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 | Poesias-->O POVO ( Mendes Leal ) -- 27/11/2006 - 21:59 (Marcos Ubirajara de Carvalho e Camargo)  | 
	
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  I
 
 
  Amo o povo, detesto os que o pervertem!
 
 
  Não o adulo sem fé. Verdades rudes 
  lhe hei dicto muita vez, e frente a frente.
  Não lhe acato servil sómente a força.; 
  o ingênuo coração lhe não depravo,
  nem seu braço possante solicito.
 
 
  Rei lhe não chamo, porque povo o quero.
  As púrpuras do escárneo lhe não lanço
  sobre os hombros robustos.;  nem, por sceptro,
  um sinal de irrisão lhe encosto ao braço.
 
 
  Grande o desejo, e para ter grandeza,
  dou-lhe por molde a virtude austera.; 
  e amigo, não escravo, a mão lhe estendo
  a fim de lhe estancar o pranto acerbo
  nas horas da agonia. Quando folga,
  folgo com elle. Quando se lamenta,
  lamento-lhe o penar, peno a seu lado.
  Se acaso fero ameaça e ruge um fúria,
  aponto-lhe o evangelho , a paz lhe indico,
  e Cristo, mestre seu!
 
 
  Estimo o povo,
  não lhe excito paixões, tampouco exploro
  a mina dos seus ódios. Não divido
  em parcellas rivaes, fraterno todo.
  Não sou tribuno preparando arminhos.
  Aos comícios não vou, mentindo à pátria,
  suffragios mendigar por vis recursos!
 
 
  O povo ennobrecer é melhoral-o,
  cultivar-lhe os instinctos generosos,
  apagar-lhe as invejas e os rancores
  que sem remorso as facções lhe inspiram!
  Prezal-o é dar-lhe a luz, mostrar-lhe os riscos.
 
 
  Amo o povo, detesto os que o pervertem!
 
 
  II
 
 
  Este povo onde está?
  Compõem-no acaso
  sómente aqueles que se rojam torpes
  no limo das revoltas? que não surgem
  senão nos dias das funestas lutas, - 
  social espuma, equivoca, sem nome, 
  qual só pode sahir à superfície
  quando a procella desentranha ao pego
  vagas e vagas que trovejam morte?
 
 
  Serão esses o povo? esses que o ferro
  sem dó, sem pejo, ao coração lhe apontam?
  E o lar lhe invadem? E o suor lhe usurpam?
  E, num throno breado, lhe alevantam
  um simulacro vão? Esses que à praça
  os nobres instrumentos do trabalho,
  em fogueira voraz, vão consumir-lhe,
  trpudiando em redor, - ou recostados
  nos braços da indolência, após a orgia,
  sonhando orgias novas?
 
 
  O povo é outro.; 
  sicários não são povo! É procural-o.
  Não heis-de vel-o assoldadado aos Syllas
  em secretas phalanges. Heis-de achal-o
  no porto, na seara, na officina,
  pendido sobre o sulco, pressuroso,
  a Pátria enriquecendo, que, num dia,
  os horríveis combates fraticidas
  estancam novamente!
 
 
  É este o povo. É este o que alguns ímpios
  saúdam por monarcha, e o dilaceram
  co’as varas do lictor.;  este o que exaltam
  quando querem degrau, este o que expremem
  depois de ter subido.;  este o que expulsam
  quando, às portas das salas, atulhadas
  d’um séqüito a fulgir, lhes vem faminto
  pedir pão e trabalho!
 
 
  Eis o povo, protexto muitas vezes,
  e victima outras muitas!
 
 
  Pobre povo!
  Coitado d’elle – o povo – que se illude,
  que illudem tantos, de quem tantos zombam,
  jurando, qual de Deus, em vão seu nome!
 
 
  Ai! povo, quem me dera abrir-te os olhos,
  e, bem deante d’elles, pôr-te em alvo
  de alguns teus serviçaes as almas nuas!...
 
 
  Eu amo-te por ti.;  amo-te e creio
  nos destinos do mundo e do evangelho.
  Por isso nem te adulo e nem te exploro.
  Adulam-te os que os braços te requestam.; 
  exploram-te os que vivem da cegueira.
 
 
  Tenho fé! – povo, povo,
  tem fé também. Acorda, acorda um dia, - 
  não co’as armas na mão, turbado e em fúria,
  mas desperta a vontade e a intelligencia, - 
  Povo, acorda.;  no desengano estuda.; 
  e se depois conservas
  motivos de queixar-te,
  de ti mesmo te queixa.;  és digno d’isso!
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