Acoplados e estáticos.
Suamos nossos odores.
Separados - por um plástico -,
Cobrimo-nos (repletos) de amores.
Entremeados nos cobertores,
Exsudamos nossos prazeres.
Esquecemos rusgas e dores,
Infâmias e malquereres.
O que nos move e paralisa
É o desejo insaciado
Que vem, sobe e desliza...
Depois? Vira pro lado.
Mas a estima mantém a procura
Mesmo depois da festa.
Assim, cessada a febre, a loucura
Nossa calma é o que nos resta.
O beijo é frouxo de lassidão
Que sucedeu à lascívia.
O abraço (mesmo morno, sem sofreguidão)
Traz ainda um toque de carícia.
Estamos assim, meio mortos
Esparramados na cama.
Absortos, obsoletos, tortos
Do torpor de quem se ama.
Bendita paz que me inunda.
Abençoada preguiça.
Bóio nesse fluido que me afunda
Já livre do fogo que atiça.
Mas é indizível o prazer de ver-te
Inerte, cálido, incapaz...
Por seu eu a musa desse flerte
Tão intenso e tão fugaz!
A fome passa e a sede cessa.
Seguimos quedos, quietos,
Nessa profunda modorra sem pressa,
Cercado de almofadas e afetos.
Aguardamos nova crise
Dessa convulsão bendita
Ansiosos da reprise
Que rebobina a fita...
Nesse círculo nos perdemos
Em dadivosa espiral.
Amamos e gememos
Geminados, sem igual.
Imbuídos desse rito,
Meio escravos do prazer,
Qual autômato da libido
No exercício do dever,
Fazemos dessa prática, num gemido,
O motivo de viver.
Certos de que o amor mais bonito
Ainda há de renascer.
Porque, juntos, nesse mister,
Ultrapassamos nosso fito:
Fundirmo-nos, num ser unívoco:
Homemulher!