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Ensaios-->GRANDES PENSAMENTOS(63) -- 07/05/2007 - 21:17 (Edmar Guedes Corrêa****) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos
GRANDES PENSAMENTOS(63)

A NECESSIDADE DA MENTIRA

A imoralidade da mentira não consiste na violação da sacrossanta verdade. Ao fim e ao cabo, tem direito a invocá-la uma sociedade que induz os seus membros compulsivos a falar com franqueza para, logo a seguir, tanto mais seguramente os poder surpreender. À universal verdade não convém permanecer na verdade particular, que imediatamente transforma na sua contrária. Apesar de tudo, à mentira é inerente algo repugnante cuja consciência submete alguém ao açoite do antigo látego, mas que ao mesmo tempo diz algo acerca do carcereiro. O erro reside na excessiva sinceridade. Quem mente envergonha-se, porque em cada mentira deve experimentar o indigno da organização do mundo, que o obriga a mentir, se ele quiser viver, e ainda lhe canta: 'Age sempre com lealdade e rectidão'. Tal vergonha rouba a força às mentiras dos mais subtilmente organizados. Elas confundem; por isso, a mentira só no outro se torna imoralidade como tal. Toma este por estúpido e serve de expressão à irresponsabilidade. Entre os insidiosos práticos de hoje, a mentira já há muito perdeu a sua honrosa função de enganar acerca do real. Ninguém acredita em ninguém, todos sabem a resposta. Mente-se só para dar a entender ao outro que a alguém nada nele importa, que dele não se necessita, que lhe é indiferente o que ele pensa acerca de alguém. A mentira, que foi outrora um meio liberal de comunicação, transformou-se hoje numa das técnicas da insolência, graças à qual cada indivíduo estende à sua volta a frieza, e sob cuja proteção pode prosperar.


(Theodore Adorno, em 'Minima Moralia')


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