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Infanto_Juvenil-->A MALDIÇÃO DA ROSA BRANCA - PARTE VI -- 12/02/2003 - 17:26 (Angellus Domini) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos
CAPITULO VI

- Professora Márcia posso falar com a senhora?
- Senhora André? Desde quando se chama uma pessoa quase da sua idade de senhora? Me ofende assim garoto, acha que sou tão velha assim? Márcia olhou bem nos olhos de André, e deu um sorriso que quase o desmontou. Ele ficou vermelho e abaixou a cabeça. – O que foi garoto? Fala, o que ia me pedir?
- Bem, é, eu, queria que a senho... Você me desse uma permissão daquelas que é necessário para entrar no, no... andar restrito da Biblioteca. Seria possível?
- Depende? O que você pretende fazer no andar restrito sem que seja necessário? Nenhum aluno pediu permissão ainda para aquele andar este ano, e não quero enfrentar problemas com a poderosa Senhora Reuter!
- Bem professora, é que a parte mais importante da coleção de física do Frei Mher está lá, e todo mundo diz que é uma das melhores já reunidas...
- Tá bem, ! Mas olhe lá hein. Não vá me arrumar problemas. Já lhe disse, nada de problemas com Marina Reuter. Ela tem poder de fogo para desabonar qualquer um com a Ermínia, e não quero confusão. E se me chamar de senhora de novo, nuca mais lhe dou esta solicitação.
André conseguira. Iria poder verificar o que fez a fama dos livros de Alex Mher. Passar pela portaria não fora tão simples. Apresentara a solicitação da professora Márcia, mas esquecera da carteirinha de estudante e comprovante de pagamento da mensalidade. Para surpresa de Bia, em quase quinze minutos já estava de volta. Bia o acompanha até o segundo andar, e reservadamente apresenta a Marina a solicitação.
- O que você quer exatamente rapaz? Pergunta Marina com voz grave e autoritária, mas o mesmo tempo em um tom baixo, que ela se acostumou a falar nos seus dez anos de Biblioteca.
- Bem, é que a professora Márcia nos deu um trabalho, e ainda não encontrei alguma novidade nos livros, e ela sugeriu os livros do Frei Mher. André já estava quase tremendo. Tinha vontade de sair correndo, tal era a frieza da expressão de Marina Reuter sobre ele, como se dissesse “eu sei que você está mentindo”.
Mas ao contrário, Marina leu mais uma vez a solicitação, olhou friamente para André, e disse:
- É por aqui!
O coração de André quase saiu pela boca de alegria, foi seguindo Marina pelos corredores da antiga casa, onde cada sala ou quarto tornara-se uma seção de livros, dos mais variados assuntos.
- Realmente os freis fizeram um bom trabalho! - Comentou André com ar de bobo para quebrar o gelo.
- E é por isso que eu estou aqui, para proteger esse trabalho. - Respondeu secamente a bibliotecária, demonstrando que ali não era lugar para conversa.
Continuaram a andar, chegando até uma saleta, utilizada para uns volumes novos de artes. Podia-se sentir o cheiro do livro recém adquirido, que ainda não fora sequer manuseado. Distraiu-se um pouco, quando uma voz o chamou do meio das estantes.
- Pela sua carinha de assustado não veio ver artes, não é mesmo meu rapaz. Aposto que está inaugurando a seção restrita não? - André já conseguira distinguir de quem era a voz: Ângela Ravasi Maia, que naquele momento verificava a nova aquisição para o departamento de Artes, livros com a reprodução de quadros dos renascentistas, barroco e impressionista. Estava radiante, como uma criança que ganha um brinquedo novo. – Viu que gracinha minhas novas crianças, benzinho. Pena que a Marina fica como um cão de guarda em cima e nem deixa eu levar para casa ainda.
- É Ângela, sou mesmo um cão de guarda, se não metade dessa obra já estaria na sua casa, né?
- Viu como ela é chata. Quem é você, garoto?
- Sou o André, estudo Ciências, e estou indo fazer uma pesquisa para a professora Márcia, de Física.
