Do meio do campo de trigo alguém se mexe. Rasteja-se. Está cansado e nu. Seus pulsos têm marcas de corda, sinais de muito tempo tendo permanecido amarrado. Está molhado. E agora, por se rastejar pelo campo de trigo, sujo. Precisa alcançar a estrada. Precisa voltar para sua casa. Quer o conforto de sua cama. Quer ver este pesadelo ter fim. Continua se arrastando, protegido pelo campo de trigo. Por baixo, já começa a ver a estrada. Está faminto, com sede. Em sua costa tem uma marca feita com ferro quente, mas já cicatrizada. Suas mãos e seus joelhos sangram. Mas ele precisa continuar. Aproxima-se da estrada. Cada vez mais fraco. Mas continua a rastejar. Percebe que tem um carro parado. O motorista está a alguns passos do carro. Sozinho. Ele grita socorro. Desmaia.
- Quem é você? Qual seu nome?.
Ele acorda. Está no carro, um coberto lhe esconde a nudez. A pessoa que está à direção lhe é estranha. Um homem, bem vestido. Percebe que estão indo para a cidade, e o homem tenta em vão completar uma ligação do celular.
- Pedro! Fui seqüestrado e fugi.
- Estamos muito longe do local onde me achou?
- Sim, uma hora mais ou menos. Teve sorte. Não passa muita gente nesta estrada em feriado. É uma estrada meio deserta rural. Estava visitando umas comunidades, e tenho quer ir a sede da Diocese. Sou padre.
- Então Deus ainda não me abandonou. Preciso ir para casa.
- Mas antes vamos passar no posto policial, e em um hospital também, você está todo machucado.
- Não, por favor, não posso ir a policia nem a hospital. Pelo amor de Deus.
- Mas olhe sua situação. Está todo machucado. E mais, a policia tem que ser acionada.
- Pelo amor de Deus padre. Por tudo que lhe é sagrado, por suas ordens sacras e por sua Igreja, não faça isto. Só quero ir para a casa.
- Você quem sabe. Mas o que fez de tão grave?
- Prometa-me segredo de confissão.
- Como?
- Sim, padre, quero me confessar. E sei que não poderá dizer a ninguém o que fiz.
O padre apenas tem que concordar. Pedro lhe confessa sua história, andam muitos quilômetros ainda. O padre ouve horrizado a história dele.
- Sabe que se não se arrepender não posse lhe absolver meu filho. E o arrependimento vem com o desejo de consertar as coisas erradas que fez!
- Mas padre, eu não posso concertar nada. Não diga nada, apenas me deixe na cidade, por favor.
- Tudo bem, mais vai chegar na cidade assim. Vai ser preso por atentado ao pudor. Espere. – o padre para o carro e pega uma sacola. Tira uma batina negra, que ganhara de um paroquiano. Começa a se despir e entregar a roupa ao rapaz.- vista isto. Somos quase do mesmo tamanho. Eu coloco a batina.
Pedro vestiu a roupa do padre, e este desceu do carro para se arrumar. Estava abotoando a batina. Trinta e três botões romanos. Toca o celular.
- Que bom, já deu sinal. Alô? Como? Pedro? Ei jovem querem falar com você.
- O que o senhor disse?
- O telefone? Alguém quer falar com você!
- Padre, rápido, entra no carro...
Um tiro se ouviu no silêncio perturbador da estrada. O padre cai, com uma bala cravada em sua cabeça. Pedro, sem esperar liga o carro e sai em alta velocidade. Esta próxima a cidade. Já começa a ver os prédios. Mas não tem mais ninguém na estrada. Ele acelera. Que o mais depressa possível chegar em casa. Quando entra na cidade para o carro. Não pode aparecer com ele. Desce e começa a correr. Tem que correr. Ele sabe que precisa correr.