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Poesias-->PROCISSÃO -- 02/05/2002 - 09:13 (Sergio Felix) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos


Cidade alta, céu de sombras

Desde os postes encharcados aos muros anônimos dos becos banais.

A chuva fina desce o morro calada como uma sangria piedosa

Olhos luminosos desalinham rastros apressados na rua de cabeça para baixo,

sob os pés refletida na água imunda.

Garrafas, latas, bijuterias encenam estribilhos esganiçados

Lançados da garganta do esgoto.

Rodas flutuantes na esquina giram estrábicos escuros

Seus doces pululam pelas vitrines de mãos armadas de serpentes.

Caminhar no bulício de nuvens empoeiradas das jogadas, dos vícios,

Das placas incertas, das bolsas aturdidas nos quadris apertados ao braço.

Dos gritos de queixa, o pente de ferro oferece asilo e sede

Detrás dos ombros esmolas urbanas recaem sobre os velhos sujos da praça

E o salto tonto da morte esparge vômito sobre a calçada.



Maré alta, vista de ondas

D’além perdida às salivas que mastigam as pedras do cais.

O chão quebrado lá embaixo desponta veias com unhas dolorosas

Sandálias ardidas do sal de saudades

Polpa regente de melancolia

Acenos refazem caminhos de naus estrangeiras

Nutridas pelo desaguar dos olhos

A ponta da roupa rege os ares, do vento, batendo luto

Das batidas repetidas do mar solto, do corpo preso ao leme.

Das velas acesas, os trovões vazios oferecem cinzas e deuses

De cima da pedra, do dorso, vêem-se lábios esculpidos de areia ao relento

E o olhar duro das garças evocam o rosnar dos seus mortos.



Noite alta, quarto de insônias

Das carnes insanas às lembranças que assombram teias de castiçais

Paredes escravas despencam cios delirantes como fornalhas silenciosas

Lenços molhados escoam pêlos de sonhos suavemente

A doença consome o tempo em plumas etéreas

Carregando cruzes absolutas sob a luz do abajur

Os fantasmas errantes entoam de vozes distantes, de antigas canções de ninar

Assinam recados na porta da sala com um furo sangrando no meio

Em cima da luva um copo d’água cortado ceifa almofadas de cetim

O corpo cede ao sono precipitado ao vão das penas

Dos lábios desfeitos, a poesia de barro espalha sementes e adeuses

Lá dentro da casa olham-se folhas secas sobre a cadeira

e a perna do vento entra pelo véu da janela.

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