A MENINA DO ÔNIBUS II - Capítulo II(d)
Olá queridos leitores,
Vocês que acompanharam a história de Ana Carla em “A MENINA DO ÔNIBUS”, poderá a partir de agora conferi também alguns capítulos extras que farão parte do livro a ser publicado futuramente, assim que o livro estiver pronto.
Seguindo a ordem dos capítulos que foram publicados aqui na Usina de Letras, o capitulo a seguir é um capítulo entre II(c) e III da segunda parte. Para ficar mais fácil a localização, resolvi chamá-lo de capítulo II(d) para não confundir os leitores. Para ler o capítulo II(c), clique [aqui]
Abraços,
Edmar Guedes Corrêa
Se quiser saber como tudo começou, então clique em: A MENINA DO ÔNIBUS
II(d)
I
Tive uma noite febril depois de retornar para casa. Ao deitar na cama, fui tomado pela preocupação, pela sensação de medo, de que tinha dado um passo em falso e estava prestes a cair num precipício. Devo ter me sentido exatamente como aquele que ciente de que cairá, tem alguns momentos para pensar nos motivos que o levaram a estar ali. O problema era que eu não tinha certeza se cairia e nem somente aqueles segundos para pensar nos meus erros: eu tinha a noite toda e provavelmente o dia seguinte e o outro também. E aí que estava a xis da questão.
Não era a primeira vez a cometer uma loucura com Ana Carla, mas em nenhuma delas a sensação de medo, de que o mundo ia desabar sobre a minha cabeça parecia tão intensa e tão real. Era como se a possibilidade tivesse dado lugar a uma certeza infalível. E então eu antevia todas as desgraças caindo sobre mim. E ao fazer isso, eu me sentia como nunca havia sentido até então: com medo, muito medo.
Eu não pensava só na perda de Ana Carla, o que já era suficiente para me dilacerar o coração, mas também nos aborrecimentos e na decepção de meus pais. Eu via minha mãe arrasada, chorando pelos cantos como se eu tivesse cometido um crime hediondo.; eu via meu pai calado, sério, sem aquela alegria que na mais das vezes faz com que ele seja uma pessoa tão agradável. Eu o via com vergonha de encarar os amigos por minha causa e então o medo se tornava ainda maior.
“Ah, meu deus do céu! Por que não fui usar camisinha? E se ela fica grávida? Se sua barriga começa a crescer? O que vamos fazer? Vou desgraçar a dela e a minha vida! Tudo porque não usei uma maldita camisinha! Porra, também! Porque não pude me controlar? Por que a gente não consegue se controlar nessas horas? Agora estou ferrado! Ela só tem catorze anos! Como vou encarar os pais dela? Nem faço idéia de que tipo de homem ele é? E se for desses homens estúpidos, brutos e sem educação? Vai querer me matar ou me pôr na cadeia. Não vai ficar satisfeito enquanto não me ver atrás das grades. E Ana Carla? Coitadinha! Como vai encarar seus pais? Ah, vai sofrer tanto...”, pensei na cama enquanto rolava de um lado para o outro.
Estava exagerando e fazendo tempestade num copo d’água evidentemente, embora tivesse sérios motivos para tanto temor. A questão não eram as conseqüências de uma gravidez, mas sim agir como se essa gravidez fosse fato consumado. Foi isso que me deixou espantado tempos depois. Eu não havia perdido o controle só no momento de exultação, quando o desejo se tornou mais poderoso que a razão, mas também quando o medo passou a fazer parte do meu dia-a-dia.
Já notara em mim uma série de mudanças desde o momento em que conheci Ana Carla. Eram mudanças graduais, imperceptíveis a princípio, no entanto, com o passar do tempo elas se tornavam evidentes, como uma gravidez. E eu via essas transformações como uma doença, um sinal de fraqueza, como se um vírus tivesse se instalado no meu sangue e contaminado todo o corpo. E era isso que me deixava confuso, sem rumo.; pois nunca fora assim.