- Há, a Márcia já chegou matando. Bonita ela né. Vocês conseguem assistir aula ou ficam olhando para as pernas delas? - Ângela falou já quase gargalhando com a cara de vergonha de André, mas suas gargalhadas foram interrompidas com uma pequena bronca.
- Devia ter vergonha de portar-se assim Professora Ângela, ainda mais com o sobrenome Ravasi. Quer arruinar a reputação de nossa família? - Ermínia com o semblante sério estava acompanhada de Elza sua irmã, e da Chefa do Núcleo de Educação, Sandra Pereira Silva, uma jovem negra, que começou a trabalhar como servente no Ginásio Estadual, formou-se, e aos 32 anos, já era atingia a Chefia.
- Credo Ermínia, que cara é essa, aconteceu alguma coisa...
- Aconteceu Ângela. Recebi uma denuncia grave sobre um professor... – Ermínia para de repente, e fita André - Quem é você rapaz? O que faz aqui?
- Ele é aluno de Ciências e veio fazer uma pesquisa para a professora Márcia. – Marina intervém, prontamente, sentindo como se seu autoridade na Biblioteca fosse questionada por Ermínia. Se ele estava ali, é porque ela tinha autorizado. – Vai fazer uma pesquisa nos livros antigos.
- Sim, então suba logo. Marina, quero que você e a Ângela me acompanhem, pois a denuncia que fizera é muito séria.
- Mas, Ermínia, se é um professor da Faculdade não me diz respeito, não é? – Ângela não parecia nem um pouco preocupada com o assunto, e estava envolvida ainda com seus livros.
- Quem disse que era professora da minha Faculdade. Um professor das crianças de Santa Cecília foi acusado de ser maníaco sexual... – Ermínia já estava alterada, e Ângela deixou cair o livro que estava em suas mãos. – e você rapaz – disse severamente para André – não ouviu nada, suba e faça sua pesquisa.
Marina Reuter, visivelmente contrariada a intromissão da diretora no comando da Biblioteca, abre a porta que dá acesso ao andar superior.
- Os livros de Física estão nos estantes 03 a 07, mas tome cuidado. Estes livros são raridades, e não podem ser pagos. Pesquise tudo o que quiser ai mesmo, pois eles não são emprestáveis. Quando terminar, interfone para a recepção, que a Bia vem abrir a porta.
André sentiu o ar frio do andar climatizado gelar-lhe o rosto. Viu quando Marina fechou a porta e seguiu as outras. Sentiu-se sozinho. Foi subindo as escadas, quando defrontou-se com uma enorme sala sem divisórias como era os andares de baixo, repleta de armários numerados em ordem, como era esperado. Dirigiu-se para o armário de numero três, olhou longamente os nomes, autores, distraindo-se por alguns minutos. Começava a entender o porque de tanto segredo, tanta rigorosidade naquela coleção. Começou a andar entre os armários, olhando os títulos, quase todos em latim, grego, inglês antigo, árabe. Títulos em português do começo do século XIX, títulos atuais, mas raros, enfim, uma verdadeira coleção de obras de arte. Envolto em tantos volumes, começa a andar, olhando os titulo enfileirado nas prateleiras negras, como soldados que protegem o saber, começa a perceber o tamanho da sala em que esta. Ela ocupa todo o terceiro andar do prédio, em uma peça única, ainda guarda as marca da decoração sombria e fria do século passado. Mais uma coisa começou a chamar-lhe a atenção. Uma porta sem fechadura incrustada na parede, que aparentemente não dava a lugar nenhum, estava semi-encoberta por um armário com livros de teologia dos antigos donos da biblioteca. Ao lado dele um grande baú, que estava pregado ao solo, e aparentemente não era aberto há muitos anos. Sem saber porque, ficou admirando o baú, como se uma força o atraísse para aquela peça. Começou analisar o baú. Devia ter pelo menos uns cem anos, era de madeira maciça, entalhado com figuras de animais: dois leões com as patas dianteiras elevadas como se estivessem lutando, uma águia carregando uma cobra no bico e uma rosa no meio dos três animais. A rosa era pintada de uma tinta branca, mas mostrava marcas do desgaste do tempo, e em seu miolo ficava o buraco da fechadura. O resto do baú era entalhado em baixo relevo com figuras disformes, que lembravam ramos de roseira. André mediu-o e encontrou a medida de cinco palmos de altura por sete de comprimento. Era realmente uma bela peça. Tentou abri-lo, mas percebeu que estava trancado. Agora já tinha esquecido completamente o motivo da visita ao prédio; estava completamente por aquela peça de madeira. Ficou por algumas horas ali, sentado no chão, tentando descobrir como abrir aquele baú, e mais, imaginado o que poderia ele conter. Sua imaginação rolou a mil. Quanto mais pensava, mais atiçava sua curiosidade em saber o que aquele baú continha. De repente, fora despertado de seu êxtase por uma mão em seu ombro.
