Os mortos têm alguma dignidade
porque não falam.
Não fale,
não elogie, não critique, não exponha,
não avise.
Se te perguntarem algo,
responda,
porque você está vivo.
Se estiver entre amigos sinceros
algum discurso é permitido,
pois aqui o excesso é desculpável.
Fora esses dois momentos,
mantenha-se calado.
Não fale,
muitos falantes morreram com essa cruz:
falar do que imaginam.
Outros amarrados em fogueiras,
morreram de boca aberta
ainda tentando se expor.
Não fale,
principalmente a estupidez
da proposta amorosa.
Estúpida, mas esperançosa
e aqui a esperança exige apenas
mudez e silêncio íntimo.
Não fale sobre o seu passado,
muito menos do presente
e do improvável futuro.
Esta ânsia de fato não interessa,
sobre você poderá cair
o ridículo da hora errada
do boato seguinte
ou pior ainda da falsa reputação.
Fique quieto, escute, sorria.
Seja visivelmente tímido
e se quiser optar por algo burlesco,
cante ou escreva.
Do livro: As sondas amam