Ah, nem sei que horas fui dormir. Não tive coragem nem mesmo de consultar o relógio, entretanto, pude ver pelas frestas da janela algum sinal de luz, como se o sol quisesse me lembrar o início de mais um dia, de mais preocupações e principalmente mais um dia naquela incerteza angustiante.
Acordei com as batidas na porta e minha mãe perguntando se não ia me levantar. Ainda estava sonolento, como se tivesse passado à noite em claro, de forma que me senti irritado por estar sendo despertado. “Que saco! Por que ela tinha que me acordar agora? Por que não me deixa dormir? Será que ela não vê que estou de férias e posso acordar a hora que quiser?”, pensei momentos antes de lhe responder:
-- Já vou, mãe.
Virei para o lado e tentei dormir mais um pouco. As lembranças do dia anterior porém se tornaram vivas e me invadiram os pensamentos e expulsaram o sono com seu exército de interrogações.
Levantei-me.
Minha mãe, muito observadora, percebeu que algo tinha acontecido. Aliás, se tem algo que me irrita em minha mãe, é essa sua mania de pegar as coisas no ar e ir logo querendo saber o que aconteceu. Mas como eu ia lhe dizer sobre ontem? Não, não poderia de forma alguma. Não tinha como falar nada. Era preciso mentir, mentir o tempo todo se o caso fosse. Mas dizer a verdade jamais.
Ainda estava muito preocupado. Não tanto quanto na noite anterior, mas ainda sim com aquele medo oculto, com aquela sensação de que dessa vez tinha me dado mal. Pensei inclusive em ligar para Ana Carla e perguntar se estava tudo bem com ela. Todavia, contive-me. Não adiantaria de nada. Uma gravidez não se manifesta de um dia para o outro. Certamente levaria pelo menos uma semana para aparecer os primeiros sinais.
Peguei o livro de Nietzsche e sentei na sala para lê-lo. E enquanto fazia isso, pensei no próprio Nietzsche: “Coitado! Deve ter sido um homem muito solitário. Ainda por cima doente? No fundo foi um homem infeliz e frustrado por não ter tido o reconhecimento que tanto esperava. Ah! Pobre Nietzsche! Como o destino foi cruel consigo! Interpretou seu tempo como nenhum outro, mas não foi compreendido. E agora o mundo tornou-se aquilo que ele tanto temia. Ah, como eu queria ser o que ele esperava do homem do futuro. Até me identifico com algumas características desse homem, mas no fundo não sou esse tipo de homem. Estou mais para o outro tipo, o dos fracos. O homem nietzschiniano jamais temeria as conseqüências de seus atos e muito menos o futuro. Ah, definitivamente não sou um “übermensh”. O livro jazia fechado, com um dedo marcando a página onde havia parado, enquanto me perdia em pensamentos.
-- Filho, vem almoçar – chamou minha mãe, despertando-me de minhas divagações.
-- Já vou, mãe – respondi, fechando o livro e me levantando.
Meu pai não estava em casa, mas chegou logo assim que sentamos à mesa.
O almoço até que foi descontraído. Meu pai chegou da rua um tanto bêbado. Havia saído com os amigos. Eu porém não estava disposto a participar de toda aquela descontração, por isso comi o mais rápido possível e disse que ia para o quarto. Aleguei uma dor de cabeça para sair assim da mesa. No entanto, enquanto escova os dentes, ouvi minha mãe dizer:
-- Há alguma coisa errada com nosso filho.
-- Deixa o garoto, mulher.
Não ouvi mais nada. Fui para o quarto e tranquei a porta.
II
Não consegui ficar por muito tempo naquele quarto trancado. Meus pensamentos fluíam de forma desconexa, alternando momentos de ponderação com momentos de desespero. Às vezes, conseguia ver a coisa de forma mais lúcida, sem muita gravidade.; no entanto, pouco depois era tomado pela sensação de que tudo estava perdido. Então eu me desesperava antevendo a perda de minha menina e a privação daquele corpinho tão jovem e cheio de vida e alegria. Mas não era só o desejo o culpado pela minha angustia, um sentimento novo e desconhecido que crescia lentamente no meu peito feito uma árvore era o motivo de todo aquele desassossego. Eu não compreendia aquela dor, aquela sensação pungente de algo espetado de forma profunda. Aquilo era tão novo para mim...
