Segundo Toynbee, meu herói grego predileto – as grandes civilizações (inclusive a grega) teriam sido estimuladas por adversidades de intensidade média. Algumas endógenas e outras exógenas. Ou, escrevendo de forma que mais gente entenda sem arriscar dar um nó nos neurônios: às vezes, são de origem interna; outras, externa.
Antes, cabe advertir que, para os espíritos otimistas (ou que inadvertidamente se encontrem em situação análoga), a adversidade não constitui uma crise em si (depende de que lado estamos dentro do “status quo”).
Pode, também, nela existir uma oportunidade de desenvolvimento. Que ela não seja tão forte que nos destrua, mas que também seja forte o suficiente para mudar os parâmetros do modelo, e, em assim fazendo, criar um novo cenário.
A adversidade produzida pelas nossas próprias ações talvez sejam mais fáceis de identificar. Afinal, humanos que somos, a três por dois estamos tomando decisões equivocadas, pela forma que exercitamos o nosso livre-arbítrio, tendo em vista os critérios que nos propomos seguir ou a escala de valores que nos propomos seguir (quando não somos forçados a imitar outrem, não é, Baby Bush?)
A propósito, há quem valorize excessivamente o livre-arbítrio. Não eu, que cogitaria, antes, de uma liberdade de agir relativa. O Homem, afinal, possui a capacidade de inovar num montão de sentidos. Para o bem o para o mal. O que é certo, porém, é que todas as nossas ações gestam conseqüências.
E o que distingue um líder dos demais mortais? Exatamente a sua capacidade de criar situações novas. Mas, como pode ele fazê-lo? Convencendo os seus concidadãos de seus pontos de vista pela persuasão, à la Keynes, ou mediante comportamentos eletrizantes, de forma carismática. E o século passado nos oferece toneladas de maus exemplos do gênero, que recuso-me a relembrar para evitar o vômito.
Há quem negue que o carisma se apóia, sobretudo, em impactos propagandísticos, em truques mercadológicos? Possui algo de falsidade, de burla. A forma de liderança que considero válida, portanto, é tão-somente a primeira – a do convencimento racional, da argumentação bem articulada – e não aquela que brota da arte de esgrimir e manipular dados frágeis e conclusões suspeitas.
O ideal, portanto, é que toda a população de cidadãos fosse, no limite, formada por pessoas com comportamento de líder, ou seja, criativo. Ideal utópico, sem dúvida, quando sabemos que a nossa sociedade inclui grupos relativamente incapacitados de reflexão, como crianças, pessoas analfabetas ou semi-alfabetizadas (hoje, referidas como “analfabetas funcionais”, como é o meu caso em matéria de informática).
Também no tocante a ciência econômica, fica-me a sensação, como aos economistas clássicos, de que já se disporia de conhecimento (para não dizer tecnologia – o que soaria desgradavelmente tecnocrático) para se resolver pacificamente o problema da escassez, que tantas tragédias e guerras já causou.
Sobra assim, no âmbito da Economia, o problema da distribuição da renda e da propriedade – que, por certo, é mais complicado, posto que envolve questões políticas, a começar pela questão da participação popular na tomada de decisões e pela necessidade de reforma das instituições (que, via de regra, costuma demandar séculos!).
Tendo, portanto, resolvido substancialmente (ou, pelo menos, equacionado) o mais primitivo problema econômico – o da necessidade –, a Economia pode agora (e deve!) voltar a ser essencialmente política, voltando-se, portanto, para a solução do problema da liberdade (inclusive a minha, de continuar viagem até acolá ou retornar, de imediato, para cá!)
Ora, isso é puro Marx, que, afinal, não está tão distante assim dos economistas neoclássicos. Mas a ênfase na liberdade caracterizaria, antes, a posição da direita, segundo Bobbio. Ou não?
Trata-se, a meu ver, essencialmente de uma questão de seqüenciamento (temporal, claro). Para os economistas neoclássicos, a solução do problema econômico começaria pela solução do problema da necessidade e escassez; a preocupação com a eqüidade ficaria para depois. Só que, dessa perspectiva, a solução do problema da escassez necessitaria de liberdade.
Já o barbudo do Marx pensava diferentemente. Ele praticamente ignorou o problema da escassez e a necessidade de liberdade (que lhe parecia nociva), em favor de uma solução urgente para o problema da eqüidade. Parece que, excessivamente vidrado no curto prazo, conforme lhe ensinou Keynes, em Londres, ele relegou a um segundo plano as suas utopias anárquicas para o longo prazo! Estas, sim, é que seriam divertidas!!