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Poesias-->UM MOMENTO DA CIDADE POSSÍVEL -- 20/11/2012 - 23:07 (PAULO FONTENELLE DE ARAUJO) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos

O avião Airbus saiu da pista,

pareceu alçar voo,

levantou a asa direita,

mostrou a pança esbranquiçada,

mergulhou e explodiu.



A queda do Airbus em 2007 surgiu assim para o menino,

foi como ver um dinossauro de frente.

perder a noção do tempo

atrás de um assombro luminoso.

E o assombro também era o lado oculto da lua.



Mas o menino estava dentro do carro,

estava na primeira fila

da segunda pista,

sobre o viaduto

onde passaria o avião por cima.

Passou o ar quente por baixo

em outra contramão.

O ar quente nascia do quarteirão em chamas

e veio e não parou de vir

e seguiu pela avenida 23 de maio.

Chegaria ao obelisco pelos mortos

da Revolução de 32.

O menino lembrou

e depois não entendeu o monumento:

Em qual lugar estavam os mortos?

Martins, Miragaia, Dráusio e Camargo, 

se o fogo estava ali?.

Alguém gritou que era preciso voar.

Alguém gritou que iria explodir de novo.

Não explodiu.

Alguém gritou que iria explodir de novo.

E quase explodiu,

não fosse o ar preso nos pulmões do menino.

Seu carro saiu.

Devagar.

Passou ao lado do fogo e da nave

que se misturava dentro da toca

e ficaria ali.



(Estávamos em São Paulo,

queimava tão perto.

Morreu todo mundo).



Em um aniversário da tragédia,

de julho de 2007,

o menino voltou ao local.

Construíram uma praça

 e vários obeliscos.

Havia flores, fotografias

e uma chupeta de bebê

(Disseram que o bebê do voo nem existiu).



O Airbus caiu perto do aeroporto de Congonhas,

e falaram do amor das famílias;

falaram da caixa preta,

fácil como um brinquedo.

As famílias das  vítimas  trataram de tudo com uma placa enorme:

“AQUI OCORREU O MAIOR ACIDENTE AÉREO DO BRASIL”.

O menino quis entender a razão do anúncio.



(São Paulo é outro lugar,

em Nova York  Torres Gêmeas são maiores,

aviões e tragédias são  luminosos.

Aqui é mais fácil perder os recordes).



(Perto da Praça das Bandeiras,

há um edifício chamado Joelma,

em um antigo incêndio

morreram quase duzentas pessoas).



( Todos os dias, 

às nove da noite,

a praça já escureceu).



Hoje o menino visitou  o local da queda

finalmente reparou

a árvore que ficara de pé.

Chamam-na de a “árvore da vida”.

mas o menino pareceu ver ali um tipo de crocodilo.



Ah, um crocodilo magnético abocanhara a nave

O crocodilo magnético do meio da praça,

não o outro réptil, revelado pela mídia,

o traiçoeiro, ameaçador,

o todo televisivo inesquecível:

pista molhada para pousos.



Poema criado por quem viu a queda da aeronave.


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