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Poesias-->De versos, diversos versos -- 19/03/2007 - 16:07 (JOÃO FELINTO NETO)
Prefácio Alongar-me-ia na amplidão de termos para elogiar o trabalho do estranho poeta João Felinto Neto, porém, pela nossa amizade, sou suspeito. A estranheza está em versos que insinuam situações abrangentes, raramente pensadas e traduzidas à poesia. De versos, diversos versos é um título expressivo que quantifica a obra em retalhos de poemas. A poesia engrandece com versos arraigados em estruturas filosóficas, impelidos ao esdrúxulo cotidiano num arrebatamento temático. O sentido prático e real se desabrocha em uma flor com pétalas de versos coerentes com a situação crítica e imaginativa. Mais que uma flor, esses diversos versos são folhas que se desprendem de uma árvore em um clima outonal. Eu vejo o poeta traduzir verdades através dos seus diversos versos, consolidando razão em poemas que expõem sentimentos múltiplos e de aspectos tão diversos quanto os mesmos. Não é possível deixar de perceber nuances de influências diversas no âmbito de leituras poéticas, sem haver necessidade de citá-las. André Tales De versos Diversos versos Um montão de versos soltos, Quantas letras pra colher Num trabalho que aos poucos Diversos poemas vou ter. De versos, são feitos os meus sonhos, São diversos, sem limites. Abro os meus olhos tristonhos Entre versos infelizes. Juntei minhas dores, meus risos. Dispersos ficaram os amores. Dentre os versos mais felizes, Abrem-se cores em matizes Como num jardim, as flores. CARRO-DE-MÃO Eu nasci só. Não tão só.; Pai, mãe, irmãos. Minhas mãos Pedem ajuda Em duas luvas Sem dedos. Sem medo, Chamo-me João. Eu posso ser você Ou não, Empunhando um carro-de-mão Numa velha construção Vazia. NÓS DOIS Solidão à tarde, O sol se foi. Você também. Quem sabe Nós dois Numa lembrança de ontem? Que ano é hoje? Hoje é o primeiro de todos. Todos serão amanhã Em lembranças de ontem, De nós dois. NEÓFITO Seria a primeira vez Que meu olhar se fecharia. Na boca, Um beijo francês Que em outra Não conseguiria. Por meu remorso, Talvez, Repensei no que faria. Amar a outra não posso. Continuaria neófito Pelo que não conhecia. A NOIVA Ouço à minha porta, Um bater de palmas. Em poucas passadas, Alcanço as rótulas. São apenas asas De uma ave branca Tal qual uma dama Em passos de valsa. Abro a porta a tempo, O vento aproveita, Tiro da sarjeta Aquela que amo. Eis que seu véu branco, A pouco enganara. O vento em pranto, À porta, escancara. É a chuva que adentra Enquanto ela lembra A quem ama tanto. E no meu espanto, Sua voz me acerta Com a palavra certa. Espinho no peito. O buquê desfeito, Flores perdem pétalas. Cabelos sem jeito, Quase que a perco. Um jantar a velas.; As chamas e o vinho Acendem o ninho De um casal que voa. Roupas ficam à toa. Não sou eu, o noivo. Mas, é minha, a noiva. OPERAÇÕES Ainda procuro Migalhas de pão no caminho. Não volto sozinho, Há sempre alguém no escuro. Na soma de tudo, Sou múltiplo. Que subtraído É resto. Que se dividido, Se perde na multidão. Apertos de mãos, Estranhos que são vizinhos. Que andam sozinhos Seguindo a mesma direção. Migalhas de pão, Não há mais no caminho. Em goles de vinho, Entre flores e espinhos, Espeto o meu coração. A espera de carona Estavam lá, Cada um com um filho nos braços, À espera de um carro Que os levassem a algum lugar. Aonde iriam parar Pelas mãos do acaso? Nessa hora eu passo E começo a pensar. Poderia chorar. Mas, o mundo é amargo. Para mim, mais um trago, Eu consigo aceitar. Essa é a dor em meu peito, Concordar: - Não tem jeito. E simplesmente passar, Pelo retrovisor olhar E tentar esquecer. O que o mundo vai ser, Se fingirmos não ver E simplesmente passarmos? Religião, filosofia e/ou ciência Teorizo sobre minha existência, Por não ser plena Nossa forma de pensar. Religião, filosofia e/ou ciência, Razão, demência, Moral, decência, Crença e pecar. Não encontro uma razão Para ser louco. Quantificar nossos valores Sempre é pouco. Engrenagens e motores, Eis nossa locomoção. O que sou além de matéria ambulante, Um animal em si, pensante, Dominante Em um reino de ilusão? Nosso céu não é eterno. Nosso inferno É precisão. Não importa se meu berço Foi o barro. Se eu sou escarro De um macaco Ou de Adão. Em um museu Sou pré-história. Não há memória De que eu Seja João. Apedrejamento Ouvi um padre Jogar pedras na ciência. Quanta inocência Ou distúrbio de um fraco. O seu pecado Não passa de sua crença. Viraram demência, Deus e o Diabo. Sua oração é apenas subserviência À simples crença De um fanático. Correr em círculo À procura do início Do que nunca foi criado. Sua batina Cobre mais que sua vergonha, Cobre o instinto mais carnal.; Não cobre o mal Que na carne o acompanha, Cobre apenas o sinal Da cruz que ama, Cobre a razão