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Poesias-->POEMAS DE SOBRAS - I -- 09/02/2007 - 22:13 (Francisco Miguel de Moura) |
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P O E M A S D E S O B R A S
SONETILHO
(Ao poeta Lourenço Campos)
Do poeta, o esquecimento
me dá grande compaixão.
Revelo, neste momento,
que o tenho no coração.
Na época, seu talento
era a grande combustão.
Dele - me soava o acento
de ser mestre, não irmão.
Sua ironia mirrada,
por causa da vida airada,
se finou, foi ilusão.
Minha inveja não sabia,
do aluno, a covardia.
Mas hoje é só gratidão.
HAI-KAIS
1. A moça ri. Elevador.
E da angústia do passeio
nasce um bom dia. Humor.
2. O homem pousa a mão
no braço acensorista:
Ela não reage: despista.
3. Passa poesia. Flutua
o risco fino do vestido
num corpinho da rua.
NOME DE RUA
Um nome de rua
é uma futrica
onde o vereador
se “paulifica”.
No plenário e na ata
a verve estica.
A família do morto
dá parabém.
O edil se “arapuca”
para a eleição
do ano que vem.
(E fica.)
A rua é de lama,
lixo e excremento.
Cai a placa em terra
sem nenhum lamento.
Quem por lá “pateia”,
salta e sofre e sua.
E enquanto recua,
a língua não peia:
- O nome desta rua...
me dê uma dica?
A voz de fim de lua
pergunta e relata:
- O nome desta rua?
Há uma “peitica”. E mata.
O morto mais morto,
o vivo na vala...
Nada mais comum.
A rua se cala,
resposta é pergunta,
tudo e nada - uma
coisa suja, só:
- P-o-l-í-t-i-c-a.
RONDÓ PARA AIRTON SENA
Airton Sena corria
e a gente nem percebia
que era o ais do volante,
o dono da forma £nica.
A gente nem percebia.
Correr ‚ coisa comum
mesmo … gente caminhante.
Mas um dia - aquele dia
da sua morte - que pena!
ficou tão perto da gente,
pois corria velozmente,
com tanta diplomacia
que voar nos parecia,
na pista, entre tantos mais.
E quanto mais Sena corria,
mais emoção desandava,
mais todos queriam mais.
Se a vida quer movimento,
ele, mais que nós, vivia.
E viveu para correr,
e viveu para morrer,
ficar imortalizado
e ficar ao nosso lado,
quando saía de cena.
E a gente nem percebia.
NATURASTRO
a lassidão entre nus
faz solidão entre mus
e tensão pelos espinhos
crus
e uma tristeza louca
sem vaidade na boca:
escuro fumo, desnorte
com disfarce, a natureza
desce, comunga sem teste
o ser a(social)-núbil
debandado, desbúndio.
o simples simplificado
num animal a pés
a pão e água.
ANTES E DEPOIS
quem saber se um dia fomos?
e por que e para que
escutar o passo passado?
adiante
sem liame de rostos ou falas
as luzes apagadas
quem e o que diz que vamos?
para o vazio, para a morte
de onde voltaríamos - visões?
vamos para onde não vamos
para além da vida onde
não há sábios
só há sombras.
A PRISÃO
a carne transforma
o espírito vadio
que lhe orna:
- a virtude é cara
e passa por um fio.
RESPOSTAMOR
onde o contrário de mim?
onde o além de uma luz?
onde o contrário do rio?
no escuro o amor é frio?
nem tudo anda por tudo
os criados estão perdidos
e os patrões arrependidos
a alma se lava, o corpo se espoja
onde a confusão delírio
para fugir dessa lide
amor ‚ tudo que levo
leve no torto da linha
pesado peso perdido
sobre o meu ombro fundido.
SEU LIMITE
seu limite de sonho
não saber o limite
entre pele e memória
seu limite de som
tão irreal: limita
o corte do horizonte
entre cinza e nuvem
e o canto do galo
entre você e a mãe
(ãi: útero vazio)
e o ninho do mundo
explode um frio rio
e os beijos não furam
nem duram
a lágrima não m(olha)
suga
meu finca-p‚ inteiro
na noite profunda
do teu corpo
do teu filho
do teu fogo
do pão amassado
do sonho acabado
seu limite de espanto.
