O tempo parou, Bianca
A terra brecou
e o sol fincou-se no céu.
Ficou ali, às cinco da tarde,
que é hora de sol dormir.
O tempo parou, menina.
Cessaram as rezas
pra mãe não morrer.
Ninguém morre agora,
nem acorda antes do galo.
Ninguém come também,
nem pra engordar,
nem pra cuspir no prato
aquela verdura ruim.
O tempo parou.
A imagem da tevê congelou.
Virou azulejo de cozinha.
Em outro canal a bailarina não pulou.
Levantou a perna somente
e ela parecia assim,
couve-flor de salada.
Verdura cuspida.
O tempo parou dentro de ti, Bianca.
E não há mais nada que faça aparecer
a menina dos teus olhos
e o teu ronco de barriga
na hora da merenda.
O tempo parou.
Parou para respirar.
O tempo respira agora.
Respire também, Bianca.
Porque ninguém morre,
de ovo de galo na cabeça.
ou espinha de peixe voadora
no meio da garganta.