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Erotico-->9. LOURIVAL REGRIDE NO TEMPO -- 06/06/2003 - 06:20 (wladimir olivier) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos

Começou o irmãozinho a pensar seriamente nos sucessos da vida. Julgava que, se fosse lembrando-se dos acontecimentos, passo a passo, iria chegar a conceber os fatos como de arquitetura causativa, fundamentada na conhecida lei das conseqüências.

Por que ficara tanto tempo no hospital? Haveria explicação através das atitudes? Por que Ernestina se debruçara tão triste por ocasião do passamento, quando lhe deveria parecer certo que não seria restituído à vida?

A boa companheira dos últimos quarenta anos não deveria sofrer tanto, afinal de contas a perda dos filhos lhe dera condições de suspeitar de que não há mal em devolver a alma a Deus, obrigação de todas as criaturas.

Rememorou as circunstâncias das mortes das duas queridas “pessoinhas”, tragadas pelas águas barrentas da lagoa. Mas não se condoía. Houvera inúmeras comunicações recebidas pelos amigos no centro, em que os protetores e as crianças diziam estarem bem, confortavelmente instaladas em hospitais e escolas...

Quis afastar-se das tristezas. Reviu as primeiras épocas do matrimônio, mas as lembranças começaram a ganhar outro sentido, nas sensações dos descerramentos. Mais e mais os eventos foram corporificando-se, como se acontecessem naquele justo instante. Ia perdendo a noção de quem era para a recomposição de quem foi. Penetrava fundo na memória e os quadros se clareavam totalmente.

Havia um filete de memória, contudo, que lhe dizia que a hora não era aquela que tinha diante de si. Mentalmente, compunha situação parecida com a dos sonhos, quando o indivíduo sabe que está dormindo e que a realidade atual está na dupla perspectiva do que se passa com a consciência e do que se passa com o corpo entregue aos movimentos automatizados dos instintos.

O estranho é que ia concebendo o aparato dos conhecimentos, na explicação desperta, como se o enevoado da mente se desfizesse a cada rememoração. Mantinha-se consciente e dormindo, a um só tempo, sem angústia e sem felicidade. Parecia extático, como que dominado pelas sensações mais íntimas, juntando memória e capacidade de raciocínio num só bloco.

Desejava que assim fosse e não teve medo de confrontar-se com a verdade. Estava indo muito bem.

Chegou ao momento da partida do pai. Lágrimas de muito amor escorriam-lhe de novo, na recordação do sofrimento antigo. A mãe também partira, algum tempo antes. Não se deu o mesmo efeito do choro convulsivo, mas a tristeza da época se mesclava com sentimentos de ódio e de desprezo. Estremecia e começava a perturbar-se, mas foi forte o suficiente para não despertar. Precisava avançar no tempo, em busca das causas, das causas...

Lembrou-se dos brinquedos. Via-se com dez anos de idade. Começava a escrever. Demorara para ingressar na escola. Nunca se interrogara a respeito. Diziam-lhe que, na fazenda, as professoras eram raras. Não quis estacionar nessa época. Voltava mais atrás, queria a primeira infância. Entusiasmava-se com a nitidez das recordações. Fatos absolutamente apagados, voltavam-lhe com todas as cores.

Imaginou uma fita cinematográfica, mas não pôde fazer corresponder as sensações exatamente da mesma forma. No cinema, a película registra os acontecimentos mecanicamente. A visão humana é seletiva. O que lhe passava aos cantos dos olhos não se registrava. As noções do adulto podiam ser melhor estabelecidas. As infantis iam ficando embaciadas pelos interesses e pela impossibilidade das reflexões. Mas as pessoas e as coisas em que tocava ficavam perfeitamente reconhecíveis.

Inesperadamente, se viu dentro de um quarto com outras inúmeras crianças. Muitas choravam. Sentia medo. Via pessoas diferentes. Interrogava-se a respeito. As causas, as causas...

De repente, sentiu-se arrebatado dos braços dos pais. Quem seriam as pessoas com estranhas atitudes de sofrimento e dor? Quis aprofundar-se ainda mais.

Era um doce quarto. Perfumado. Talco e alfazema. Um homem acariciava-lhe a cabeça. Desconhecido. Diante de si o bico rosado de um seio. Sugava reconfortado. Quem era aquela criatura?

Não agüentou a pressão da curiosidade e despertou para o instante presente. Mas as recordações estavam muito vivas. A cabeça girava-lhe em rodopios de incompreensão. Queria entender. As causas, as causas...

Desmaiou.

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