Francisco Miguel de Moura (Chico Miguel)*
RECITAL DE POEMA NO NÓS E ELIS'
Para o amigo Ozildo Barros
(Poema de Chico Miguel, recitado pelo próprio autor,
no famoso bar "Nós & Élis", logo que soube que o lixo atômico
viria a ser despejado nalgum lugar do Piauí)
RÉCITA - 1
Lixo atômico!
Ai, minha terra Francisco Santos!...
Picos!...
Em vez de plantar mandioca
Vai plantar o câncer.
Ai dos meus rios,
Ai das minhas fontes,
Pontes
Lençóis freáticos!
O país do não come,
O país do não veste,
O país do não ouve,
O país do não chove,
- Piauí, triste/teste/toste.
Vamos receber o lixo do luxo,
Vamos receber o câncer dos ossos,
Vamos receber o câncer dos olhos,
Dente por dente, por dentro, olho por olho.
Meu grito contra o lixo atômico
É um grito histriônico:
- Á merda, bomba! - Todas as bombas!
RÉCITA - 2
Não se pode mais plantar
batatas
Nas chapadas de Francisco Santos.
Não se pode! Não se pode!
Lá vão depositar o lixo dos "estranjas"...
No Piauí, não se pode, não se pode!
Ai, pátria do "não chove",
Não come,
Não dorme.
Aí vem a bomba e sua carga
Amarga!
Molhemos nossos olhos, olhemos
Nossos próprios ossos.
Ai das nossas águas rio arriba,
rio abaixo!..
Ai, Parnaíba, "velho monge"
Das nossas terras!
Ai do nosso sangue! Doi.
Morrendo nos veios, nos vales, nas chapadas,
Não se pode mais plantar mandioca,
Não se pode mais plantar mais nada.
Nem poesia.
Ai, não se pode, não se pode, não se pode!
Therezina, 23.10.1986
RÉCITA - 3
Lixo atô-mico!
Luxo atômico para são paulo!
r i o
brás íl ia...
Lixo para o Piauí,
Lixo, bicho!
Gente do Piauí come lixo
o pobre,
opóbrio!
o burguês.
Não esse lixo-luxo-energia
des-man-te-la-da.
Fora o lixo atômico,
fora toda a lixívia!
Quem não sabe que o bicho e o homem
não comem?
FORA, POLÍTICOS E CIENTISTAS
QUE SÓ ENTENDEM DO ATÔMO,
MAS NADA DO HOMEM!
NEM do ab(do)mem.
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* Francisco Miguel de Moura nas noites em outubro, andava com o também poeta Ozildo Barros e baixavam no bar 'Nós & Elis', Teresina, para conversar, recitar e revolucionar o tempo e o ambiente.
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