A palestrante entra na sala e todos já estão a sua espera: vinte e um treinandos (por que vinte e um? Não eram vinte) que irão trabalhar no Hospital Center Health. Ultramoderno, tecnologia de ponta, com toda uma estrutura montada para se assemelhar a um hotel. Para isso, o seu funcionalismo deveria ser capacitado dentro das mais modernas técnicas de Administração de Recursos Humanos. Nesse sentido, foi convidada a Dra. Sandra Sigmund Fridda, psicóloga de São Paulo, com larga experiência na motivação funcional.
Ao examinar os presentes, como sempre o fazia, notou alguém diferente da turma. Havia um homem na última cadeira, no canto da sala, olhando atento para a porta. Ele trajava uma camisa de mangas compridas de mescla azul e uma calça de linho branca. Além disso, estava de chapéu, tipo daqueles que os estrangeiros usam quando está chovendo. Realmente, destoava um pouco do grupo, pois a maioria estava de branco e, evidentemente, não usava chapéu.
A Dra. Sandra, como parte da metodologia de integração dos participantes, solicitou que cada um se apresentasse e dessa maneira se conhecessem:
- Sou André Kardyo Wentrículo, cardiologista, de Três Corações, com especialização no INCOR.
- Sou Christina Septo Nah Asao, otorrina, com especialização em Israel.
- Carlos Haio X. Shappa, radiologista, de Bela Vista do Toldo, Santa Catarina.
- Virgínia Big Lips da Silva, ginicologista, de Varginha, Minas Gerais.
- José Antonio Pinto Ho Xho, urologista, de Pau Grande, Rio de Janeiro, com especialização no Peru.
- Apolônio Aro Sotto, proctologista, de Cubatão, graduado em Pelotas.
E por aí vai. Demonstrava ser uma equipe bastante eclética e de origem bastante diversificada. O homem de chapéu, lá esfregando as mãos, nem encostava na cadeira, com ar de apreensão. Quando chegou a sua vez de falar, pediu para passar a outro. A orientadora pensou: Vai ver que ele é um P.H.D. excêntrico e de repente não deseja esnobar a turma. Lembrou que quando estava fazendo um curso de especialização tinha um homem que ia de saiote à aula, e imaginava ser um kilt escocês. Depois descobriu que era gay mesmo.
Continuou o seu trabalho, falando sobre gestão compartilhada, enfatizando que tomar uma decisão em uma empresa é como ter um filho: É preciso gerar, parir e amamentar a idéia para que ela floresça, e é o que vamos fazer agora. A essa altura, o homem de mescla arregalou mais ainda os olhos e começou a suar, mesmo com o ar-condicionado funcionando bem.
Notando a sua inquietação, a palestrante indagou se ele tinha alguma experiência sobre o assunto para compartilhar com o grupo. Ele fez um sinal firme de negativo. Utilizando um projetor multimídia, apresentou o tema: Feedback, entrando e saindo do caos. E ainda complementou dizendo que após sua apresentação, todo mundo ia dar o “feedback”.
Aí ele se agoniou de vez. A Dra. Sandra vendo a situação e com uma curiosidade imensa a respeito do PHD, após duas horas de atividade, resolveu perguntar:
- O senhor mora onde?
- Montanha – respondeu com uma voz quase inaudível.
- Ah! Montana, nos Estados Unidos, fica próximo à Dakota do Norte, já na divisa com o Canadá. Mas, aqui em Natal, onde o senhor mora?
- Óia, dona, eu num moro aqui não. Eu só vim de Montanha pru modo fazer um tá de exame do coração e me mandaro entrar nessa porta, num sabe. Mas, pelo visto eu vô é simbora, que aqui tudo é uma esculhambação danada. Eu to aqui “derna” das seis horas, sem tomar café e num fiz exame nenhum. Aparece a senhora dizendo vai parir na frente dos “home”, aqui da sala e ainda diz que nóis vai ter que dar o tá do “fidebeque”. Aí tá cum a mulesta mermo. Eu num sou home pra essa coisa não. “Pur” derradeiro ainda num sabe nem onde é que fica Montanha.
Realmente a Dra. Sandra tinha razão, ele era um P.H.D. (Perdido, Horrorizado e Decepcionado) homem do interior de Montanhas (RN)."
Esta e outras tantas crônicas engraçadas estão no Livro “Concerto para triângulo em dó maior” do nosso amigo Cronista, de Natal RN, Tasso Soares de Lima, pg. 85 a 87.