que o faz normal. Nos braços da ilusão De que me adianta o céu, Se eu não posso sentir o vento, Nem a água me tocar. Se minhas asas de anjo Não sentem o vôo. Não quero esse merecimento, Quero mais tempo Aqui. A emoção ao sorrir E as lágrimas da comoção. O que eu posso sentir Com minha mulher, Nenhuma fé Pode entender. Não quero ter Uma salvação. Quero morrer Nos braços dessa ilusão Que é viver. Não creio no amor O amor talvez não seja Sincero e verdadeiro. Talvez não seja ela Ou eu seja o primeiro. Acostumados a ver Com o mesmo olhar, A vida conjugal, Assim o amor parece Ser eterno pro casal. O amor amadurece E a paixão esfria Ou já não é o mesmo Que sentimos um dia. Será que a paixão tem fazes como a lua? Ela é nova e crescente, Minguante e finalmente, Cheia como a rua. O amor não continua, Não dura para sempre. Quando o amor acusa, O beijo fica ausente. Do amor, é que é a culpa De estarmos diferentes. As discussões freqüentes, Acusações sem fim. Quem sabe sendo assim, O amor é uma quimera, O amor que tenho em mim, O amor que sente ela? Eu creio no amor O amor é a certeza Que se quer.; O abraço comovido.; As lembranças.; Eterno quanto às esperanças De ser eterno. O amor é certo Quando ambos estão errados.; É lado a lado Numa busca incessante.; É todo instante De um casal enamorado. O amor é palco De comédia, De tragédia, De espanto. O amor é tanto Que transborda em amizade.; É a saudade Que nos faz saber que enfim, O amor não é quimera, O amor que sente ela, O amor que tenho em mim. Quem sou eu? Sou um jovem ateu Que entra na igreja Para tomar cerveja E beber café. Desconheço a fé, Mesmo na ressaca. Rio quando a graça É de um milagre De ser eu um padre Que toma conhaque Num cálice de vinho E vive sozinho Pensando que sonha Em ser um demônio Que se sente Deus, Ser o próprio Deus Se sentindo humano, Ser um santo insano A brincar de ateu. O pedido II Se você não percebeu Quanto a quero para mim, Imagine ser a lua Que ilumina meu jardim. Não suporto sua ausência, Um minuto mais sequer. Não me deixe triste assim, Seja então minha mulher. Se você disser que sim, Nós seremos sol e mar, Onda e areia a se encontrar Nesse vai-e-vem sem fim. Elas Estava eu com minha neta, A passear. Numa calçada feita em pedra, Uma jovem nos apressa A andar, E quase que nos atropela. Tiro a criança do lugar Em que se encontra, Ponho em meus braços. Palavra, sem ter embaraço, Eu falo para ser ouvida: - Você tem muito tempo pela frente, Minha querida E eu já vivi tempo demais. Deixemos esta jovem na esperança De que nunca teve infância Nem envelhecerá jamais. A jovem olha descontente E entre dentes recrimina. Depois sorri para a menina E tenta então se desculpar. Assim, eu vejo em seu olhar, Alguém que da praia saiu Em busca de um lugar vazio, Uma ilha em pleno alto-mar. Que de onde agora ela está, À praia já não mais avista. Até aonde alcança a vista, Só vê a imensidão do mar. A sua pressa não é para encontrar a ilha, É o medo de ser iludida E ali mesmo afundar. Como resposta, digo: -Vá. Mantenha a calma, não há pressa. Na vida, o que interessa É simplesmente navegar. Na certa, não fui entendida. Porém, ela segue mais passiva. Talvez esteja arrependida E agora ande devagar. Diante do espelho Através de meus olhos no espelho, Dentro de mim, eu vejo Um jovem enfurecido. Porém, adormecido No velho que se espelha Com sua cara feia, Com o seu peso a mais E ainda assim em paz Consigo mesmo. Guardo em mim, segredos, Saudade e nostalgia De um jovem que um dia, Viu em seus olhos, medo, Por descobrir-se preso, Enquanto envelhecia. Em sua agonia, Pediu a mim conselhos. Eu sou seu desespero. Ele é minha alegria. O batizado Que enorme ventania No dia do batizado. Alguém havia lembrado, O que o moleque seria. Sou poeta hoje em dia. Sou um louco desvairado. O mesmo vento apressado, Agora, traz poesia. O que ele, então, queria No dia do batizado? Somente Deus e o Diabo, Conhecê-lo poderia. O que o padre não sabia É que Deus naquele dia Fizera as pazes com o Diabo. Porém, o meu batizado Fizera-os voltar à briga. Ato inesperado O pára-brisa trincado, Um beija-flor se aproxima E deixa o local molhado No toque da sua língua. A fome focalizou A forma que a vida ensina. O que pensou ser uma flor Era apenas uma trinca. Eu, sentado no volante, Pude ver sua vontade. Mas, durou apenas um instante, A nossa ansiedade. O beija-flor bate asas E voa sem direção. Eu me despeço de casa Com pesar no coração. O que temos em semelhança, Um objetivo na vida. Ambos em busca de esperança. Eu, o amor, ele, a comida. Lunático A maior das mentiras, A que mata O amor inocente. A pior das doenças, A que abala E nos torna dementes. Sou inverso Por ser o contrário. Eu seria retalho de mim, Fosse assim, Em todo, um fanático. Talvez seja melhor ser lunático, Jamais crer