- Sr. André, já estamos fechando, o senhor não gostaria de dormir aqui, ou gostaria?
A pergunta ecoou longe, fazendo André perceber o quanto estiver distante nestas ultimas horas. Virou-se para descobrir que o chamara, e deparou-se com a novata Bia, que tinha encontrado quando entrara ali. Pode reparar que, apesar da pouca idade, Bia aparentava ser mais velha que ele. Baixa, magrinha e com o cabelo preto cortado a chanel, copiando o modelo da ruiva Marina Reuter. Usava uma camiseta com o emblema da biblioteca e calça jeans, roupa que adotara como uniforme, por não ter outra opção; guaradva todo o dinheiro para ajudar a terminar de construir a casa onde morava com sua mãe e seus irmãos. Acostumada desde cedo ao trabalho pesado, pois perdera o pai para o alcoolismo, Bia sustentara a casa desde então. Trabalhou para Marina de doméstica, e com o apoio desta voltara a estudar. Por seu jeito compenetrado, sério e organizado, Beatrix conquistou a confiança de Marina, que a transferiu para a limpeza da Biblioteca, dando a ela o acesso ao andar restrito do prédio. Em pouco menos de um ano, ela já era a assistente direta de Marina na administração da Biblioteca.
- Desculpe-me, mas não pensei que se passara tanto tempo. – André olha para o relógio e se espanta que conseguira ficar tanto parado olhando para aquele baú antigo.
Bia parece compreender André. Fica olhando por alguns instantes para o baú e depois, fala com um sorriso para André:
- Ele é realmente atraente. Já fiquei tardes inteiras olhando para ele, pensado o que pode estar guardando. Nem a dona Marina sabe. Ela diz que isto é coisa do avô da professora Ermínia. Parece que o velho tinha parte com o coisa-ruim. O tal do Sr. Tomaso nunca se entendeu com os freis. Esta sala era o único lugar que ele ficava durante os seus últimos dias. Ninguém o via. Dizem que quando estava morto, no caixão, estava quase um esqueleto, de tão magro, o coitado. Toda vez que dona Ermínia vem aqui, ela jamais encosta neste baú, nem sequer olha. Nunca comentou nada, e a única vez que a Marina perguntou o que havia nele, ela a proibiu de tocar no assunto. Eu tenho medo deste lugar... – Bia já se afastara do baú e evitava olha-lo. – Venha senhor André. Já tenho que fechar a biblioteca. A Marina vai ficar até mais tarde em reunião com a professora Ermínia, com a Ângela e com a Sandra e a professora Lia, a diretora do ginásio.
- Mas o que aconteceu?
- Parece que tem uma fofoca de um professor do ginásio. Coisa de pedofi...- Bia coloca a mão sobre a boca, com cara de quem falou que não devia e não tinha como voltar atrás.
- Você está dizendo que tem um professor pedófilo no ginásio, aqui em Santa Cecília? Os nossos professores? Tem alguma coisa errada nisso? - André parece chocado com a noticia. Santa Cecília jamais teve um caso sequer deste com professores, e seus professores sempre foram muito firmes com os alunos, mantendo uma tradição de moral e disciplina que fazia fama.
