A gata lambia o prato cheio de leite, procurando, procurando uma sopa de letras que tinha deixado de lado, perdida por um olhar sorrateiro na direção do pássaro da vovó.
Mimi, como todas as gatas, nome escolhido a esmo por um gago que visitava a casa.
Todos queriam apenas um nome para a gata de pelo branco, meio angorá.
Pelo bonito, macio, justificando o nome de mimi.
Foi assim que vovó falou ao ser questionada pela vizinha.
Era apenas uma gata para outros, mas tinha um rabo muito peludo, sempre bem cuidado pelos netos, que costumavam passar horas brincando com a bichana.
Mimi lambeu o leite. Achou uma letrinha solta próximo do tapete. Era 'D', mas para ela apenas um objeto comível, feito de trigo e de cor verde, para lembrar vegetais.
Ficou lambendo a letra, deu uma patada num mosquito que passava. Ficou em dúvida se comia a letra ou o mosquito. O mosquito fazia barulho ao tentar fugir.
Comeu o mosquito. A letra ficou no tapete.
Depois chegaram os netos, alguns na fase da puberdade.
Ficaram alisando a gata no sofá da sala quando a vovó saiu.
Uns eram curiosos, outros piores.
O mais velho começou a mexer na gata, alisar seus pelos, fazer carinho.
A gata miou espantada e saiu da sala correndo.
A gargalhada foi geral.
Vovó veio de longe perguntar o que houve.
Disseram para perguntar à felina.
Bem, disse a velha, se mimi soubesse falar não miava. E foi cuidar dos biscoitos na cozinha.