que no fim Eu serei condenado Por um deus venerado Por mim. Internacionais Seriam elas belas De olhos puxados. Olhos azuis e pele branca. Cabelos ondulados. Negras sensuais De lábios carnudos. Seriam elas, frutos Tropicais. Seriam elas, damas Trabalhadoras braçais. Seriam brasileiras e internacionais. Seriam elas tudo: Mãe, mulher e filha. O eixo central Que sustenta a família. Elas têm muito mais Que um só dia, Pois são eternizadas Como Maria. Enfrentam a discórdia, A discriminação. São elas as mais fortes Em qualquer nação. Do pólo sul ao norte, Elas enfrentam a sorte. Por decisão e garra, Sem elas, com certeza, O nosso mundo acaba. A mulher Fora arrastada na pré-história Pelo primata que a desejava. Eis que agora, ela faz história E pelo homem é cortejada. Do fogo ardente de um fogão À superação de tantas marcas, Ela é símbolo de emoção, De dedicação e de muita garra. É genial em qualquer profissão E está sempre com a razão, Quando em conselho nos fala. Ela é soberba quando em ação. É do poeta, a inspiração. É do leitor, a eterna amada. Desesperança Quem é essa Que me tira o sono, Que arrebata o dono De uma humilde casa? Quem é essa Louca, desvairada, Que ao seio me prende Sem saber se sente A dor que a outro causa? Lábios que procuram vida Carne apodrecida No envelhecimento. Quem é essa Que corrói por dentro Como um veneno Sem nenhum antídoto? Eu sou outro, Sou um homem dito, Dito morto Pela agonia. Quem é essa Musa e tirania, Mistura que havia Desde minha infância? Quem é essa Triste companhia? Talvez seja a morte, A desesperança. Cicatrizes Feri meus lábios Por morder palavras. Feri a palma de minha mão Por aplaudir a violação De tuas cartas. Feri com lágrimas Teus olhos castanhos. Tornei-me estranho À comiseração. Feri teu colo Ao negar meu filho. Feri teu riso Ao não pedir perdão. Choraste em vão Ante as cicatrizes. Fomos infelizes Em nossa paixão. Eunuco Eu nasci Para ser promíscuo, Pra viver de risco E doenças raras. Eu nasci Para ser de todas E de mais ninguém. Eu nasci Para muitas bocas, Para a sua, também. Eu nasci Para morrer de dor. Se sentiam amor, Eu só desejava. Eu nasci Para ser de tudo, Até mesmo eunuco Dentro desta casa. Caravões Mesmo que os caravões Extirpem os meus olhos Tal qual os personagens de Garcia, Eu poderei não ver a luz do dia, Mas jamais deixarei de ver tua silhueta Como a mais bela estatueta grega Lapidada à mão pelo escultor Que fica inebriado pela cor De tua pele completamente negra. Mesmo que me arranquem a cabeça, Eu continuarei sentindo o mesmo amor. Mesmo depois que a razão se for, Insistirá meu coração, tenho certeza. E quando enfim, despedaçado, Em cada parte minha será lembrado Esse amor que será preservado Em cada caravão que me estripou. E quando cada um, dali, se for, Ainda restará um velho cabisbaixo Que acabara de pintar um triste quadro De um homem condenado Por amor. Sem pretensões, nem risos Eu caminhei Sem pretensões, nem risos, Sem motivo, sem palavras. E ainda pouco, caminhava Sem dar ouvidos A quem me falava. Eu continuei, E fui surpreendido Ao dar sentido A essa caminhada. Eu descobri Que havia motivo, Pretensões e risos, E também palavras. Eis que agora, Eu sofro comigo, Sem pretensões, nem risos E sem palavras. Paradeiro II Entre os ditames De uma vida ausente, O paradeiro De quem se procura. Eis a loucura De um paciente Que não é inteiro. Seu arcabouço é de um guerreiro, Seu coração é feito armadura. A sua mente É fina e transparente Ante a espessa lente de sua loucura. Não há ternura, Coração valente. Não há vivente Que traga brandura A essa alma dura, Inconseqüente, De um ser diferente Que não tem mais cura. Ridículo Eu sei que estou ficando velho, Um velho esdrúxulo Por me achar ainda enxuto E cortejar à jovens belas Que procuro conquistar Em tentativas sem sucesso. Não despertei, que um regresso Nunca haverá. Tento encontrar O coração de um homem sério Que escolheu o par eterno Para amar. Porém, me perco Entre atrativos que são belos. O eu promíscuo Vence o sério. O que na vida ainda espero? Senão, a morte me levar. À juventude, eu respiro. Velho ridículo, Tenta a si mesmo, Enganar. Poeira Talvez assim, A solidão me queira. De outra maneira, Não estaria só. Apenas pó Na imensidão, poeira. A vida inteira, Sendo laço e nó. A solidão vem até mim, rasteira. Nesse deserto, Só poeira em pó. Eu ando só Em dunas de areia. De companheira, Eu tenho a pior. A ventania Forte e ligeira, Que é passageira E me causa dó. Outra vez só, Deixado na poeira. Triste maneira De voltar ao pó. Cena real Derramando lágrimas Ante a cena, Ninguém percebe seu choro. Cadeiras enfileiradas. O beijo na tela Comoveu a ela E também um outro. As luzes são acesas E o cinema fica vazio. Suas almas presas Por um único fio, O amor. Ao fitarem-se, Percebem o horror Que haviam