- Bem, quer dizer... Não é bem assim, parece que tem um professor que veio de fora, e... Ah esquece isso. Vamos logo que tenho que ir na casa da Marina entregar a chave.
André saiu da biblioteca com aquilo na cabeça. Nos últimos anos, o único professor novo que se mudou para Santa Cecília fora Benedito, e ele jamais poderia aceitar que Benedito fosse um pedófilo. Era um cara normal, aplicado, sério. Pesava contra ele o fato de ser ateu, o que para as professora mais antigas era inadmissível, um professor sem moral cristã, como elas diziam, era o fim do mundo, e também ser tão fechado, quase sem amigos. Na faculdade o evitavam, dos professores aos alunos, com exceção de André, por acha-lo estranho. André chegou no seu quarto com aquilo quente na cabeça. Entrou no banho, pensando em procurar o amigo, mas estava tão cansado que, ao sair do banho, nem ao menos se trocou, e já caiu na cama, entregando-se ao sono. Tivera um sono pesado, e sonhara que estava novamente na biblioteca, mas o salão restrito estava vazio, somente com o baú. André aproximou-se dele e o abriu. Encontrou um esqueleto coberto de pele, que aos poucos foi tomando a forma de Benedito, gritando que era inocente. André acordara com o despertado, já quase na hora de ir para a aula. Estava assustado e havia transpirado tanto durante o sono que seu lençol estava ensopado.
Durante aquela semana Benedito não apareceu na Faculdade. Todos comentavam o caso de pedofilia. Mais nada havia de concreto. Apenas uma denuncia anônima, dizendo que o professor Benedito era um pedófilo fugido de sua cidade, acusado de manter uma relação com uma criança de doze anos. Especulava-se se era menina ou menino. Na aula, o professor proibira de comentar no assunto. O mesmo fizera Ermínia, dizendo que não havia provas, e que não podiam denegrir a imagem de um aluno da Faculdade e de um professor.
Passaram-se vários dias, e já se esquecia o fato. Porém Benedito estava sumido desde então. Não atendia telefone, sua casa estava fechada e não se observavam movimentos. André o procurara algumas vezes, mas como nada encontrou, pensou que ele estava viajando, para esquecer o fato. Estava agora novamente com sua atenção voltada para o baú. Sua situação com Valquiria estava estável, isto é, via-a com certa freqüência. Visitava-a nos fins de semana, e quando dava, se encontravam na Faculdade. Com a ajuda da professora Márcia, André, freqüentemente estava no andar proibido da biblioteca para visitar o baú. Certo dia estava sentado, observando como estava preso ao solo, quando percebeu que no assoalho, bem perto do baú, tinha uma fenda, quase imperceptível, já encoberta pela cera que dava o brilho no lugar por dezenas de anos. Pegou sua lapiseira, que trazia no bolso da jaqueta, junto com a caneta e documento, e com a ponta começou a esfregar na fenda que começava a revelar uma pequena placa solta no assoalho, do tamanho de uma caixa de cigarros. André começou a esfregar com mais força, e quase quebrando a ponta metálica de sua lapiseira, arrancou a pequena placa, e ao ver o que escondia, quase gritou de alegria. Uma pequena chave, com o cabo esculpido em forma de cabeça de leão, quase toda tomada pela ferrugem do tempo. André conseguiu refazer-se da euforia inicial, e começara a pensar no que fazer agora. Aproxima-se do baú. Sente seu coração querendo sair do peito de alegria, como a criança que ganha um brinquedo novo. Coloca a chave no miolo da rosa, dá duas voltas, e escuta o barulho das trancas se soltando dentro do baú. Conseguira, seu objeto de desejo finalmente estava próximo de suas mãos. Era uma outra caixa, mas de metal, com os mesmos desenhos, os leões e a águia com a cobra, e a rosa, num alto relevo. Preso a ele por um corrente, uma pequena chave. André já tinha avançado demais, ele sabia. Estava nervoso, e o