Stamos em pleno ar, doudo de medo,
suando frio, coração na mão,
o olhar me trai, não faço mais segredo
coisa terrível o tal do avião.
Lembro as palavras que Vinícius já dizia:
"Mais pesado que o ar... com motor a explosão?"
Pois não há quem me console da agonia,
assustador o tal do avião.
"Deus! ó Deus, onde estás que não respondes?"
apavorado começo a rezar
e a comissária vem, sei lá de onde,
e me pergunta: - Tens falta de ar?
Como um fantasma em minha palidez
e ainda arfando dentro do recinto
respondo a ela, querendo ser cortês,
que é só de terra a falta que sinto
A bela jovem se abre num sorriso,
querendo aliviar a minha mágoa,
preocupada em saber do que eu preciso,
com simpatia me traz um copo d água.
Recuso tal oferta tão insossa
e por me imaginar beirando a morte,
sussurro no ouvido da aeromoça
que ela me traga uma bebida forte.
Ainda sorrindo, ela me pisca um olho,
enquanto fala, um tanto ou quanto irônica,
que eu bote minhas barbas de molho,
pois não servem drinques na classe econômica.
Apalpo os bolsos a procura de um cigarro,
quem sabe acalmo com uma baforada?
E outra vez com seu olhar me esbarro,
a me lembrar de uma atitude errada.
Há uma lei proibindo,
(a moça me diz agora,
sorrindo, sempre sorrindo)
fumar na primeira hora.
Eu então me desespero,
com movimentos convulsos,
estendo os braços e berro:
Por favor, me corte os pulsos!
Ao me ver fragilizado,
merecendo compaixão,
ela senta-se ao meu lado
e segura minha mão.
Assim foi o tempo inteiro,
eu feliz, ela também,
aeromoça e passageiro
se tratando de meu bem.
Do aeroporto já se vê a pista,
pro desembarque procuro me aprontar,
à nova amiga digo até a vista,
pois foi aceito meu convite pra jantar.
Quase chegamos antes de partir,
graças aos fusos e ao horário de verão,
temos a noite pra nos divertir...
que maravilha o tal do avião!
Do livro "Conversa de Butiquim" (Thesaurus Editora - Brasília, DF)
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