cometido. Um coração partido Que não perdoou. Um outro, arrependido Por haver traído O seu único amor. O batizado II Eis que no meu batizado, Um vento forte soprava, No açude ele formava Pequenas ondas alheias Ao nome então citado. Eis que no meu batizado, O vento então serpenteia Movimentando a areia, Quase arranca a igreja Do cenário. Por acaso, Não seria o destino Cometendo o desatino De prevê que o menino Não seguiria a fé Ou quem sabe Que um dia, poeta, Não saberia, na certa, Nem mesmo Quem ele é? Acéfalo Procuro minha cabeça, Não a encontro. Onde estão Meus olhos em pranto? Minha boca Em um sorriso? Onde andam meus ouvidos? Já não os escuto. Meus cabelos, Passo os dedos, Não os sinto. Os meus brincos, Onde estão presos? Sinto o peito ofegar, Mas não posso respirar, Pois não tenho mais nariz. Como posso ser feliz Sem o meu cérebro? Como poderei pensar? Entre tantos, um acéfalo. Como alguém pode amar, Discernir o que é certo, Se perdeu sua cabeça Por deixa-la de usar? Amor de minha vida Amor de minha vida! Talvez eu seja um triste cavaleiro Que trava uma briga Consigo mesmo Num duelo de vida ou morte. Amor de minha vida! Se eu fosse o mais forte, E nesse trágico pesadelo Encontrasse uma saída, Eu venceria o meu medo E mudaria minha sorte. Amor de minha vida! Se eu transforma-se o pesadelo, Não perderia o sonho E nem a chance de vivê-lo. Na realidade, eu me disporia Aos momentos de alegria Nos braços que me dão guarida. Amor de minha vida! Em cartas que jamais foram escritas, Eu poria flores. Sobre a cama fria, Eu a veria Em um dos travesseiros. Amor de minha vida! Fui o primeiro Numa competição que nunca venceria. Estou em solidão, Ainda que em sua companhia. Amor de minha vida! Procuro achar-me sob seus lençóis, Aonde apenas um de nós Conserva a dor da ida. Meus beijos Não a deixam arrependida. Meus erros Não sufocam sua voz. Amor de minha vida! Eu beijo outras bocas que desejo. Eu fujo do meu próprio erro. Eu choro Por vê-la então traída. Amor de minha vida! Eu sofro no meu âmago, Os horrores De uma essência aflita. E em meus temores, Eu peço que haja um anjo ou demônio Que cuide do amor de minha vida. Amor de minha vida! Talvez, eu seja uma boca que grita Seu nome, apenas numa sílaba Que antes de pronunciada, Some. Pequeno mundo Eu quero convalescer em dor, Sentindo você, amor, Ofegante, nos meus braços. Tento, Apesar de meu cansaço, Repetir os mesmos passos Demarcados nos lençóis. Sinto entre nós, Comprimir-se em silêncio, Nosso peso. E entre meus dedos, Seus cabelos no escuro. E num sussurro, Sua voz. Estamos sós, Dentro de um pequeno mundo. Soma e resumo, Vitima e algoz. Sou porta-voz Do momento que vivemos. Mal percebemos A neblina e os faróis Pela janela, Tal a chama de uma vela, Apagar-se Sobre nós. Alianças Talvez as mãos, Através de suas linhas, Levem às finas Emoções do coração. As alianças Que os prendem pelos dedos, Pedem respeito. Que seja mútuo como o amor Em cada peito. Único jeito De eternizar a paixão. Desabrochada Entre mãos que são tocadas Com carinho e com pudor. Para manter-se o calor, A chama acesa, Exige-se uma proeza, O imprescindível diálogo. A conversa É o impulso, a correnteza Que mantém as mãos coesas Na impetuosa cachoeira E no ameno riacho. Para jamais sucumbir ao fracasso, O casal guie seus passos Pela mãe sabedoria. Única guia Que supera os percalços Dessa imprevisível vida. Anéis dourados Nosso amor foi retratado Pelos dois anéis dourados Flagrados em nossas mãos. Eu pus no teu, o noivado. Você, no meu, a paixão. Nosso amor foi reforçado Quando os dois anéis dourados Foram trocados de mão. Somos agora, casados. E os dois anéis dourados Simbolizam a união. Alianças II Está em nossas mãos, Eternizado, O nosso amor selado Em alianças. Serão nossas lembranças Do passado. Serão nosso legado Às crianças. Noivado O amor segue seu rumo E nos torna namorados. Enquanto gira, o mundo, Ele nos leva ao noivado. Agora, requer cuidado, Pode ser uma paixão. Porém, pra ser censurado, É preciso ter provado Da mais dúbia emoção. Ao redor do dedo O amor desperta No cheiro, no beijo, E mantém aceso Cada coração. Posto em duas mãos Ao redor do dedo, Eterno desejo De uma união. Pra não ser em vão, Ame do seu jeito.; Reacenda o peito Com toda a paixão. Em nome do coração O amor talvez precipite A decisão da razão. Mas é o amor quem decide Em nome do coração. Há entre o sim e o não, A indecisão do talvez. E está em suas mãos, Esse amor que a vida fez. Quinta geração Quem é o pai de João Vítor? O pai de João Vítor é João. O pai de João é Francisco. O de Francisco é João. O de João é Francisco. O de Francisco quem é? Talvez, seja também João Ou seja talvez, José. É melhor parar com isso, Já é a quinta geração. Onde acaba a maldição De um tetravô de João Vítor. O manto Tenho minha visão