suor escorria pelo rosto, embora estivesse num ambiente frio. Mas decidiu ir até o fim. Com as mãos tremulas, pego a pequena chave e colocou na fechadura da pequena caixa de metal. Um livro, com capa de couro, e folhas amareladas pelo tempo, pouco menor que a caixa era o único conteúdo. André não tivera coragem de abrir o livro. Poderia danifica-lo. Mas não conseguia parar de pensar no que deveria ser aquilo. Um baú antigo, com a chave escondida em um piso falso, com uma pequena caixa de metal com um livro dentro, que ninguém pode falar. Não fazia sentido. Mas André decide fazer a loucura que poderia comprometer sua vida. Pegou o seu cinto e com ele amarra o livro envolta de seu corpo, e que seria facilmente disfarçado por sua jaqueta. Fecha a pequena caixa de metal e a coloca novamente no baú.Recoloca a chave do baú no lugar. Limpa o suor, e fica andando entre os armários para distrair-se um pouco, e ficar menos nervoso. Finalmente, ciente da loucura que acaba de fazer, decide que esta na hora de ir. Já deu sorte demais por hoje. Bia e Marina poderiam ter chegado a qualquer momento e ele poderia a esta hora estar indo para a cadeia. Mas ainda teria de passar pela portaria. Respira fundo, e interfona para que Bia venha abrir a porta. Ninguém atende, e ele ouve passos vindo pela escada. André vê a porta abrir-se e depara-se com Bia e com a professora Márcia.
- Parece que os livros do Frei Mher têm açúcar. Você não sai mais daqui. – Márcia disse sorrindo para André, demonstrando que estava feliz por ter um aluno tão aplicado – Quero ver todo esse conhecimento sendo aplicado na sala de aula.
- É, realmente, o livro, quer dizer, os livros me fascinaram bastante. – André já estava nervoso. Já não pensava mais em nada.
- Fascinam tanto professora, que tiver até que vir busca-lo outro dia, de tanto que estudava... – Bia mal disfarçava o riso, e olhava como cúmplice para André, sabendo que sua verdadeira obsessão tornara-se o baú. - Ah, ia me esquecendo, um amigo seu, aquele professor dos boatos veio te procurar.
- O Bendito? Ele esteve aqui?
- Sim, disse que passa na tu casa depois. Queria te falar, mas disse que não queria te incomodar nos estudos, e como não podia subir... - Bia ainda nem pode falar e André já saiu correndo pelas escadas. Benedito estava há dias sem dar noticia. Ele queria saber o que realmente aconteceu. Bia tentou chamá-lo, mas o hábito adquirido com Marina, de nunca gritar na Biblioteca falou mais forte. Ela achava que André fosse incapaz de roubar algum livro, e, além disso, ele não estava com nenhuma bolsa. Era improvável que fizesse algo assim. Deixou a professora Márcia fazendo suas pesquisas e foi cuidar de suas tarefas.
Quando chegou a portaria, André encontrou a professora Ângela e a professora Ermínia, que lhe perguntaram se ele sabia da Marina ou da Bia. Apressado ele disse que não viu a dona Mariana, e que a Bia estava no terceiro andar, deu as costas para elas e apressou a sair da biblioteca, enquanto ouvia os passos delas pelas escadas.
André já sentia-se incomodado com o peso do livro. Sem ter tempo de ir para casa, pois queria passar pela casa de Benedito antes, passou em uma livraria e comprou uma mochila barata, mas com grande espaço. Não seria inútil, já que precisava mesmo de uma. Entrou em um banheiro, e desamarrou o livro do corpo e colocou na mochila, colocou juntos os documentos e coisa que guardava no bolso. Já estava a caminho da faculdade quando foi abordado por um carro.
- André, estava te procurando, posso falar com você? – André reconheceu a voz de Benedito, que parecia nervoso e triste.
- Cara, onde você se enfiou estes dias todos. Estávamos todos preocupados. Que aconteceu?
- Entra no carro, que a gente pode conversar melhor, mas não aqui no centro. Não quero ser visto por enquanto por muitas pessoas.
