 
Os ladrões, cada vez mais raros no roubo nocturno, entraram há tempos democraticamente numa grande casa e, seduzidos por tantas delícias até aí inacessíveis, começaram a roubar a torto e a direito em pleno dia.
Mas, como nos velhos e bons tempos, surgiu um inoportuno galo a cantar de imediato sobre a cena. Desta feita, a intenção do galináceo não foi a de evitar o destino óbvio. Tão só pretendeu proclamar com o seu milenar alerta a nova modalidade de assalto aos bens dos cidadãos. Aos novos invasores de "mãos-sempre-muito-bem-lavadas", disse-lhes peremptório:
- Não se esqueçam que a minha função, que também evoluiu, é hoje em dia apenas cantar para dentro do cérebro dos meus eventuais assassinos e comilões.
– Olhe lá, ó seu galo – disse o chefe dos ladrões de "mãos-sempre-muito-bem-lavadas" – pode continuar com sua ladaínha à vontade. Você passa o tempo acordando as pessoas e o resultado é que elas dormem muito mais e melhor. Nós, limitámo-nos a honrar os nossos heróicos antepassados..
Esta nova maravilha, até a Esopo escapou!
António Torre da Guia |