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Poesias-->A palavra Amor -- 03/07/2002 - 21:52 (Dante Gatto) |
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A palavra Amor
Tenho medo de algumas palavras,
sobretudo temo a palavra Amor.
O poeta Carlos Drummond de Andrade aconselhou:
"Não a jogue no espaço, bolha de sabão.
Não a pronuncie".
Quando tento emoldurá-la,
apropriar-se dela para meu uso cotidiano,
sofro
a dor inconsolável,
irremissível,
do seu peso infinito.
Remorso.
(Não pensem na estranheza deste fato, se é que lhe pareceu estranho).
Justamente eu,
o conformado,
que tenho dado largas risadas do meu cinismo,
que tenho abusado da confortável e sólida hipocrisia,
que tenho me calado diante de vergonhosas infâmias,
que tenho compactuado, com silêncio, com toda sorte de mentiras,
guardo-a de toda virulência.
No entanto,
com o coração oprimido,
com esse mistério de vida ou morte
busco-a
(e toda a explicação é insuficiente),
atordoado pelo seu poder,
inebriado pelo seu fascínio,
sua face múltipla e misteriosa.
Pressinto-a aproximando-se,
quero e não quero,
fico a sentir-lhe o marulho
- rebojo de um afogado -
e com uma força imprevisível sempre
ela esmurra meu peito enfraquecido,
crava as unhas no meu coração cansado
e sangra-o ainda.
E vem...
Arremessa-se às cordas da laringe
num doloroso atrito
e despenca, chorando, da boca desprevenida,
num salto acrobático e suicida
pela língua estúpida.
Soa como um gemido
e se arrebenta no chão estorricado
num grande estrondo,
desfazendo-se em infinitos pedaços.
Todas as palavras lá amontoadas
(e é o que eu mais tenho feito)
não lhe amortecem a queda vertiginosa.
Reajo entretanto,
enxugo os olhos secos...
a boca seca...
a garganta seca...
e reuno os pedaços espalhados.
“Fez-se em mais pedaços do que havia louça no vaso”.
Voltarei a espalha-los, bem sei,
como quem sabe da absurda distância,
mas não se conforma.
Dante Gatto
Professor da UNEMAT (Universidade do Estado de Mato Grosso)
gattod@terra.com.br
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