A bruxinha sem nome era pequena ainda, quando ficou órfã. Mesmo assim, deu tempo de aprender com sua avó e sua mãe, todos os truques e mágicas do bem...
Mas não suportava mais a solidão. Ela ficava dias e dias sozinha no casarão do alto do morro, sem ter com quem brincar, ou ao menos trocar algumas palavras porque havia um preconceito no mundo de que toda bruxa é feia e má. Na verdade, ela nem sabia se era feia ou bonita, porque o espelho mágico da parede dizia uma coisa, mas nas poucas vezes que saía de casa, as pessoas que raramente falavam com ela diziam outra... Mas de duas coisas tinha certeza: não era má; e que eram mentirosas todas as histórias que contavam de bruxas. Jamais presenciara em sua família, essas coisas horríveis que contavam, de cozinhar crianças em caldeirões ferventes, ou transformar príncipes em sapos...
Estava resolvida que mudaria esse conceito. Era uma questão de sua sobrevivência - ela pensou. E sem perder tempo, foi já colocando em prática as idéias que vieram à sua mente: iria até uma escola que conhecia, transformaria qualquer coisa em doces diante das crianças, e seria um sucesso... Genial.
Então a bruxinha sem nome pegou sua vassourinha, e ia saindo, quando lembrou que crianças tinham medo de vassoura. Voltou, deixou a montaria em casa, e saiu a pé. Estava um dia escuro, e parecia que iria chover. Não fazia diferença - pensou. Estava ansiosa por mostrar que não era má, e não podia esperar outro dia.
Enquanto caminhava, a chuva começou a cair. Fininha, a princípio, e finalmente, uma chuva forte. Pensou em voltar, mas já estava mais perto da escola que de casa, e resolveu prosseguir.
Dentro da escola, a professora tentava conter as crianças para que não saíssem para a chuva na hora do recreio. E para isso começou a contar uma estória:
_ Vocês sabem quem é que faz os raios?!... É uma bruxa má, que manda umas flechas de fogo, para matar as crianças desobedientes!... Depois, a bruxa pega a criança, e joga num enorme caldeirão com água fervente, e cozinha dias e dias, e as pobres criancinhas ficam gritando, chamando pelas mães, que nem ouvem seus gritos...
Falava ainda, quando a campainha tocou, e as crianças já estavam esquecendo a estória, atraídas pelos encantos da chuva.
Um instante depois a bruxinha entrou no pátio, toda encolhida de frio, e foi vista pelas crianças. Então sorriu para as elas, e não perdeu tempo, e fez uma mágica: transformou um objeto qualquer em uma caixa de bombons. Então alguém gritou:
_ Cuidado!... Olha a bruxa!...
_ Como é horrível, escorrendo água do caldeirão!...
_ Cuidado com essa caixa!... Parece de doces, mas deve estar cheia de raios!...
E no instante seguinte, as crianças começaram a jogar objetos na pobre bruxinha, que não pode fazer nada, a não ser pegar a caixa de doces, correr para a rua, e se esconder ainda debaixo de chuva.
E andou triste para os lados de casa, e quando já havia caminhado um pouco viu um menino maltrapilho que se abrigava da chuva debaixo de um banco da praça, com um cachorrinho. O cãozinho magricela latiu para ela. A bruxinha fez uma mágica, e jogou um osso suculento para o animal, que abanou o rabinho, e pegou o presente.
A chuva estava parando mas o menino ainda tremia de frio, e não teve qualquer reação. Então a menina se aproximou, e abriu a caixa, oferecendo os doces. Ele teve receio por um instante, mas a fome falou mais alto. Pegou uns bombons, e enfiou gulosamente na boca. Ela sorriu, com a caixa ainda aberta oferecida a ele que não teve dúvidas e encheu as mãos, e os enfiou nos bolsos.
_ Onde é que você mora? – ela perguntou.
_ Aqui, – respondeu.
A chuva tinha parado totalmente. E não disseram mais nada, porque ouviram o barulho de um carro com sirene e vozes de pessoas que falavam alto. Era o porteiro da escola, junto com a polícia, e mais algumas pessoas. A bruxinha percebeu que o menino teve medo.
O barulho já estava perto, e dava para entender o que é que diziam:
_ Ela se escondeu por aqui!... – alguém gritava.
_ Você tem certeza de que era uma bruxa?...
_ Tenho sim! Todos viram quando ela quis enganar as crianças com uns doces enfeitiçados!...
O menino olhou assustado, sem saber o que fazer. Ficou mais assustado ainda, quando percebeu que o guarda que estava perto viu a caixa de chocolates perto dele. Não tinha mais tempo para fugir, e tinha medo de ser apanhado, porque todos mentiam dizendo que ele fazia coisas que jamais fizera.
Mas a bruxinha deu um assovio, e num instante a vassourinha chegou. Ela pegou o cachorrinho, colocou na caixa vazia de chocolates, puxou o braço do menino, e no instante seguinte, as pessoas da praça viram os dois vultos levantarem vôo em direção ao casarão do morro.
No outro dia, o tempo amanheceu de sol. Um dia lindo!... O menino estava limpo, alimentado, e dormia como jamais havia dormido em sua vida.
Já pelo meio da manhã, a menina saiu para o jardim em frente do casarão, com o cachorrinho, cuidando para não fazer barulho dentro de casa e acordar o novo amigo. O cachorrinho estava muito contente e brincava com ela.
Nisso, o carro da polícia passou lá fora, do outro lado do portão...
No mesmo dia, correu uma nova mentira: Diziam na escola e na cidade, que a bruxinha má, tinha transformado o menino da praça, em um cachorrinho...
- Ainda bem que foi só o menino da praça, - diziam...
