Dedicado ao trabalho, o velho investigador estava calejado no mundo do crime, reconhecendo que as pessoas, muitas vezes, não medem esforços para obter os bens alheios, sacrificando todos os valores morais que a sociedade como um todo tem como positivos, não poucos tirando a vida de quem fica no caminho.
Sendo assim, nunca abre mão de levantar suspeitas nos casos de crimes aparentemente sem motivação. Achava que, como tantas pessoas são assassinadas no volante de seus automóveis, muitos assassinos bem poderiam simular um assalto ao acaso, visando, contudo, atingir determinadas vítimas.
Sua pergunta inicial, questão que, no caso de Renato, ficou pendente, era a respeito de a quem aproveitava a morte do professor. A primeira hipótese levou-o diretamente à esposa, até que, abrindo-se o testamento, se revelou que ela praticamente fora alijada dos bens.
Seguiu, então, todos os passos dos assassinos, levantando o possível roteiro seguido por eles, desde que se apoderaram do automóvel. Cometeram três assaltos, ferindo a tiros duas pessoas, apropriando-se de tudo que encontraram de valor com elas. No terceiro assalto, levaram outro carro, abandonando o anterior bastante desfalcado.
A motocicleta jamais foi encontrada, concluindo Macedo que pertencia a um dos bandidos. Não havia testemunha que a reconhecesse, tão comum era dentre as que circulavam pela cidade.
Imaginou, então, que, após se apoderarem do veículo, os criminosos se deslocaram até um local seguro para esconderem a moto, seguindo ambos no carro em sua funesta atividade.
Segundo as vítimas subseqüentes, vários itens do automóvel não constavam no momento dos assaltos. Sendo assim, o desmanche se iniciara tão logo trocaram a moto pelo carro, o que só seria possível, pelo tempo decorrido entre o assassinato e o assalto seguinte, se várias pessoas tivessem tomado parte na atividade. Contudo, nenhuma impressão digital fora da família se encontrou, o que era sumamente estranho, porque indicava que haviam trabalhado de luvas.
Quando soube que Juvenal obtivera quase a metade dos bens, sendo a outra metade destinada a Lutécia, o detetive passou a investigar os jovens, verificando que ambos estavam matriculados regularmente em escolas particulares. O levantamento da freqüência de ambos afiançava que só não haviam comparecido às aulas uma semana, justamente aquela em que o pai morrera.
Avaliou também se ambos gozavam de boa saúde e se tinham antecedentes de indisciplina nas escolas, tendo recebido a informação de que eram muito sociáveis e estimados dos colegas. Não encontrando nenhum desvio de personalidade, Macedo aceitou o fato de que Juvenal costumava ir às festas dos amigos, enquanto Lutécia acompanhava as coleguinhas de escola.
Não nos esqueçamos de que o detetive fez todos os levantamentos antes de terminar aquele ano letivo. Se tivesse insistido no ano seguinte, teria facilmente concluído que os irmãos não se matricularam em escola nenhuma. Apenas Juvenal se inscreveu num curso preparatório para os exames vestibulares, onde a freqüência não era apurada, misturando-se entre as pessoas mais velhas do curso noturno.
Na semana que nos interessa mais de perto, a delegacia recebeu uma denúncia anônima de que, em tal bairro, havia uma casa em que entravam e saíam muitas pessoas, tudo indicando que se tratava de uma boca de fumo. A vizinhança parecia incomodar-se ou seriam rivais de outra quadrilha? Macedo foi designado para a “campana”.