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Poesias-->Crepúsculo ocas(i)onal -- 1 -- 29/09/2001 - 14:49 (Daniel Veiga) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos
( I )

Veio a cinza imponderável

visitar-me. Choveu secamente

o espólio das minhas batalhas

no solo acolhedor do fogo.

Arderam os olhos na serenidade

das insónias de augúrios.



Os cursos de água transpiraram

poluidamente na crosta dos dias.

Anunciaram o ardor incontido

do suor, agora no papel, depois

de extinguido pelo calor. Secou

a expectativa serena da esperança.



Escrevo noexílio das marés.



-----



( II )

O decorrer da noite cristaliza.

Um incolor âmbar envolve

as cidades por inventar. Queima

a ausência esculpida no olhar

pela mão vazia. Vê. Escuta

este vazio que não é silêncio.

Sente o pântano que escorre

pelos sulcos da tua escuridão.



Ouço-me gritar ao longe.

Inerte continuo a escrever.



...escuta.



-----



( III )

Virá o sabor da podridão

ou a sujidade tardia

da espuma fácil. Virão

as certezas amargas.



Espero a morte

do crepúsculo.

Sentado, à beira

do caminho corrosivo.



Virão as cores bolorentas

das minhas fúteis

fatalidades. virá a ruína

das previsões falhadas.



Enquanto o futuro

ameaça a estagnação

deste estar-me bebo

o passado reminescente.



É necessária a pureza

do traço. Sento-me

na terra poeirenta

vibrando na história

viva que anima, corre

e é essência deste corpo.



-----



( IV )

Assisto, inconsequentemente

sereno, ao desfolhar das horas.

Um sabor acídulo do papel

que não se queimou sobe

na incompreensão dos dedos.



O dia, adormecido, não existe.

Deixei de poder conceber.

Esculpir ou desenhar. Soletrar.

Só conheço o escuro do quarto

de luz artificial. A projecção

de sombras. Desterro solar

ou despetalizar da pele dos dias

é uma vereda insinuante

na orla da compreensão. Ardo

na melodia egótica que assume

a tocha da arrogância. Durmo.



-----



( V )

O líquido sem cor de uma sombra

polposa lacrimejada por estátuas

que não foram libertadas da pedra

em bruto jorra em ataques

desenvoltos sempre que esqueço

os nomes impronunciáveis da luz.



-----



( VI )

Quero comer acidamente a pose.

Implodir a perspectiva ignóbil

das vaidades. Lavar-me, sôfrego,

no pó séptico da cinza cáustica,

esse esqueleto desintegrado da fénix

que me há-de restaurar. Sopro,

fogo, suor aceso: venham os átomos

reagentes que fazem arder

as estradas emergentes da pele.



-----



( VII )

Rasgo um espaço breve de sombra

nesta luz plena de ruídos. A boca

sobe ao deserto que a noite esconde.



Inspiro e toda a artificialidade

conflui em mim. Sou vácuo

e antítese do mar. Escureço.



Perco as fronteiras inexistentes

da luz. Ou quaisquer outros

paradoxos de sanidade viável.



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