|     
				| LEGENDAS |  | ( 
					 * )- 
					Texto com Registro de Direito Autoral ) |  | ( 
					 ! )- 
					Texto com Comentários |      |   | 
	|
 | Poesias-->O HAVER (Vinicius de Moraes) -- 01/01/2008 - 16:01 (Heleida Nobrega Metello) |  |  |  |  |  |
 | O Haver 
 
 
 
 
 
  
 
 
 
 
 (Vinicius de Moraes)
 
 
 
 
 
 "Resta, acima de tudo, essa capacidade de ternura
 
 Essa intimidade perfeita com o silêncio
 
 Resta essa voz íntima pedindo perdão por tudo
 
 - Perdoai-os! porque eles não têm culpa de ter nascido...
 
 
 
 Resta esse antigo respeito pela noite, esse falar baixo
 
 Essa mão que tateia antes de ter, esse medo
 
 De ferir tocando, essa forte mão de homem
 
 Cheia de mansidão para com tudo quanto existe.
 
 
 
 Resta essa imobilidade, essa economia de gestos
 
 Essa inércia cada vez maior diante do Infinito
 
 Essa gagueira infantil de quem quer exprimir o inexprimível
 
 Essa irredutível recusa à poesia não vivida.
 
 
 
 Resta essa comunhão com os sons, esse sentimento
 
 Da matéria em repouso, essa angústia da simultaneidade
 
 Do tempo, essa lenta decomposição poética
 
 Em busca de uma só vida, uma só morte, um só Vinicius.
 
 
 
 Resta esse coração queimando como um círio
 
 Numa catedral em ruínas, essa tristeza
 
 Diante do cotidiano; ou essa súbita alegria
 
 Ao ouvir passos na noite que se perdem sem história.
 
 
 
 Resta essa vontade de chorar diante da beleza
 
 Essa cólera em face da injustiça e o mal-entendido
 
 Essa imensa piedade de si mesmo, essa imensa
 
 Piedade de si mesmo e de sua força inútil.
 
 
 
 Resta esse sentimento de infância subitamente desentranhado
 
 De pequenos absurdos, essa capacidade
 
 De rir à toa, esse ridículo desejo de ser útil
 
 E essa coragem para comprometer-se sem necessidade.
 
 
 
 Resta essa distração, essa disponibilidade, essa vagueza
 
 De quem sabe que tudo já foi como será no vir-a-ser
 
 E ao mesmo tempo essa vontade de servir, essa
 
 Contemporaneidade com o amanhã dos que não tiveram ontem nem hoje.
 
 
 
 Resta essa faculdade incoercível de sonhar
 
 De transfigurar a realidade, dentro dessa incapacidade
 
 De aceitá-la tal como é, e essa visão
 
 Ampla dos acontecimentos, e essa impressionante
 
 E desnecessária presciência, e essa memória anterior
 
 De mundos inexistentes, e esse heroísmo
 
 Estático, e essa pequenina luz indecifrável
 
 A que às vezes os poetas dão o nome de esperança.
 
 
 
 Resta esse desejo de sentir-se igual a todos
 
 De refletir-se em olhares sem curiosidade e sem memória
 
 Resta essa pobreza intrínseca, essa vaidade
 
 De não querer ser príncipe senão do seu reino.
 
 
 
 Resta esse diálogo cotidiano com a morte, essa curiosidade
 
 Pelo momento a vir, quando, apressada
 
 Ela virá me entreabrir a porta como uma velha amante
 
 Mas recuará em véus ao ver-me junto à bem-amada...
 
 
 
 Resta esse constante esforço para caminhar dentro do labirinto
 
 Esse eterno levantar-se depois de cada queda
 
 Essa busca de equilíbrio no fio da navalha
 
 Essa terrível coragem diante do grande medo,
 
 e esse medo Infantil de ter pequenas coragens."
 
 
 
 
 
 postado por Heleida Nobrega Metello
 
 
 | 
 |