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Poesias-->3 corações -- 16/04/2005 - 15:59 (Ari de souza) |
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Debaixo das cobertas,
eu me repolho.
Curvado,
germino como semente sobre o colchão.
O que pareço?
Um cão dormindo ao relento?
Uma boneca asfixiada dentro de uma caixa?
Pequenas frases incompletas,
gemidos e pruridos
se misturam no hemisfério da vizinhança.
É barulho de cortiço,
torneira gotejando,
talheres entediados em espuma,
pentes rastelando cabelos,
cadeiras sussurrando o passado,
enquanto corpos cadavéricos vêm exaurir o último
Chamuscar de sol.
Eu,
confortavelmente fofo e encolhido,
sei que rasante,
um filete de vento tenta me espetar,
pousar sobre minha pele, e assim,
acordar meus solitários pêlos do corpo.
O zunido doméstico invariavelmente perdura.
Pouco acima,
um grito de criança denuncia uma banheira fria.
O vento gélido,
que fecunda-se quarto a dentro
e desce como um inseto pelas paredes,
é um vento outonal.
Tudo me lembra: Moinhos de vento,
a roncar distante de uma cabana.
Parece natal, mas natal não é.
Há restos de luz tosquiadas na parede.
A cena é familiar,
pois é um retrato de infância.
Como se sexta-feira fosse,
e na praça estivéssemos a esperar uma diversão.
Um trenzinho da Alegria,
um algodão doce,
um sorriso de relance da Cuca.
O Fofão com cara de pão,
pão de frutas crisálidas.
Mas ainda estamos no outono,
e o destino das folhas
é pregar-se ao chão,
fingir-se de mortas.
Mas espere,
passos em alguma parte anunciam o caminhar obstinado de um homem.
E quase amorfo, quente,
um grito de socorro balança-me,
pinica meus sentidos
e me faz ouvir o chamado:
TRIN TRIN, TRIN TRIN...
Maldição!
Levanto-me para um duelo verbal,
crente que encontrarei adversários.
Mas eis que era engano.
Bato dente contra dente,
e lanço um feitiço:
- ficarás mudo para sempre, maldito seja!
Agora,
resta-me preparar um café
e manter-me acordado,
até que os últimos minutos de existência
contemplem na sofreguidão,
um vôo que me leve pra longe.
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