Pouco antes das três tomei a resolução de telefonar-lhe imediatamente. Peguei no celular e liguei o número de sua casa. Havia a possibilidade de sua mãe ou até seu pai atender ao telefone, mas eu tinha que correr esse risco. Caso algum deles atendesse, eu desligaria imediatamente. Agora se fosse seu irmão, eu pediria para chamá-la.
Não sei se ela adivinhou, se foi uma coincidência ou se ela já estava esperando, embora eu não tivesse o costume de lhe telefonar sem lhe avisar. Não importa. O que conta foi sua voz dizendo “Alô” do outro lado da linha. Sua voz parecia tão meiga e sensual ao mesmo tempo.
-- Oi, minha florzinha! – falei, tomado por exagerada euforia.
-- Oi! – disse ela simplesmente.
A forma como ela agiu me levou a deduzir que um de seus pais estava ali por perto.
-- Tem alguém aí por perto? – quis saber.
-- Hum-rum
Vi que não poderíamos estender a conversa. Aliás, eu só queria saber se estava tudo bem com ela. Por isso fui direto ao assunto.
-- Ta tudo bem com você?
-- Tudo
-- Estou preocupado com o que aconteceu ontem. A gente não poderia ter feito aquilo sem camisinha, sabia? Foi uma irresponsabilidade muito grande de nossa parte.
-- Também acho.
Nesse ínterim ouvi uma voz de mulher dizer:
-- Filha, a mamãe vai na casa da Dona Rosinha. Quando a maquina parar, estende a roupa.
-- Ta bom, mãe – ouvi Ana Carla responder.
Ouve um breve silêncio.
-- Era minha mãe – disse-me ela, voltando a falar comigo, agora de forma mais alegre e descontraída.
-- É sério! Estou preocupadíssimo com o que fizemos – repeti, como se ela não tivesse prestado atenção da primeira vez. – Quando foi que você ficou naqueles dias?
-- Menstruada? – atalhou ela.
-- Sim.
-- Foi no final do mês, quando estava na casa da minha tia. Lembro que na virada do ano ainda estava usando absorvente.
Aquilo me deixou um pouco mais tranqüilo. Sabia que a mulher poderia ficar grávida em qualquer momento, mas pelo menos a chance de que ela estaria no dia fértil era menor, embora estivesse no início do período fértil.
Conversamos por mais algum tempo. Isso acabou me deixando descontraído e as preocupações ficaram de lado por enquanto. Disse-lhe que estava morrendo de saudades, de beijar-lhe seus lábios carnudos, de tocar em seus seios rijos e de vê-la suspirar de desejos com o seu corpo reclamando o meu. Ela deu risada e disse que não sabia se ia poder sair, pois já tinha saído ontem e seu pai estava em casa. Contudo, antes de desligar me prometeu telefonar no dia seguinte para marcarmos um encontro.
-- Mesmo que dê alguma coisa errada, me liga assim mesmo – pedi.
-- Ta bom meu amor, meu homem delicioso.
Então nos despedimos com a promessa de nos falarmos no dia seguinte.
Peguei no livro de Nietzsche e agora mais calmo consegui prosseguir com a leitura. Isso porém não evitou que de tempos em tempos interropesse a leitura com os mesmos temores. Sabia que até ter certeza de que ela não estaria grávida, meus dias alternariam entre momentos de grande preocupação e momentos de relativa calmaria.
