“Ele deve estar ardendo no inferno”, declarou o ministro da Defesa da Colômbia, Juan Manuel Santos, a respeito da morte do número 1 das Farc, Manuel Marulanda Velez, o “Tirofijo”, apelidos pelos quais era conhecido o guerrilheiro Pedro Antonio Marin.
Marulanda supostamente morreu vítima de um ataque cardíaco em março e deixou para trás décadas de brutalidade que incluem milhares de assassinatos e seqüestros.
Também foi o responsável por envolver as Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (Farc) com o tráfico de drogas.
A herança maldita de Marulanda ultrapassou fronteiras e o Brasil não é uma exceção.
O tráfico de drogas das Farc espalhou uma trilha de crimes, separou famílias e arruinou vidas, sem contar os problemas que criou para as autoridades brasileiras obrigadas a intensificar o controle das fronteiras, interromper o fluxo de contrabando, apreender drogas ilegais e tratar um número cada vez maior de viciados.
Sob a liderança de Marulanda, as Farc usaram sua organização altamente controlada para construir uma verdadeira multinacional do narcotráfico que controla 30% de todo o mercado de drogas da Colômbia, incluindo as exportações.
As Farc transportavam a maior parte das drogas que comercializava, pelo ar. Com a aprovação da chamada lei do abate em 2004, os traficantes foram obrigados a buscar novas rotas e a bacia amazônica se transformou numa das principais vias para as ilegalidades cometidas pela organização.
Parte das drogas das Farc vai diretamente para os traficantes brasileiros. Outra parte é contrabandeada no país de onde segue para os mercados europeus.
Quando as rotas dos narcóticos passam por áreas habitadas, os traficantes ampliam seus mercados ao comercializarem a droga localmente.
Os criminosos locais lucram com a situação e a droga passa por um número cada vez mais crescente de pequenas células, tornando mais difícil a quebra da cadeia por parte do poder público.
O comandante militar da Amazônia, general Augusto Heleno Pereira, advertiu: a menos que o Brasil tome uma atitude, a bacia amazônica poderá se tornar “um paraíso para os crimes”.
Antigamente, a cocaína era cara e difícil de se obter. Agora, suas formas inferiores, conhecidas como paco ou pasta básica, são baratas, podem ser encontradas em qualquer lugar e são altamente perigosas.
A pasta básica é a cocaína em estado bruto usada para produzir crack. O paco é um resíduo de cocaína para fumo que é altamente viciante.
Em muitos lugares, uma dose de pasta básica “custa menos que uma bisnaga de pão”, afirma Aldo Lale-Demoz, chefe do escritório colombiano da ONU para o combate as drogas e crimes.
Por menos de R$ 10, o paco deixa os jovens em um estado tão eufórico e vicia tão rapidamente que depois que começam a usar, não conseguem mais parar e para manter o vício, roubam, matam e vendem o que possuem.
A cocaína em qualquer forma representa um grande risco para a saúde. Ela afeta praticamente todas as partes do corpo, desde o cérebro aos pulmões, coração e pele, além de provocar efeitos graves sobre o sistema nervoso e psíquico.
A cocaína é ainda mais perigosa para o usuário quando misturada com diversas outras substâncias, freqüentemente tóxicas, o que a torna ainda mais lucrativa.
As autoridades contam que a cocaína vendida nas ruas de São Paulo tem pureza inferior aos 30%.
Alguns aditivos mais conhecidos são a lidocaína, ácido bórico e fermento em pó. Os produtos derivados do refino como ácido sulfúrico e querosene também são perigosos.
A cocaína não arruína somente a vida dos indivíduos, ela também destrói famílias inteiras e sobrecarrega o sistema público de saúde. Além disso, a produção e refino da droga ultrapassam as fronteiras do Brasil.
O Brasil já enfrenta altos níveis de violência urbana e crimes relacionados ao tráfico de drogas nos morros do Rio de Janeiro e nas periferias de São Paulo, mas a criminalidade alimentada pelo comércio de drogas se espalha velozmente por cidades pequenas e de médio porte em todos os estados.
A Colômbia combate a violência de seus cartéis há décadas e o México, importante rota de entrada de drogas para os Estados Unidos, enfrenta guerras entre facções rivais de narcotraficantes que já mataram dezenas de policiais e autoridades.
Devemos reconhecer que o Brasil realiza um esforço para coibir o tráfico. No ano passado, a Polícia Federal apreendeu mais de 13 toneladas de hidrocloreto de cocaína.
No entanto, as extensas e porosas fronteiras denunciam uma ação policial insuficiente. Enquanto for altamente lucrativo, o tráfico de drogas vai continuar.
As Farc e seus sócios sairão ganhando e países como o Brasil estarão entre suas vítimas.
(*) Marcelo Rech é jornalista, editor do InfoRel e especialista em Relações Internacionais e Estratégias e Políticas de Defesa. Correio eletrônico: inforel@inforel.org.
'É permitida a reprodução total ou parcial, desde que citada a fonte'