A taberna de Virgílio fica encravada num profundo vale cercado de duas montanhas longilíneas e flácidas. Virgílio, carcomido pelo tempo e desfigurado pelas inúmeras rugas, era a resignação personificada. Homem sexagenário, Virgílio era viúvo de uma mulher estéril e pai de três filhos varões que as décadas levaram embora para os mais recônditos e sórdidos cabarés. Sentia no olhar putrefacto de seus últimos clientes a tristeza remontada num emaranhado de saudades de uma época gloriosa. Virgílio sempre bebia, antes de fechar sua taberna, o último gole do conhaque mais vagabundo que tinha nas prateleiras e caminhando pela floresta densa e coberta pelas neves do tempo, dizia a si mesmo, religiosamente: “Torpe conhaque, tens o gosto ingrato da nostalgia”.
Certa madrugada, no auge do inverno das Urais, a taberna quase pereceu, tamanho frio e desolação. O último cliente dormira com a boca aberta perto da lareira e Virgílio adormecera para espantar o frio. Subitamente adentrou na taberna de Virgílio uma jovem cigana húngara de pele de pêssego e olhos esmeralda. Diante de tal visão, Virgílio despertou e voltou a ser, por breves segundos, a criatura portentosa e descomunal de outras épocas.