Tive uma noite mais tranqüila. Não que minhas preocupações não ocuparam meus pensamentos na cama, mas agora via a coisa por um lado mais racional e mais prático. Cheguei inclusive a pensar em algumas saídas possíveis caso o pior acontecesse. O momento mais difícil seria encarar seus pais. De forma que pensei no dia seguinte procurar saber mais acerca de seu pai. Era melhor saber onde estava pisando e com que estava lidando. Não o via como um inimigo, embora certamente tornar-me-ia um quando soubesse que engravidei sua filha de quatorze anos. Aliás, uma das saídas possíveis era ocultar a gravidez de Ana Carla até encontrar um lugar onde fosse possível fazer um aborto. Sim. Se fosse possível sugeria essa saída a Ana Carla. Quanto a mim, não via nada contra o aborto. Via o aborto como a saída menos traumática para uma gravidez indesejada. Lembro-me que cheguei a comentar diversas vezes numa discussão acerca do assunto que o aborto não era um crime e que aqueles que se opõem não passam de hipócritas querendo justificar a vida a qualquer preço. Não, não. Nunca fui hipócrita e não seria agora que ia ser. Não ia obrigar Ana Carla a fazer aquilo que não queria, mas não pensaria duas vezes antes de propor-lhe essa solução. Inclusive, ao surgir com essa idéia na cabeça, senti-me ainda mais aliviado. Por que não fazer um aborto? Cogitei pouco antes de adormecer.
III
Acordei mais disposto na terça-feira. Essa disposição tinha uma explicação bem simples: acordei com os pensamentos em Ana Carla e principalmente imaginando um possível encontro no final da tarde. Aliás, dir-se-ia não de uma possibilidade, mas tão somente de uma certeza. De forma que passei alguns momentos na cama fazendo planos para nós dois. Imaginava onde poderia levá-la. Sabia que a cidade ainda estava cheia de turistas e que os locais onde costumávamos nos encontrar estariam abarrotados de casais de namorados. Não ia ser fácil encontrar um lugar deserto, ainda mais se Ana Carla tivesse de ir para casa antes do anoitecer.
Não sei quanto tempo passei na cama perdido em pensamentos. Quando decidi consultar o relógio, os ponteiros marcavam dez e cinco. Resolvi levantar antes que minha mãe batesse à porta. Aliás, achei até estranho ela ainda não ter feito isso. Descobri, ao dirigir à cozinha para tomar café, o porquê: não havia ninguém em casa. Olhei através da janela da sala e não vi o carro na garagem. “Ah! Ela deve ter saído com o meu pai”, conclui.
Sentado na sala, enquanto sorvia um copo de café com leite, procurei alguma coisa para assistir na TV. Não havia nada de interessante. Decidi deixar no canal de esportes.
Nesse ínterim, com a mente ociosa, as preocupações acerca da possível gravidez de Ana Carla voltaram a ocupar meus pensamentos. Pensei em lhe telefonar e perguntar como estava se sentindo. Todavia, havíamos acertado de nos falarmos após o almoço e combinar onde nos encontraríamos. Então por que me adiantar e me arriscar à toa? Não era melhor esperar que ela me ligasse? Vai que o pai dela atenda e começa a pôr pulga atrás da orelha? Não, não. Não valia a pena se arriscar sem necessidade. Era melhor esperar o seu telefonema.
Foi o que fiz.
Para ocupar meu tempo, cai em divagações. Pensei nos momentos incríveis que passamos no domingo. Deitado no sofá, com os olhos cerrados, quase pude ver e sentir o corpo nu dela se abrindo para mim e me recebendo como se meu corpo fosse parte do seu. Então eu me concentrei nos nossos movimentos, naqueles seios arfantes escapulindo entre meus dedos e meus lábios. E esses pensamentos envenenaram o meu sangue e o fizeram fluir para baixo, para a região dos quadris. O coração pulsou mais forte e um excitamento se tornou visível. Então eu desejei que ela estivesse ali para me receber e fazer com que meu corpo perdesse aquela tensão.
