Toque de Reunir
(José Gobbo Ferreira - 13 de maio de 2012)
"Estaremos sempre solidários com aqueles que, na hora da agressão e da adversidade, cumpriram o duro dever de se oporem a agitadores e terroristas, de armas na mão, para que a nação não fosse levada à anarquia!"
(Brasília - 31 de março de 1981)
Gen Ex Walter Pires de Carvalho e Albuquerque , Ministro do Exército
Em 17 de abril de 1996, uma tropa da Polícia Militar do Pará, constituída por membros do 4o Batalhão, de Marabá, comandados pelo Cel. Pantoja e da Companhia de Policiamento de Parauapebas, sob o comando do Maj. Oliveira cumpria a ordem de desobstruir a rodovia PA-150, ocupada por baderneiros do MST, quando uma turba de jagunços, brandindo porretes e foices, usando pelo menos uma arma de fogo e lançando paus e pedras, avançou contra ela.
A tropa se defendeu do ataque com as armas de que dispunha. Ao final do conflito, 19 civis estavam mortos e mais de 100 feridos. O incidente foi registrado em vídeo e recebeu o sugestivo nome de "Massacre de Carajás" (http://www.youtube.com/watch?v=KZoHeu2LZ5Y).
Embora o vídeo não deixe nenhuma dúvida de que durante o entrevero os soldados estavam na realidade defendendo suas próprias vidas (eu faria o mesmo), militantes ensandecidos levantaram as vozes crucificando os policiais. Políticos populistas, intelectuais enfurecidos, juízes e promotores, nos sofás de seus confortáveis gabinetes com ar condicionado e vistas aprazíveis, procuraram na letra fria dos códigos as maneiras "legais" para condenar aqueles que, nas agruras do terreno e no calor das circunstâncias, tentavam cumprir com seu dever. E acharam!
A chamada sociedade civil, covarde, calada e abúlica, quando muito murmurando entre dentes contra as ações predatórias do bando de celerados do MST, mais uma vez virou as costas para aqueles que, malgrado todas as deficiências, próprias e do sistema, tentavam defendê-la do caos.
Embora os comandantes da operação tenham agido no sentido de preservar a vida de seus soldados, dever primeiro de qualquer oficial, os autos do processo dizem que "os manifestantes foram cercados pelos policiais, que atiraram a queima-roupa". Eles foram condenados pela justiça do Pará e, na segunda feira 7 de maio passado tiveram decretado seu recolhimento ao cárcere, onde devem permanecer por, no mínimo, 43 anos o coronel e 25 o major.
Em um encadeamento sinistro e significativo, três dias depois, no dia 10 de maio, a excelentíssima senhora presidente da República tornou pública sua escolha dos membros da chamada "comissão da verdade", que se propõe a descobrir uma verdade ainda não bem definida, sobre fatos ocorridos em um passado também ainda não definido. Uns dizem que será de 1946 a 1988. Outros entendem que deve se limitar ao período entre 1964 e 1988. Todos, porém, estão de acordo em que as brutalidades e crimes cometidos em qualquer época por terroristas e guerrilheiros comunistas (entre os quais S.Excia. a presidente se inclui) não fazem parte do conceito de verdade.
De acordo com o publicado na imprensa, "o grupo apontará, sem poder de punir, responsáveis por mortes, torturas e desaparecimentos na ditadura e vai funcionar por dois anos. Ao final deste prazo, a Comissão deverá elaborar um relatório em que detalhará as circunstâncias das violações investigadas".
Aprendi que a vida, em suas diversas circunstâncias, nos obriga às vezes a engolir sapos. Nesse momento, devemos avaliar o tamanho do batráquio. Se for possível, e se evitar mal maior, podemos engoli-lo. Porém, chegará uma hora em que temos certeza que um deles não passará por nossa glote. A esse, usando a terminologia das falhas em material bélico, chamo de "sapo crítico". Não devemos engoli-lo, embora por vezes tenhamos que suportá-lo por perto. Porém o sistema, indiferente à nossa recusa, pode nos enviar outro, maior ainda. Classifico esse como "sapo catastrófico". Ele não só não pode ser jamais engolido, como deve ser esmagado prontamente.
No meu entender, a comissão da verdade, tal como instituída pelas forças no poder, já é o sapo crítico. Sugiro que os companheiros convocados se recusem a comparecer, até o limite de seus recursos legais. Se forem forçados a tal, que fiquem calados, pois a Constituição garante o direito de não testemunhar contra si próprio. Porque, seja qual for a ladainha dos membros da comissão, a frase cinematográfica dos policiais americanos é feita sob medida para situações como essa: "Você tem o direito de ficar calado. Porém, tudo o que disser pode ser e será usado contra você no tribunal".
O cenário de Carajás se delineia de novo. A turba revanchista anseia por novos coronéis Pantoja e majores Oliveira. A sociedade, como lhe é de costume, já se esqueceu, ou nunca tomou conhecimento dos riscos a que esteve exposta e dos quais foi protegida pela luta de nossos companheiros, e dela muito pouco, ou nada, podemos esperar em nossa defesa. Só podemos contar com nossa união, que é nossa força. Se as manobras defensivas acima falharem, então estaremos face a face com o sapo catastrófico. É imperioso esmagá-lo, ainda que isso implique em abrir a caixa de Pandora neste país.
Soldados de ontem e de sempre! Nossos chefes do passado nos legaram o compromisso acima, que temos o sagrado dever de honrar. É hora de nos mobilizarmos na defesa dos companheiros ameaçados, de nos prepararmos para os combates cujo ruído já pressentimos ao longe e de sustentar o fogo naqueles em que já estamos engajados. Nuvens negras se acumulam no horizonte e não há justificativa para que não nos preparemos para a tempestade, que pode cair ou não mas, caso caia, não pode nos surpreender ao relento.
Que Deus permita que a preparação para a luta justa nos infunda vigor ao espírito e não perturbe a paz em nossos corações de homens de bem.
José Gobbo Ferreira
PS: O foco deste trabalho é a comissão da verdade. Nada impede que o sapo catastrófico entre em cena ainda antes, em consequência da premeditada deterioração de nossa operacionalidade e do aviltamento de nossos soldos. As regras de engajamento permanecem as mesmas.
José Gobbo Ferreira é coronel do Exército e já está reformado.
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