Escrever

A única coisa que eu levo a sério

É escrever.

O resto é brincadeira.

Até mesmo viver.

Escrever não.

Se existo, é por isto.

Tudo mais acaba em cansaço.

Num abraço lasso.

Nem mesmo à igreja quero mais ir.

Comprei um navio.

Ancorei-o num lugar santo.

Arrumei um cantinho para o meu santinho.

Construí ali um altar.

Uma igreja só para mim,

Onde posso com Deus falar.

Eu rezava como via rezar.

Até agora não descobri porque naquele dia

Tinha que estar ali.

Mas eu estava, e foi assim que aprendi a rezar.

O que ali ouvi mudou o meu modo de pensar.

Era um padre, já vem velhinho que antes de partir,

Quis assim do mundo se despedir.

Lá do púlpito pôs-se a falar.

Não era sermão, era confissão.

Dizia para quem ali tinha ouvidos de ouvir:

Venham à igreja, se quiserem vir.

Assistam quantas missas quiserem assistir.

Mas não é aqui que vão conseguir com Deus falar.

O melhor lugar é a zona de conforto que cada um

Conseguiu achar.

Pode ser na cozinha.

Chame por Ele e logo verá que não está sozinha.

Pode ser na sala.

Desligue o rádio, a televisão, por enquanto as

Ondas deles ainda não conseguem com Deus

estabelecer qualquer conexão.

Pare! Sentado, deixe o corpo em ponto morto.

Como quem já não sente.

Esvazie corpo e mente.

Comece a respirar profundamente.

Sinta o ar entrar.

Entregue-se: inspirar, expirar!

Perca-se no tempo e no espaço enquanto este prazer durar.

Treine bastante, aumente o tempo deste doce levitar.

As suas preces ganharam asas, com os anjos aprenderam

A voar.

Entre no espaço celestial.

Agora você sabe com Deus falar.

Lita Moniz