De repente, sem que me apercebesse, o foco de meus pensamentos desviaram-se. “Maria Rita. Por onde andará você? Ah, se Ana Carla imagina o que aprontei na sua ausência? Vai me odiar para o resto da vida. Ainda bem que não tem como ela saber. Maria Rita está muito longe. Também como poderia resistir a um tesão de mulher como aquela? Não foi à toa que a desejei desde o primeiro momento. Que avião! Puta merda! Que mulher mais gostosa!... Adoraria me encontrar com ela novamente, só para ouvir seus gritinhos quando estava gozando. Ah! Ela adorava um espetáculo. Foi a primeira mulher com que sai que adorava olhar o meu pau entrando na sua xoxota. Acho que aquilo lhe dava mais prazer que a própria transa. E ela escolhia as melhores posições para ter a melhor visão, aquela vadiazinha! Quem poderia imaginar que por trás daquela virgem havia uma mulher tão safada? Bem... Aquilo era excitante mesmo! Até eu senti mais prazer quando ficava olhando através do espelho...” Meus pensamentos fluíram por muito tempo. Isso aliás acabou me provocando um excitamento insuportável, um desejo intenso, uma vontade incontrolável de tê-la novamente, nem que seja por mais alguns minutos. Mas não havia como tê-la. Maria Rita voltara para sua cidade. Aqui só ficaram as lembranças dos momentos inesquecíveis que passamos naquele quarto de motel.
Mas eu precisava fazer alguma coisa para me livrar daquele desejo e daqueles pensamentos. Tentei não pensar mais nela fixando meus pensamentos em Ana Carla. Era em Ana Carla que eu deveria pensar a partir de agora. Era ela a minha menina, a mulher da minha vida. A lembrança daquele corpo esguio, de sua tez branca embora estivesse queimada de sol, daqueles cabelos claros, daquelas pernas longas e daquela voz soltando palavras numa pronúncia impecável teimava em não me deixar. Assim, aproveitando que estava sozinho em casa, corri até o banheiro e bati uma punheta, relembrando de sua vulva faminta.
Foi um gozo rápido. Coisa de dois minutos. De repente as forças me faltaram e o jato branco foi parar dentro do vaso sanitário. Então peguei um pedaço de papel higiênico e limpei a sobra quase pingando da glande. Joguei o papel no vaso onde jaziam bem no fundo alguns filetes brancos de sêmen. Não queria deixar vestígios do que acabara de fazer.
Meus pais chegaram logo em seguida. Por pouco não me pegaram com a boca na botija. Aliás, daria tempo para eu me recompor caso tivessem chegado antes, no entanto a punheta teria ido por água abaixo e eu teria ficado com vontade o resto do dia. Bem. Não sei se seria um mau negócio. Pois ao me encontrar com Ana Carla, não resistiria ao ímpeto de possuí-la. Em compensação, esse mesmo ímpeto poderia nos causar problemas. Eu conheço Ana Carla o bastante para saber que ela, quando excitada, não se importa com os riscos, e eu, na mesma situação, poderia me arriscar demais.; e assim sermos flagrados e denunciados por atentado ao pudor. Bem. Isso agora já não é mais problema. Certamente conseguirei agir de forma racional quando nos encontrarmos mais tarde.
Fui para o quarto, peguei o livro de Nietzsche e continuei a lê-lo. Agora sim, seria capaz de me concentrar na leitura. Seria capaz de me dedicar de corpo e alma ao pobre Nietzsche. Aliás, será que ele batia de vez em quando algumas punhetas pensando na Lou Salomé? Ah! Nietzsche! Será que ela nunca te despertou desejos incontroláveis? Será que para livrar desses pensamentos você não se masturbava? Não é possível que não desejasse as mulheres? E aquela história do chicote? Não estaria um desejo sádico? Aliás, a sua filosofia também tem um quê de sadismo. Aquela vontade de dominar também não deixa de ser uma forma de sadismo. Mas vamos deixar isso para lá. Afinal você não era o que a Lou queria. Tanto que ela lhe tocou pelo seu amigo Paul Ree, não é verdade? Ah, Nietzsche! No fundo você foi um grande infeliz. O mundo foi cruém consigo.
-- Filho! Vem almoçar! – chamou o meu pai, abrindo a porta do meu quarto. No exato instante em que devaneava acerca de Nietzsche.
-- To indo, pai – respondi.