Repleta de enganos. Os meus desenganos São apenas aleivosia. Em minha agonia, Vem o pranto. Sobre meus ombros, O manto Que a tempos me cobria. Na frieza sombria, Mantém-me o manto. Nas dobras, meus tecidos A si, cerzia. Minha visão se abria Em espanto. Ao me despir do manto, Descubro que existia. A resposta Caminhei em desalinho Com minha roupa engomada. Se caminhava sozinho, Mais gente me acompanhava. Fiquei à margem da estrada Numa espera sem fim, Enquanto alguém vem a mim Com uma postura educada. - Moço, por que a parada? A resposta que eu dei Foi um tanto enigmática: - Paro para ver o que andei.; Não pelo tanto que falta. Constrangimento O meu descontentamento, Apesar da posição Que ocupo no momento, O topo da evolução, É com esse fingimento De não ver com a razão. Acreditar no pretenso Mito de uma criação Que põe um mundo imenso Na palma de uma mão. E o meu constrangimento, Justo pela posição Que ocupo no momento, O topo da evolução, É por tamanha invenção, Aquilo que mais lamento, Usar a imaginação Para ocultar julgamento Em cima dessa versão Que abusa do bom senso. Uma salvação como prêmio. Por castigo, expiação. Pergunta indevida No meu intento De descobrir-me quem sou, Eu quis supor Que era quem conhecia. Triste euforia, Que lamentável clamor. Não sou quem sou, Sou uma pergunta indevida. Sei que sou vida, Por respirar, ter calor. Mas quem eu sou? Não há resposta precisa. A tarde fala A tarde versa Sobre o sol fugidio. Meu desafio É tentar escuta-la. A tarde fala, Eu observo em silêncio. Ela diz: - Tempo, Levaste o sol, estrela cara. O vento quente me deixa. O vento frio me apaga. Diante de minha queixa, A noite ingrata me cala. Lógica II Seria impossível, sem a lógica, A cética proposta Da razão. Seria impossível ao coração Seguir a lógica. Contudo, o sentimento nos sufoca, Enquanto a lógica Nos liberta da prisão. Seria em vão, Buscarmos prova Pra essa forma estóica De visão. Teologia No catre, Com o livro escancarado, Examino o meu pecado Sob a ótica do céu. Qual meu papel No destino reservado, Um silêncio recatado, Um agitado escarcéu? Na sela fria, Em minha ortodoxia, Não encontro compaixão. Falta razão Nesse livro que me guia. A teologia Só me leva à depressão. Entre Deus e o Diabo, Eu me sinto oprimido. E sobre o livro sagrado, O meu corpo é encontrado, Estendido. Palavra de honra Perdeu-se como peça do passado. Não há homem honrado Sem palavra. Agora é registrada e carimbada, Pela lei é tarifada, Pois tem preço no mercado. É aceita num recibo assinado, Quase sempre violado, Embargada. A essa caminhada, O jovem acompanha, Sem entender O que é palavra de honra. Carta de alforria Ser livre Não é libertar-se, escrava, É abolir a escravidão. A sua carta de alforria É a consciência que lhe guia, Que a leva, à melhor direção. Ser livre Não é um passe de mágica, É uma luta desarmada Contra a própria condição.; A de ser uma escrava De uma crença, De uma farda Ou de uma opinião. Ser livre É ver com a luz da razão, Que na verdade, Ser escrava, Não passa de ilusão. A lenda O nascimento, numa noite de estrelas. Uma centelha Que da fogueira se esgueira Em direção ao céu. Um carrossel no infinito. Dois lindos lírios, Favos de mel. Éramos meninos. Gêmeos univitelinos. E brincamos, muitas vezes, na areia. Onde eu era o escravo soterrado E o meu irmão o carrasco Que soprava a tempestade em lua cheia. Nossos pais eram membros de uma seita E doavam a colheita À adorada divindade. Todavia, um dia, Foram vítimas da idade E partiram para outra feita. Eis que éramos dois jovens destemidos E seguíamos a mesma divindade. Ao pecado nós temíamos Mais que a morte. Porém, chega nossa sorte. Sopra um vento frio e forte Que nos mantêm separados. E cada um de nós Atravessou a senda Em corcovas de camelos Esgotados.; Por esse imenso deserto Que sustenta Dois beduínos Que um dia terão venda Nas areias que falaram, no passado. Eis que então fui comprado Por um velho haríolo do deserto. Meu irmão, para longe foi levado Por um homem muito perverso. Deixei-me, assim, guiar pelo cajado. Enquanto o profeta me previa De uma tempestade de areia Que viria E me traria o irmão que foi levado. Onde estão sepultados nossos pais, Algumas noites atrás, Armei minha tenda. Que o profeta não se ofenda, Já não espero mais, Essa tempestade é lenda. Eu não acreditei no velho fraco. No entanto, um dia uma caravana corta O deserto desolado Na região montanhosa. Uma tempestade tenebrosa Assola homens e cavalos. Vem em minha direção Como em passos demarcados, Um sobrevivente são, Apenas muito cansado. Eis minha cópia, meu irmão. Num abraço nosso vínculo foi selado. O profeta, num sorriso desbotado, Iludia-se com a sua tola fé. O lugar, um oásis avistado. Meu irmão fora avisado Pelo velho de cajado Que estava ali de pé. Felizes para sempre Não