André entrou no carro. Os vidros escuros garantiriam um pouco de privacidade, rodaram pela cidade, em silêncio. Até que Benedito resolveu quebrar o gelo:
- Por que ela fez isto comigo?- falou com uma certa mágoa
- Ela? Ela quem? Quem fez o que?
- Sua namorada André, a Valquiria.
- A Val? O que ela te fez? Eu não estou entendendo mais nada.
Benedito acende um cigarro. Esta tremendo, quase não consegue falar:
- André, o que você faria se soubesse que sou gay?
- Gay? Você? Mas o que isso tem a ver com a conversa?
- Eu morava em uma cidade do interior, pequena, zona rural. Meu pai me expulsou de lá. Fui para Jacarezinho e estudei. Tentei voltar para minha cidade já formado, quando o velho morreu, mas minha irmã, que era diretora da escola jamais me aceitou na escola. Foi quando resolvi ir para São Paulo trabalhar em academias. De São Paulo fui para Minas dar aulas, mas uma aluna começou a dar encima de mim. Como disse para ela o que realmente era, ela inventou que eu estava assediando os garotos. Ficou provado que tudo era mentira, mas o clima era insuportável. Vim para Santa Cecília, tentar refazer minha vida, mas...
- Mas o que? - André já estava nervoso e já falava alto com Benedito. – e o que a Val tem a ver com tudo isso?
- Essa garota de Minas é prima da Valquiria. A Valquiria já sabia de tudo. Sua prima entrou em depressão depois do acontecido e teve que ser internada. A cidade toda zombava dela ter se apaixonado por um gay, já que o escândalo foi parar no fórum, correu processo, e os alunos negavam que eu os assediava. Eles nem sabiam que eu era... Acabou cometendo suicídio. Quando cheguei aqui, e comecei a falar com você, a Valquiria venho falar para eu sumir da cidade. Eu disse a ela que eu só queria refazer minha vida. Não queria problemas com ninguém. Mas ela disse que ia se vingar pela sua prima se eu não sumisse da cidade e nunca mais falasse com você. E inventou toda aquela história de pedofilia. A professora Lia, me chamou para uma reunião com aquela mulherada, a dona Ermínia, a Marina, a Sandra e a Ângela, mais os professores da escola. Contei toda a história para eles. Mas eles disseram que seria melhor eu para de dar aulas aqui. Estou desempregado, sem moral e sem saber o que fazer. – Benedito começou a chorar baixo, estava realmente desesperado. André sem saber o que fazer coloca a mão em seu ombro, abraçando-o, tentando acalma-lo, até que batidas no vidro do carro os chama:
- Era que eu estava esperando para ver, seu sem vergonha. Eu passei quatro anos da minha vida sendo fiel e você me trai com uma...
- Não se atreva a dizer nada Valquiria, você não sabe o que esta dizendo.
- Eu não estou pensado nada André. Eu simplesmente vi, você abrando este veado.
- Cala a boca Valquiria. Já não basta ter acabado com a vida dele. Ter feito ele perder o emprego e o nome aqui em Santa Cecília. O que mais que você quer?
- Quero que ele morra. Assim como ele fez com minha prima.
Valquiria já estava gritando. André desce do carro para tentar conversar com ela, e nem percebe que sua mochila, que estava em seu colo cai.
- Valquiria vamos conversar, você esta nervosa, mas não tem nada. O Benedito somente estava nervoso. Eu...
- É, e ai você resolveu consola-lo com seus abraços. Como pude ser tão idiota e não perceber...
- Olha Valquiria, quer saber, eu já estou de saco cheio desse namoro, de você, da sua família viver querendo controlar minha vida. Acabou, Valquiria, acabou. Não suportaria viver com uma pessoa sem escrúpulos com você. Nunca mais quero olhar na sua cara. Benedito me dá uma corona até em casa. - André já não estava consciente do que falava. E nem notou a mochila, com o precioso livro que estava ali no chão. Estava para entrar no carro, quando ainda ouviu Valquiria gritar:
- André, se você entrar nesse carro, eu te mato, esta me ouvindo, eu mato vocês dois.