Consultei as horas. Uma e quarenta e cinco. “Caramba! Tudo isso? Daqui a pouco ela deve me ligar. Preciso almoçar rápido e me trocar logo. Assim, quando ela ligar já estarei pronto..”, pensei enquanto me levantava.
Deixei o livro sobre a cama e fui para a cozinha, onde meus pais conversavam alegremente.
IV
Ana Carla me telefonou por volta das duas e dez. Eu tinha acabado de almoçar. Aliás, ainda estava sentado à mesa com meus pais. Conversávamos justamente acerca de minha namorada. Ou melhor, interrogavam-me acerca dela. Queriam saber mais do que já havia lhes contado e principalmente quando seria apresentada a família. Eu tentava me esquivar dizendo que ainda não era uma coisa muito séria, mas parecia não convencê-los. Era como se minha mãe captasse alguma coisa nos meus olhos ou na expressão de minha face. Mas por mais que desconfiassem de alguma coisa, eu jamais abriria a boca enquanto não chegasse o momento certo. E este ainda não havia chegado.
Quando o telefone tocou, corri para atendê-lo.
-- Oi, florzina! – falei, ao reconhecer sua voz. – E aí? Tudo bem?
-- Tudo, meu amor – respondeu ela.
-- E sobre aquele negócio? Tudo normal? – Tive que falar-lhe de forma prolixa para que meus pais não entendessem, pois certamente estavam prestando atenção na minha conversa lá da cozinha.
-- Ta sim. Estou bem – insistiu ela. – Estou morrendo de saúdes, sabia?
-- Eu também. Vai dar para a gente se ver hoje? – perguntei logo em seguida.
Houve um breve silêncio.
-- Sabe o que é? Meu pai está de folga e está em casa. Não vou poder sair – explicou ela, mudando o tom de voz, deixando transparecer um quê de tristeza.
Aquilo soou como um balde de água fria. Fiquei decepcionado e inclusive um pouco chateado. Aliás, não pude deixar de pensar: “Puta merda! De novo? Pra que fui me envolver com uma menininha? Agora toda vez é isso? Tem que ficar dependendo da permissão dos pais para sair. Bem feito! Você sabia onde estava se metendo. Agora agüenta...”, divaguei no novo silêncio que se formou.
-- Você ficou chateado? – quis ela saber, quebrando o silêncio e interrompendo meus pensamentos.
-- Claro que fiquei – respondi com certa gravidade.
-- Ah, meu amor! Eu também estou louca para me encontrar com você. Mas meu pai não vai me deixar sair. Só se eu disser que vou correndo na casa da Marcela. Mas aí vou ter que voltar logo, não vou poder demorar. Senão é capaz dele me dar uma coça.
-- Não, não, florzinha. Deixa pra amanhã – falei mudando novamente o tom de voz. Agora de forma natural e até com certa delicadeza.
Nisso, peguei o controle da TV e liguei o aparelho, aumentando o volume em seguida para que meus pais não ouvissem nossa conversa.
-- Que barulho é esse? – perguntou ela ao ouvir o som da TV.
-- Fui eu. Liguei a TV. Assim meus pais não ouvem nossa conversa – expliquei.
-- Por quê? Eles estavam ouvindo?
-- Estão na cozinha. Mas acho que sim – respondi. – Tem certeza que não notou nada de diferente em você? – perguntei a seguir.
-- Claro que não, meu amor. Se tivesse eu falaria.
-- Deus me livre se você estiver. Quando seus pais souberem, eu estarei ferrado. Vão me mandar prender – afirmei.
-- Mas por quê? – quis ela saber.
-- Por quê? Isso que a gente está fazendo é crime. Eu não poderia me envolver contigo.
Ana Carla quis saber mais. Mas eu não podia dar-lhe detalhes.; meus pais poderiam ouvir alguma coisa.
Falamos por mais alguns instantes. Antes de desligar ela prometeu me ligar amanhã assim que acordar.
