O rapaz entra no consutório psiquiátrico. Cabisbaixo, com o ar totalmente arrasado, vai até a recepcionista e entrega um cartão. No cartão está escrito um nome e um horário. Ela lê, olha para o rapaz e pergunta:
- O senhor tem horário marcado com o dr. Gustavo?
Ele simplemente balança a cabeça afirmativamente.
- Senhor...Jorge Peçanha?
Ele balança a cabeça novemente.
A recepcionista faz algumas anotações, e diz:
- É só o senhor aguardar um instante que ele já vai lhe atender.
Ele senta e espera. Seu olhar é fixo no chão, parece perdido no tempo. Depois de uns dez minutos:
- Senhor Peçanha, pode entrar.
Ele entra no consutório, sempre com o olhar no chão. O médico já o analisa.
- Bom dia, senhor Peçanha. Sente-se, por favor.
Ele olha para o médico, e não diz coisa alguma.
- Em que posso ajudar?
Nenhuma palavra.
- O senhor tem algum problema de fala?
Ele fica olhando por um tempo o médico, e de repente:
- Não senhor, não tenho problema algum de fala. Quer dizer...pelo menos não tinha até uns dez dias atrás. Eu não sei mais o que faço doutor. Parece até feitiçaria.
- Bom...feitiçaria...sabe como é, esse negócio de feitiçaria não existe.
- Não sei não!? Não sei não!? Com todas as pessoas que falo, depois de dois dias elas morrem. Já foi minha mãe, minha esposa, meus amigos, o porteiro do meu prédio, pessoas com quem trabalho. E nos enterros então? As pessoas vinham me dar condolências,e eu, oras, agradecia.Pronto. Dois dias depois lá tava eu indo no enterro delas. Já foram mais de vinte. O último enterro foi ontem. De lá pra cá não falo mais com ninguém. Só estou falando agora, com o senhor...