André entrou no carro sem prestar atenção em Valquiria, que continuava gritando que ia matar os dois. Bendito tocou o carro, e André pediu que o levasse para casa. Não falaram nada. Benedito ainda estava chorando.
Valquiria ficou transtornada. André o abandonara por culpa de Benedito. Ela jamais o perdoaria. Pela primeira vez odiou André, e sentia o desejo de vê-lo morto, junto com Benedito. A lembrança da prima que cometeu suicídio veio a sua cabeça, e ela prometeu vingança. Começava chover, e já estava escurecendo, quando Valquiria notou algo no chão. A mochila de André. Pegou-a e saiu correndo, para se proteger da chuva que ameaçava engrossar. Sabia que André a procuraria para buscar aquilo.
Quando chegaram na casa de André, ele perguntou se Benedito queria entrar, ma ele disse que não, pois precisava arrumara as coisas para ir embora e estava chovendo muito. André estava descendo do carro, quando procurou sua mochila.
- Benedito, onde esta a mochila que eu estava carregando? Estava aqui no carro?
- Deve ter caído do seu colo quando você desceu para conversar com ela.
- Preciso voltar lá, aquela mochila não pode sumir, de jeito nenhum.
Voltaram para o local onde encontraram Valquiria. André e Benedito procuram por cada canto. Nada.
- A Valquiria deve ter encontrado. Amanhã você procura melhor, André. Você já está encharcado. Pode ficar doente. Vamos?
- Mas Benedito, você não entende, não posso perder aquele livro...
- Que livro? Não estava procurando a mochila?
- É, mas tem um livro antigo, bem antigo que eu... Peguei emprestado na biblioteca. A Marina vai me matar se eu não devolver.
- Mas vamos. Amanhã a mochila aparece.
André se conforma em esperar. Agora já estava tudo perdido mesmo. Se o livro tivesse tomado chuva, adeus. Se alguém o encontrou, e junto, seus documentos, estava perdido da mesma forma. Se a mochila ficasse perdida e com ela o livro, ele seria esquecido, pois como a Bia disse, ninguém, há muito tempo abria o baú. Jamais saberiam de seu crime.
Bendito o deixou em casa. Subiu as escadas ouvindo o barulho da chuva. Começou a se perguntar porque escolher um quarto no sétimo andar, o último, se o elevador estava estragado. Estava mais calmo, mais tinha noção das burradas que fez em um só dia. Roubara um livro antigo da Biblioteca e o perdera. Fora flagrado por sua namorada abraçado a um homossexual. E terminara o namoro. Já estava esperando o que Valquiria iria armar para ele. Mas uma coisa não saia de sua cabeça. Os gritos de Valquiria de que iria mata-los. Jamais passara por sua cabeça que Valquiria fosse capaz de algo assim. O que queira agora era tomar um bom banho, dormir e esperar pelo que iria vir a seguir.
A chuva tinha aumentado, e os relâmpagos iluminavam a noite escura. Tirou a jaqueta molhada e dependurou-a na cadeira, pegou sua toalha e estava se dirigindo para o banho, quando acaba a luz. André joga-se no sofá, desanimado e sem vontade de tomar banho gelado. Procura uma vela na gaveta do criado-mudo, guiando-se pelas luzes dos relâmpagos, quando ouve alguém bater a porta. André ascende à vela esse dirige para a porta, tenta olha pelo olho-mágico, mas está escuro. André pergunta que em é. Não reponde. Ele abre uma fresta da porta, e ilumina o rosto do desconhecido com a luz da vela.
- Você? Que surpresa? Não imaginava que viesse a minha casa? O quer a uma hora dessa. Entra, você esta pingando – André dirige-se para o sofá para pegar a toalha, e inclina-se no chão. – eu ia tomar banho, as acabou a luz. Tome, seque-se, vai ficar doente.
Sem que André pudesse se virar, um forte golpe com a cadeira o derruba...



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