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Ensaios-->Blasfêmia -- 18/05/2005 - 04:15 (Rose Stteffen) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos

Blasfêmia

Nunca te amei.
Você não foi nem uma paixão, não foi admiração, eu te venerei.Venerei-te como a um deus.
E por tanto te louvar, blasfemei.
Não foram horas, nem dias, mas décadas.
Diante da tua imagem me curvei. Orei preces que surgiram dentro de mim.Preces silenciosas e em vão.
Não deixei que o amor passasse por mim sem que eu amasse. Apaixone-me diversas vezes e encantei-me muitas mais.
Não havia comparações entre as pessoas e você, não seria justa tua posição no altar santificado onde te coloquei, não permitia.
Tentei, como é normal em mim, agarrar uma culpa que fosse minha.
Mas como todo discípulo, em algum momento, vê o seu mestre como o todo-poderoso; como o paciente que por instantes pensa amar seu médico, assim, da mesma forma, aconteceu comigo.
Mas todo mestre conhece de antemão que seu discípulo irá vê-lo além de mestre porque já foi aprendiz.
Qualquer médico sabe desta relação de absolutismo que seus pacientes querem manter com eles. Como padres que ouvem confissões e absolvem pecados, mas sabem que são apenas homens como os demais.
Em toda relação, onde um dita as regras e o outro, apenas as seguem, desde que não hajam intenções além das apropriadas, o mais rápido, são estabelecidos limites.
Então, quis sim abraçar uma culpa maior que o mundo por venerá-lo, mas não pude!
Você não estabeleceu limite algum, mas derrubou muralhas, desmarcou fronteiras, destituiu cargos e os encargos que poderiam advir.
Há décadas eu tenho te colocado num lugar inatingível para outro ser.
Sei que você nem sabe que eu passei... Passei por você e você passeou por mim.
Orgasmos? Não, não houve nenhum, não daqueles físicos, apenas um outro tipo...
Orgasmo da alma, algo que dura mais que instantes, que marca para sempre.
Eu devo estar entre papéis, entre listas, talvez nem isto. Talvez você queime ou delete pessoas que são apenas pessoas que passaram, pelas quais você passou ou passeou, não sei.
Eu não retirarei você de onde coloquei e você não se importou em ficar.
Talvez eu precise de você endeusado num altar que às vezes eu limpe, retire as traças, noutras épocas eu vejo a mármore deteriorando-se e assisto impávida tua possível queda.
Embora eu o tenha colocado em tal lugar, ao ver seu nome escrito em livros, listas entre outros nomes absolutamente comuns, ainda não posso deixar de pensar que ironia levou-me a tal barbárie comigo.
Nunca saberei se foi apenas o acaso ou se realmente aconteceu algo que justificasse tamanho drama mais que desnecessário.
Penso se os dias de luzes compensaram os anos de trevas... Décadas em que sua falta ética encobriu raios de sol e lua na minha existência, que ainda que pequena aos seus olhos, é a minha existência...
Apesar de tudo, ou de nada que você se lembre, eu penso, sem que mão alguma me leve para meus caminhos mal iluminados.
Como crianças que têm medo de coisas ilógicas, mas que surpreendentemente fazem parte de suas infância, eu preciso do teu espectro, tão mórbido quanto possa ser, apenas para depois descobrirem que são adultos à procura de uma fé, seja lá em que for...



 

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