se zangue, cavalheiro. Se queria ser o primeiro A chegar em minha vida, Tivesse pedido guarida Há alguns anos atrás. Não acha que é demais Guardar-me por tantos anos. Chorei rios de desenganos, Quase que não tive paz. Um dia, veio um rapaz De muito longe daqui E com ele fui dormir, Acreditando, talvez, Que a frase: Era uma vez, Fora escrita para mim. A história chega ao fim, E o felizes para sempre Se desfez. Entre poeta e leitor Eu não estou lhe vendo.; Tentar seria em vão. Assim, vou escrevendo, Pensando em sua ação. Não sei sua emoção E não o compreendo. Os meus versos vão sendo A nossa ligação. Quando eu me perguntar, Responda a você. Ninguém vai escutar E nem jamais saber. Quem sou de fato eu Além de um nome definido? Qual será o motivo Que me leva a pensar? Será que há lugar Em que exista morto-vivo? Por que tenho que ter Consciência de que existo? Alguém pode escolher Para eu mesmo ter nascido? Por que nasci marcado pra morrer? Por que tenho que ver Meu corpo envelhecido? Se não tenho respostas Para tanto indagar, Por que tenho o poder de questionar? O enterro Um dia, eu acordei Em uma casa estranha, Na qual era visita e anfitrião. Queimava tênue chama Na mão, em uma vela. Em tinta amarela, Lia-se o nome João. Alguém fechou a porta Que era uma tampa aberta. Senti-me um prisioneiro Dentro de uma cela, Em eterna solidão. Percebo o movimento Qual uma caravela. Depois de algum tempo É posta, enfim, no chão. Uma descida estreita, Enorme escuridão. Alguém jogava areia Na telha de madeira. No absoluto silêncio, À luz da razão, Minha alma, enfim, clareia. A casa estranha e estreita, Não passava de um caixão. Mão e caneta São os meus versos, Toscos, reprimidos. Versos não lidos, Sem compreensão. Em minha mão, Pulsam os versos tidos Como descritos Por um homem são. Assim, desliza uma caneta Em tinta acesa, Na escuridão. Pintam meus versos Em tinta preta, Mão e caneta, Que à luz acesa, Desenham em sombra, Minha razão. Caricatura Talvez, eu seja Esse desenho mal traçado, Esse rosto contornado, Esse esboço de figura. Caricatura Que acentua meus defeitos, Que não mostra o meu peito Sobre a linha da cintura.; Só o meu rosto Em contorno de grafite, Onde o cômico decide Revelar o meu caráter. Caricatura Que me deixa ver em parte. De um ângulo, um detalhe, Minha feiúra. Agouro Selem meus excessos Dentre bocas virtuosas.; Ouçam meus apelos Entre lápides e covas.; Enquanto os meus versos Declamados pelo agouro De um louco, Se desdobram No soluço dos que choram Em silêncio. Sintam o vento Que à árvore desfolha, Cobrindo a cova Onde jaz o pensamento, Com flores mortas. Uma mente torta Que outrora, Entre paz e fingimento, Tornou-se estóica. Maria Rosa Ela é fútil e inútil. Só fala em gritos. Alheia aos filhos. É indecente em sua risada. Com seus vestidos É escandalosa, É depravada. Gosta de prosa, De ser cantada. Adora uma boca embriagada, Gritar: - Gostosa! Seu nome é Rosa, Maria Rosa, Sempre ao dispor. É invejosa. Odeia flor. Negra de ancas largas, É detestada pela família. Gosta mesmo, de uma cachaça E uma boa briga. Seu cabelo é grosso, E despenteada Não fica aflita. É insensível à dor alheia. Tira a noite inteira Num sono passivo. Põe o seu branquelo Para fora de casa, Quando este está de folga. O que a incomoda É a sua cara De bunda, amarelo. Já provou os lábios de sua vizinha Que estava sozinha, Trocaram carícias. E nessas delícias, Consumiram droga. É a Maria Rosa, Ridícula e rancorosa. Carrega a sua cruz Que não é milagrosa, O bêbado Jesus, O negro que ela gosta. Silêncio e morte O meu choro abafado no silêncio, Um sofrimento Qual o mais profundo corte. Talvez, a morte Não resuma nosso tempo. Assim, lamento Em silêncio, Sua morte. Não sou tão forte, Minha dor grita por dentro. Seria apenas fingimento, Expor meu corte. Tento fugir, todo momento. Não sei o tanto que agüento.; Nem se a mim, darão suporte, Esse dueto que ostento, Silêncio e morte. Conselho II Olhe à sua volta, O que você vê? Lacuna exposta? Tente preencher. Navalha ou corda Não é solução E nem overdose De medicação. Não importa, agora, Qual o seu problema. Amanhã, o agora, Valerá a pena. Entre Deus e o Diabo, Não tente escolher. Viva a sua vida, Procure prazer Na brisa, à tardinha.; No amanhecer.; Na lua, sozinha, Ao escurecer.; No verde das plantas E em outras tantas Maneiras de ver Esse nosso mundo, Mágico e profundo, Que precisa muito Que exista você. Dentre as páginas de um livro Na verdade, Eu sou a única bandeira Que provém de um lugar desconhecido. Sou o exército Que jamais foi envolvido Numa guerra. Sou a terra Na qual fora erigido, Um castelo de madeira. A princesa Que era escrava de um mendigo. Sou o mito De uma assombrosa fera Que espanta com seu grito. Dentre as páginas amarelas de um livro Que eu li na primavera, Estou perdido. Meu