HIPER-REVOLTADO _ É o cara que ateia fogo ao próprio corpo, em praça pública, em protesto contra o aumento de preço da farinha de rosca.
HIPER-COERENTE _ É o filósofo que se joga do alto do despenhadeiro, por não ter conseguido achar o sentido da vida.
HIPER-ESPECIAL _ Cada ser humano é um ser tão especial e visado, que periga ser fulminado caso pronuncie a palavra RAIO, no meio de uma tempestade.
HIPER-INCONFESSÁVEL _ É o deleite que todos sentem com o cheiro do próprio peido.
O varredor de rua, o capitão-de-indústria, o confiabilíssimo âncora do telejornal, o surfista, o senador da república, o ladrão, o jurisconsulto cheio de merda, o homem esforçado e preocupado, o cabra-safado, as velhinhas bondosas, os fundadores das sublimes doutrinas, a sumidade do direito tributário, o gênio da astrofísica, as madames requintadas _ todos curtem de montão a catinguinha maneira de seus gases (e quanto mais podre melhor!).
“Peido é que nem filho; cada um gosta do seu.”, reza o antigo provérbio.
Tanto o pobre como o rico saem igualmente ilesos do crime de fazer seu semelhante engolir merda em forma de gás. Mas a despeito desta democracia (ou anarquia) anal, e a despeito de nos considerarmos pessoas igualitárias e sem preconceitos, a verdade é que acharemos automaticamente mais fedorentos os peidos das pessoas velhas, das pobres, das feias, das gordas e das doentes mentais. Isto é regra universal.
Eu mesmo, que me julgava um sujeito cosmopolita e humanista, com o passar dos anos fui me dando conta de que me sentia mais indignado com peidos de chineses, coreanos, turcos etc. do que com os peidos domésticos, genuinamente brasileiros. Fui obrigado a admitir que, em algum grau, eu era, sim, discriminador e racista, pois abrigava o absurdo preconceito de considerar o peido nacional mais palatável que os oriundos dos cus desta ou daquela etnia. (Se bem que tem uma japonezinha na minha rua que, cá pra nós, até o peido dela eu trago!).
Mas, voltando ao aspecto mais incômodo da questão, o orgulho narcisista do peidorreiro é um fenômeno universal que depõe seriamente contra a grandeza do gênio humano. Imagine uma cena que com certeza se repetiu não poucas vezes: Rui Barbosa, o Águia de Haia, de pijamas, desfrutando uma indecente promiscuidade consigo próprio, sob o cobertor, sorvendo cada nuance do ar empestiado com o escrúpulo de um connaisseur. Ou aquela dama sensível que saca um lenço pra cobrir as ventas tão logo vê um indigente se aproximando, a trinta metros... ao passo que, na intimidade, se esbalda com a própria podridão.
Te agradeço muito por ter lido até o fim. Peço a fineza de não extrapolar em comentários e ilações maldosas, tá ok?! Essas pequenas e enigmáticas alegrias nossas, sei lá... melhor é deixar quieto.