos séculos XIX e XX, quer pela Inquisição dos séculos anteriores. São contas arrumadas.

Disse e mantenho: o exército israelita nunca deveria ter cercado a basílica da Natividade. O padre Carreira das Neves, no entanto, insistiu gravemente num erro de linguagem pouco saboroso e nada negligenciável. Ao acusar o exército israelita do crime de cercar a basílica, referiu-se sempre ao 'exército judeu', aos 'judeus que cercam a basílica' e ao 'cerco judeu'. Isto explica-se, esclareceu-me um amigo, 'por tradição'. Acontece que, ao estabelecer a identidade entre 'judeus' e 'exército israelita', o padre Carreira das Neves cumpriu a tradição. Nada mais natural nesse deslize inaceitável que tem feito escola.

Acontece que os recentes e dramáticos acontecimentos no Médio Oriente afectam a consciência judaica, a memória judaica e a diáspora que fez do judaísmo mais do que uma religião _ uma ética, uma cultura, uma base de vida, uma memória, uma alegria. Não só porque o anti-semitismo renasce na chamada 'consciência liberal europeia' mas também porque os erros mais grosseiros (deliberadamente grosseiros: basta ver como nas páginas da nossa Imprensa os jornalistas são parciais e cedem à propaganda palestiniana, à ignorância e ao folclore progressista de matiz católico) são cometidos com a bênção do antijudaísmo esclarecido que sempre viu em Israel um acontecimento impossível e 'uma entidade a arrasar', como sempre defendeu a OLP. É bem provável que Ariel Sharon seja um problema para os judeus do mundo, ao transformar Yasser Arafat em mártir de uma causa que não devia ter mártires mas negociadores. Sharon ajudará, assim, a limpar a face de um homem (Arafat) que ordenou massacres, crimes, atentados, que organizou milícias preparadas para morrer e matar, que traiu o seu povo as vezes que julgou necessárias a fim de manter o poder no meio dos bandos terroristas e de financiar a própria corrupção na Autoridade Palestiniana. Não importa. Não significa quase nada. Uma onda de intolerância percorre o mundo e a Imprensa não lhe fica imune. Israel nunca lhes foi uma coisa simpática _ agora estão autorizados a, abertamente, transformar as mentiras em verdade e a propaganda em notícia. Não é apenas o 'direito de refúgio' na basílica de Belém que está em causa. Os 'tanzim' estão armados lá dentro, cometeram atentados, assassinaram, fabricaram bombas? Não interessa. Vale a pena explicar que foram a Jordânia e o Egipto que não quiseram a constituição de um estado palestiniano em 1967, como antes os países árabes da região não o quiseram em 1948? Não interessa. Vale a pena explicar como o cerco a Israel foi feito à custa dos palestinianos, não reconhecendo a existência do estado de Israel e não aceitando qualquer negociação até Sadat? Não interessa. Vale a pena falar do modo como os refugiados palestinianos são tratados na Síria, no Líbano, no Egipto? Não interessa.

D. Januário Torgal Ferreira, uma respeitável, autorizada e honestíssima voz da Igreja católica _ que especialmente prezo _ condenou em termos sinceros, e certamente sentidos, a ofensiva militar ordenada por Ariel Sharon nos territórios autónomos. Lamentavelmente, não o ouvimos condenar os atentados cometidos durante a celebração da Páscoa judaica, não ouvimos a sua condenação (como não a ouvimos aos que agora se descobrem guardiães da basílica ocupada) quando os lugares históricos do judaísmo foram profanados em Nablus, em Belém, em Jericó, em Hebron, ou as sinagogas eram atacadas um pouco por toda a parte.

Sharon será, certamente, uma das figuras do mal que anda à solta no Médio Oriente. Mas nada autoriza que se transformem em heróis os responsáveis pelo terrorismo palestiniano que até agora se opuseram a todo e qualquer acordo e forçaram Arafat a todas as traições, como o Hizzbullah, a Jihad ou o Hamas. Só que isso não interessa. Subtilmente, sub-repticiamente, a mensagem antijudaica vai ficando como se regressássemos à teologia do deicídio e a Pio XII e à mais ridícula propaganda. O meu bom amigo Frei Bento Domingues, dominicano, cedeu a esse mesmo deslize de linguagem quando referia as 'mulheres palestinianas abatidas pelos judeus no decurso do presente conflito', sem nunca lembrar as mulheres israelitas, judias ou não, abatidas pelas Ezzedimn al-Qassam do Hamas.

Esta demagogia perigosa tentará associar o judaísmo e os judeus à perseguição, ao exílio e à repressão do povo palestiniano. Mas, conhecendo os demónios antijudaicos como conhecemos, hão-de criar coisas mais graves. Quanto mais depressa os exércitos de Sharon retirarem da Cisjordânia e de Gaza, quanto mais depressa terminar a ocupação, quanto mais depressa os tanques regressarem às bases, talvez seja possível finalmente forçar Arafat a assinar um acordo (qualquer que ele seja), isolar o terrorismo que tem martirizado israelitas e palestianos e, finalmente, estabelecer o Estado palestiniano que não existe desde 1948 porque os estados árabes não permitiram.
(*) Escritor, escreve no JN, semanalmente, às quintas-feiras
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