erro Quero fugir de meu erro, Que ironia, Quero fugir de mim mesmo Enquanto é dia. Entre tantos que conheço, Quem eu seria? Seria o que não tem zelo Com aquilo que queria Ou o que tem tanto apreço Que nem mesmo percebia Que cometia um erro, O mesmo que eu cometia? Chega enfim, a noite fria. Então, vem o meu desejo De repetir o meu erro, O erro do qual fugia. Transmutação Eu gostaria de ser você, Mulher.; Enquanto você seria o meu homem. Carregaria para sempre o sobrenome Daquele que pouco dar E muito quer. Assim, teria sua força de vontade, Sua coragem E também sua ilusão De acreditar num tolo e fraco Que já não sabe de que lado Fica o seu próprio coração. Eu sentiria no meu rosto, A emoção de quem se cala.; Enquanto escorre uma lágrima Em busca de seu coração, Por entregar-se corpo e alma A esse louco que lhe fala, Pedindo calma E perdão. Filosofia poética Entre hábitos, A vida nos carrega. Na estética, As formas ideais. Os normais, Entre a moral e a ética. E dentre essa página aberta, Filosofia poética Que nos transcende ao real.; Uma lâmina fatal Que perfura nosso cérebro Através de toscos versos, Que devassa o universo A procura de um sinal Da verdade absoluta, Uma incógnita que reluta A uma explicação cabal. Postal O que é real Perante os olhos intuídos.; A flor, o riso, Uma forma casual? Sou imortal Perante os olhos redimidos, Ou sou motivo De um fenômeno temporal? A pedra, o sal Seriam sólidos diluídos? Os meus sentidos, Divisão de bem e mal? Talvez, normal Seja estereótipo fictício. Feio e bonito, Os dois lados de um postal. Um singular presente As formas São definições do que se vê. O que se vê Não é essência do que existe. Quem sabe, Não esteja em seu poder, Reconhecer A realidade que persiste? As horas São reprises permanentes. Enquanto o sempre É o espaço sem o tempo. Assim, seria o nosso pensamento Um singular presente. Sombra perfilada Existo Pela extensão de uma idéia. Numa caverna, Sou a sombra perfilada. Minha mente, Uma chama que se apaga. No silêncio, Em meu pensamento Crio o mundo à minha volta. Minha história, Um engano da ciência. Minha crença, Uma ilusão de ótica. Mundo imaginado Sou condenado Por viver na inocência. Peço clemência A um deus fantasiado. O meu pecado, O peso da consciência. Minha inocência, A de um mundo imaginado. Percepção II Percebo a vida Através de meus sentidos E acredito Na realidade percebida. Então, imagino Que é real o meu caminho E sigo uma idéia Que me guia. O pensamento Que é reflexão no tempo, É minha única companhia. Realidade oculta Sou eu, enfim, Uma matéria resoluta Que vive em luta Com a essência que há em mim. Talvez, no fim, Seja realidade oculta, Sendo matéria que se ajusta Para esse fim. Uma idéia solta Eu era um homem Que me achava certo. Com um livro aberto Falava do fim, Onde o mundo Se acabaria. Porém, não sabia Que o mundo que havia Já chegara ao fim. O mundo era uma idéia solta De uma mente louca Que havia em mim. Pela segunda vez O meu espírito É volátil como a vida. Meu corpo físico É matéria expressiva, Decomposta pela terra.; Sendo eterna Em constante transformação. Minha emoção, Meu confuso pensamento Esvaindo-se no tempo Qual minha imaginação. Os meus sentidos, De minha boca, Dos ouvidos, Dos meus olhos redimidos, Pelo cheiro, Pelas mãos, São passageiros Como serão os meus versos Quando houver no universo Uma nova explosão. Outrora Pela janela, O céu azul em nuvens brancas. Em minha rede, Balanço as lembranças Do passado. Entre as paredes do meu quarto, Assim, descanso. Entre cochilos Não percebo o avanço Da escuridão lá fora. Da mesma forma, Não percebi a magia Quando a noite virou dia E eu me tornei outrora. Socorro! Não peço nada mais Que ajuda Ante os momentos Que a fraqueza me condena. Diante do problema, De mim, cuide. Essa atitude Alivia minha doença. Não peço que me cure, Não está em suas mãos. Só peço que me ajude Enfrentar um mal que fere o coração. Comungar Degusto teu corpo Em minha boca. Teu sangue, Num cálice, eu bebo E lentamente, tu desces Às minhas entranhas. São coisas estranhas, Que tuas preces Só me fortalecem. Sou eu, quem te engana. Fingimento Não sou subterfúgio, Nem glória.; Minha história Permanece em silêncio. Venda que sufoca Meus olhos Que ainda choram Sob o peso de um lenço. Enquanto penso, Um sorriso esboço. Faço o que posso Pra não ser fingimento. Somos diversos Somos esdrúxulos, Velhos banguelas Que esqueléticos Sopramos fétidos Hálitos de ervas. Somos favelas, Bolsões de lixo. Somos prolixos De roupas velhas. Somos bacanas, Jovens sacanas, Somos patéticos. Somos diversos, Membros carnais. Jamais eternos, Somos mortais. Apenas um sonho Todas as vezes que sonhamos, Contornamos a realidade.; Tornando verdade, Aquilo que acreditamos. Somos humanos Cheios de fatuidade. Já é um sonho, Sermos