A inveja do grilo
Certo grilo vivia num espaçoso campo, revestido de uma relva verde e cheia de viço e onde de tempo em tempo se viam flores silvestres de todas as cores, embelezando e enchendo de agradável perfume toda a vasta extensão daquele campo.
Numa ensolarada manhã primaveril, enquanto o Sol despontava fazendo brilhar com seus raios as gotas de orvalho que pendiam das pétalas coloridas, ele cochilava escondido entre as folhas de um arbusto espesso. De repente, despertou assustado com o esvoaçar ligeiro de um inseto que se aproximava. Era uma borboleta leve e graciosa que enfeitava o espaço.
- Que maravilha! - exclamou o grilo encantado - que asas delicadas e que colorido tão harmonioso que se distribui complementando o conjunto!
Diante de um quadro tão espetacular - uma borboleta cheia de beleza e graça beijando as flores orvalhadas - o pobre grilo, olhando o seu corpinho escuro e suas asas transparentes, sentiu uma vívida inveja e pôs-se a lamentar com amargura e descontentamento:
- Como sou feio! Malformado, incapaz de alçar um vôo ágil. Gostaria tanto possuir uma parcela do encantamento da borboleta, com sua leveza e seu colorido encantador. Quem me dera poder experimentar uma metamorfose que me transformasse e me fizesse feliz como a borboleta.
Enquanto o pobre grilo se angustiava nesse pensamento, chegou um bando de crianças que, vendo a linda borboleta que por ali voava, investiu contra ela na mais louca perseguição, sem tomar conhecimento da existência do grilo que, infeliz, lamentava-se na escuridão do arbusto.
Vôa daqui, vôa dali, e a borboleta, embora ágil, acabou mesmo sendo caçada pelo grupo de crianças. Vendo tão lindo inseto preso sem poder se defender diante de tamanha crueldade, foi que o grilo reconheceu:
- Afinal, é muito bom ser assim tão feio como sou. A borboleta perdeu a liberdade, e quem sabe a vida, só por ser bela!
Então, aliviado, o grilo voltou a cochilar no seu galhinho despreocupadamente.
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CARLOS CUNHA/o poeta sem limites
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