ODE AOS HERÓIS
nos dedos contam-se os heróis:
- da coca(cola) ao exército da cia
e deles não se fala nada mais:
que morrem de porrada ou de anemia.
ontem foram reis (e quanta valia!)
gigantes, deuses, guerreiros reais,
depois da briga por tudo - desistiram
depois da morte do tempo - refugaram.
ulisses dormiu pela história
odisseus em casa de pobretões
entre moeda e merda pecuária
precisaram de outros mundos fundos
- e de fundo sonhar, sos/sobraram.
e os operários amanheceram sem rumor
mais ruminar o quê, o quê, senhor?
povo 1, povo 2, povo 3, acabaram
com a guerra na guerra da paz.
pergunta-se: por que os deuses dormem?
e por que os homens não acordam?
para gozar o resto desta aurora?
POETA
sou operário do nada
trabalho com mãos invisíveis
o dia inteiro em desacordo
com os meus fusíveis
não me acalmo se não teço
nuvem/som/sol/solidão
cento de cestos sem cipós
(com o meu tempo e minha teia).
ao amanhecer leio o refeito
com gosto de gosma e defeito
e na rua me jogo em danação
porque não consegui fazer
de um dramalhão
um drama
CANÇÃOZINHA
como rastros na areia
como rugas no rosto
como rostos na rua
h um vento devagar
que unge e passa: foge
antes faz doce carícia
são encanto e carinho
são lições indeléveis
sem um antes, um depois
sem cobrança senão aquela
de esquecer de todo.
PERSEGUIÇÃO
perseguem-me um nome
um rosto, um corpo, uma voz
- de amor, de infelicidade?
tudo gravado em meu peito
infecundo.
que posso contra o céu
que já me exigiu antes
o melhor que havia em mim,
esse céu que se acabou,
maior em mim do que eu?
o nada já não me convence
ou eu todo me confundo
num eco infinito que se finda
entre a perda e o mundo.
LA NAVE
É que durmo de cama
e acordo na grama
É que a lembrança aviva-
me o sonho mais feliz
e a relva me balança
se me sinto algo juiz
com meu sonho motriz
de não repetir hoje
o que ontem não quis
e la nave va, va, va!
SILENTE
J’ ouvi muitas sinfonias
- polifônicas, polimorfas,
policrômicas:
- todas mofas,
compreendo.
e a única que me entende
na cidade ou nos campos
gerais da noite, do dia
vem do meu silêncio.
posso aplaudir todas as vozes
convexas
côncavas
cônicas
e cômicas
a um só tempo – com as coxas.
VIAJEIRO SOLITÁRIO
um pedaço de astro
dentro de outra astronave
e uns fiapos de vento,
poeira, chuva
e lua
no infinito espaço
que nos separa
um cheiro de cabelo e saia
uma gota de luz
cegou-me o arco-íres
ai, meus olhos que não mais
al/canço
ave, nave louca divina e nua
di/lua
BRINQUEDO
o arco-íres quebrou-se
na força do teu olhar:
- entramos por uma ponta
saímos na outra ponta
do outro lado do mar
juntamos os seus pedaços
onde fomos na(morar)
fechamos as duas portas
para o amor não se acabar.
QUADRINHAS TROPAS
a certeza
apressa o sono
debita a rede
desarma o s-o-N-nho
e acorda o pesadelo
a dúvida
planta o desejo
colhe o presente
come o futuro
s e m sede.
ETERNITY
olhos negros de minha alma
olhos azuis no teu céu
quantos minutos de calma!
e a eternidade morreu.
FINAL INFELIZ
verdade? por que vaidade
se você me consumiu?
estive em plena bondade
quando você me sorriu
arrependida e de graça
nem disse adeus e fugiu
não tenho a menor ternura
depois do fogo e do frio
d’outro encanto sou capaz:
sozinho, e viver em paz.
GRÃO ESPÍRITO
não tenho medo do grande
mas do grão infinito
tenho que virar espírito
maior
senão os bichinhos vivos
me comem
neste planeta
esquisito.
Ó...
SAUDADE
Saudade, engenhoca da arte
onde o viver se complica:
- não sei de quem fica a parte
ou de quem parte o que fica
PEN’SEU
em procissão se perdem
meus desejos
insones
caem no abismo
de meu quarto de brinquedos
ouço a música de menino:
um velho realejo
acompanha a canção de mamãe.
me perdi neste mundo tão cedo.
TERCETOS
não me deixe, meu drama,
se o vento me alcança
e me leva os cabelos
não solte, minha trama
que eu não sei a dança
de tantos desmantelos
não me deixe, minha dama
quero-lhe por vingança
nos meus atropelos.
SURREALÊS
se da saudade eu pintasse
um quadro surrealês...
colhia o sorriso doce
vindo na tarde e de vez...
mas a verdade matou-me
e mataria outra vez
não! que eu seria também
assassino sem piedade
e sem leis.
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