realidade. Todas as fatalidades, Como nossos desenganos, São pesadelos que encontramos Na realidade Que talvez seja, apenas um sonho. Candelabro Hei de acreditar que não sou louco Na sobriedade de meus atos. Porém, sou outro Na intimidade do que faço. Hei de superar o meu desgosto Na felicidade de meus dias. Serei um outro, Livre de tristeza e agonia. Hei de vencer um dia, Na superação de um insensato. Serei tão claro Quanto à luz do candelabro Que me alumia. Feição expressiva Quero notar uma feição expressiva No teu olha,r No dia em que te encontrar, Quando assim, eu gritar Te amo, te amo, te amo. Quero te ver adormecer Com a cabeça em meu ombro, Enquanto eu for falando Te amo, te amo, te amo. Quero entender Por que jamais consegui te esquecer E andei ti procurando, E repeti a mim mesmo, em segredo, Te amo, te amo, te amo. Não me importa Em que lugar eu me encontro, Infinitas vezes, vou falar: Te amo, te amo, te amo Quero te ver acordar, No teu ouvido irei sussurrar O quanto ainda te amo. O outro Tenho medo de encontrar o outro eu Que se esconde Nesse cérebro que é meu. Sei que ele virá à tona Ante a fome, ante a sede e a desonra. Por minha sobrevivência, O eu de fúria Desconhece a inocência, Sua frieza, sua loucura E sua própria natureza. Uma besta Que não espera Para matar. Uma fera Que não sabe Esperar. Quem é? Será? Quem é essa santa Que como tantas Não me agüenta A falta de crença? Será essa outra Que nunca consegue Levar-me à novena? Quem é essa louca Que na sua reza Sempre me condena? Será uma madrasta, Um anjo de saia Com voz feminina? Talvez, minha sina Seja o inferno, Por ódio eterno Da luz que ilumina. A sombra II Sombra que corre Alarmada, Sob a casa Que assombra, Enquanto a luz a mantinha. Sombra apagada E sozinha, Dentre a escuridão Se acaba, Sombra minha. O relógio à corda - Que horas? Eu pergunto com muita insistência. - Agora, Minha hora não importa, Pois já não faz diferença. O relógio me responde com ofensa. - Eu prometo dar-lhe corda. - Passa das três e quarenta. O relógio não se agüenta E diz a hora. Castos Pela janela um vulto Demarcado pela lua.; Em um leito impoluto Sua forma se insinua. Ele viera da rua, Se achegara sorrateiro, Enfrentara a noite crua Pelo seu amor primeiro. Dama casta Que se ardia em desejo.; Nua, Sentia na pele sua, Um frio que metia medo. Translato Quem me dera Eu pudesse iluminar Seu caminho para o mar, Tal qual a lua. Vê-la nua, A banhar-se devagar, Me faria desejar A pele sua. Eu seria esse vento Que tua pele, acaricia. Mesmo num breve momento, Lentamente, eu morreria. Se eu pudesse renascer, Eu voltaria. Qual o sol no dia-a-dia, A cada amanhecer. Quando viesse anoitecer, Novamente eu vê-la-ia. Desta vez, eu choraria Numa chuva fria Que caía em você. Pêndulo Meu rosto pálido, Mergulhado em pensamentos, Enquanto o pêndulo No silêncio, oscilava. Seu próprio peso Demarcava o movimento.; Assim, lamento, O meu peso me parava. Em meio à sala, Olho em direção ao pêndulo. Na mão, ostento, A caneta que grafava. Meu pensamento, Tal qual o pêndulo, Balançava. Ativismo Talvez, em tempo ainda hábil, Eu possa modelar o mundo. Sei que no fundo, Todo ativista é volátil. Talvez, o meu perfil, Seja aceitável. Mesmo sendo indomável, Meu caráter. Talvez, a minha mão Entre em ação E à razão, Não seja tarde. Talvez, oposição seja ilusão, E ilusão seja coragem. Quem sabe? Narrador demente Nos delírios De um narrador demente Que ainda sente O calor de sua história, Eu repito que sou sobrevivente De um trágico acidente Que à minh’alma devora. Entre cordas E um esforço permanente. De um navio Que afundara sem ter glória. Dos destroços, Um barril desponta à frente. Sua carga, Um menino que ainda chora. Foram dias e noites, Mar afora. Uma ilha desponta, de repente. O resgate de um sobrevivente Que um dia recorda, Que não passa de um narrador demente Que imagina da história, Ser o personagem outrora, Existente. Que mundo é esse? Que mundo é esse Que se espalha Entre becos sem saída, Entre ruas vazias, Umas vezes, em tumulto, Outras, em silêncio? Que mundo é esse Que tremula em bandeirolas Esquecidas desde o último Movimento, Que pediam mais empenho Da nação? Que mundo é esse Onde as dores são em vão E o sofrimento É esquecido pelo tempo, Como também, a lição? Que mundo é esse Onde a fome anda ao redor da abundância E a esperança Já não passa de um sorriso De seu filho, Uma inocente criança Que olha ao redor, indeciso, Sem saber Que mundo é esse? Cerco Se o cerco está fechado, Busque uma saída E não me diga Que tem medo de errar. Errar é apenas tentativa De acertar. A ocasião só está perdida Se não tentar. E mesmo se errar, Tente em seguida. Sendo pra salvar a vida, Dê quantas investidas Precisar. Morrer tentando escapar, Não é suicida, É gritar para si mesmo: - Nunca desista! E lutar.