Desliguei o telefone decepcionado. Queria tanto me encontrar com ela. Mas sabia que vez ou outra isso ia acontecer. Fiz uma escolha. E tudo na vida tem um preço. E o preço a ser pago para ter uma garotinha como ela era não a ter em todos os momentos que a desejasse, embora minha situação fosse bem mais confortável que a de um amante. Pelo menos ela era só minha e no futuro a teria ao meu lado nas datas mais significativas da minha vida.
Fiquei pensando no que fazer. Havia planejado tanta coisa e agora tudo fora por água abaixo. Senti-me desnorteado e perdido por algum tempo, feito alguém que recebe uma notícia inesperada e muito ruim ao mesmo tempo. Prostrei no sofá com os olhos na TV, mas sem dar conta do que assistia.
Meu pai sentou ao meu lado e perguntou se estava tudo bem. Respondi afirmativamente. Disse-lhe apenas que tencionava me encontrar com Ana Carla, mas ela estava com visitas e não poderia sair. Quis saber porque não ia então até a casa dela. Aí eu tive que explicar que ainda não fora apresentado aos seus pais.
-- Por isso você precisa trazer ela aqui para nos conhecer. E ela também precisa te apresentar aos pais dela. Assim acaba esse problema – disse ele, quase de forma repreensiva.
-- Mas eu já disse, pai, que os pais dela não vão me aceitar com facilidade. Lembra daquele dia que nós conversamos?
-- Ah, sim. Quando sua mãe estava na feira. Havia me esquecido.
-- Esse é o problema. Vamos ter que ir devagar – declarei.
-- Mas por que você não trás pelo menos ela aqui. Com a gente não tem esse problema – insistiu ele, pondo-me contra a parede. Aliás, tanto sua insistência quanto a de minha mãe estava me aborrecendo. Será que não percebiam que não adiantava de nada ficarem insistindo? Eu não podia apresentar-lhes Ana Carla. E tão cedo eles não a conheceriam. O pior era que a minha negativa certamente geraria desconfiança e muitas indagações em pouco tempo. E eu teria que me preparar para encontrar justificativa. Não seria fácil. Mas quando a coisa se tornasse insuportável, mentiria mais uma vez dizendo que terminara o romance com ela. E quando visse que andava saindo com alguém, diria que se tratava de outra namorada. E faria assim quantas vezes fosse necessário para ocultar meu relacionamento com Ana Carla.
-- Vou trazer sim – assenti. – Mas deixa a coisa se tornar mais séria. Por enquanto a gente só está saindo – menti.
-- Sua mãe diz que o namoro de vocês é pra valer – contou.
-- Não é nada disso – falei. – O senhor sabe como ela é: exagerada demais. Vê coisas onde não tem.
Ele concordou.
Sem demonstrar que não queria mais falar sobre isso, fui mudando de assunto. Em pouco tempo estávamos falando de política e de economia. E como sempre, meu pai defendendo o governo FHC enquanto eu declarava que se o Lula fosse o presidente o país estaria crescendo de forma mais rápida e o desemprego certamente seria menor. Meu pai discordava. Alegava que um governo Lula faria desse país uma anarquia.
Por mais de uma hora debatemos política, economia e futebol. Se na política estávamos em campos opostos, pelo menos no futebol torcíamos pelo mesmo time. O que fez com que a conversa findasse de forma amistosa.
Meu pai saiu pouco depois. Disse que ia jogar sinuca com os amigos. Inclusive me convidou para acompanhá-lo, mas não aceitei. Sentia-me um pouco deprimido por meu encontro com Ana Carla ter falhado. Não estava a fim de sair de casa. Assim, voltei para o quarto, peguei o livro e continuei a leitura. Aliás, não por muito tempo. Também me senti chateado com Nietzsche. Ele idealizara um tipo de homem que não tinha muita coisa em comum comigo. Para dizer a verdade, eu gostaria de ter as qualidades que ele atribuía ao verdadeiro homem, mas eu não as tinha. Eu era dotado de fraqueza como qualquer ser humano, e naquele momento essas fraquezas me faziam muito mal.
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Agora se quiser ler a versão da Ana Carla da história, então clique em: O DIÁRIO DE ANA CARLA
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