(em consideração ao ensaio poético de Horácio Costa:
“Seis Pontos Para o Próximo Poema”)
I.
Meu melhor poema
é este que me falta: o que jamais foi escrito
No entanto, ele existe ditado pelo silêncio
Ele vive sem palavras no entanto, me falta
E me faz falta, portanto, falta escrevê-lo
a despeito da sua existência
sem a vívida palavra:
O poema, falta escrevê-lo (de fato)
mesmo que não venha sê-lo de fato um poema
Mas falta escrevê-lo – simplesmente –
porque ele se oferece pela ausência
Falta escrevê-lo para não impedir
o absoluto do que é
em sua essência
ou seja, falta escrevê-lo
II.
Falta escrever o poema
que, conciliado com a falta
partilhe o tempo
e recrie a comunhão
Que deposite as armas
que reze aos mortos
e que peça perdão
III.
Sobre a lâmina da linguagem
na utopia da poesia
falta escrever o poema
que, reconhecida a falta
admita o acaso
e que, sempre direcionado ao silêncio
e à sua própria indeterminação
alcance um significado:
sua verdade de agora
Falta escrever o poema
que transmita a verdade
em preto e branco
nada mais do que a verdade
de agora
IV.
Entrincheirado e ensimesmado
entre as armadilhas das línguas
falta escrever o poema
que, embora temeroso do vazio (a falta)
empunhe, de vez, a palavra
(ausente ou ainda inexistente)
e preencha a folha ávida
num só fôlego
de uma vez por todas
Falta escrever o poema
para registrar o momento
engajado na poesia
engajada na luta
engajada na vida
de inabaláveis ideologias
V.
Único e plasmático
e falto e brilhante e definitivo
sem pragmatismos
falta escrever o poema
que destaque da alma
a página do lirismo:
desvelado brilho
no universo das estrelas
VI.
Constantemente reinventado
pela falta
e subseqüente à ética
no fluxo das idéias
falta escrever o poema
que testemunhe fatos
que revele fotos
que desoculte feitos
Que passe a limpo
os rascunhos depositados
na gaveta da história
Que admita, por fim
a glória poética
e devore o futuro
VII.
Assim, com todo o zelo
da mirífica paisagem
Com a plena imagem
em cada cena
que na mente se abre
sob os olhos-luzes da ribalta
tudo é ainda desejo
pois ainda o poema me falta
como quem espera
por um beijo