Preciso não deixar que o concreto fique sem registro.
Tenho que, no mínimo, registrar todas as desigualdades.
Todas elas, (s)em resumo.
Minha sombrancelha direita mais desatenta,
mais tensa e dolorida... enquanto a esquerda sempre tentando sintetizar as orelhas interessadas dos cachorros,
sempre com sede de informação e sem deixar de questionar nada.
Meus seios ... meus seios ... tão descompassados.
Eles que são tão eu.
Seio entre mim e eu.
Seio que separa de forma confusa o terceiro “T” do meu pseudônimo mais íntimo.
Seio que me confirma rindo ... Eu, ria sempre!
Minha perna esquerda que faz com que barras de calças fiquem uma para outra como antônimos.
Limpa x Suja. Branca x Preta.
Perna esquerda curta.
Talvez pela minha excessiva preocupação na infância de assim que acordasse colocar primeiro o pé direito no chão.
Talvez esta, pelo movimento e exercício diário,
tenha sofrido efeito de uma fisioterapia natural.
Assim como o meu único calo do corpo inteiro.
Calo no dedo do meio da mão direita.
E a minha literatura desde o seu nascimento
fora sempre tão calejada ...
desde todas as redações que encantavam
as professoras de português em todas as minhas quintas-séries.
Preciso tirar fotos das minhas mãos.
Mãos de dedos com juntas grossas, de unhas não-feitas, de cutículas saltantes, gritantes, que não suportam detergente.
E por elas deterem gente, meus dedos sangram e as
pelinhas molinhas – aquelas deliciosas de se puxar com os dentes, ficam gritando e ardendo... carne viva.
E elas deveriam ter se acostumado já,
Eu, criança pobre, desde cedo conheço, mesmo sem querer, as manhas de deter gente.
Eu com os meus papéis de carta fazendo tanta maracutaia.
Tinha que me virar para completar a minha coleção da Moranguinho e sua turma.
Eram caros e a mesada que meu pai me dava era destinada exclusivamente à minha coleção de presilhas de cabelo e canetas que eu comprava na feira de domingo e que nunca duravam mais de um mês.
E quero construir fotografias desses meus cabelos
de agora, tão novos.
Esses, eu não conhecia.
Sim, como tudo e sempre desiguais, mas hoje com pontas triplas, desbotando a cada mês, sem corte nenhum.
Hoje minha juba não menstrua.
Talvez por haver ao meu lado um alguém que fica com olhos brilhantes ao ver o meu rosto e imaginar sobre minha cabeça um chapéu.
Talvez por esse alguém me dizer que gosta
de me ver com a juba toda presa, de preferência com um “cóque”, como o penteado das mulheres gregas.
Eu que sou isso tudo e ainda nem falei da minha barriga e das minhas pernas ... com áreas de pelos falhados ...
Eu que sou totalmente tomada por pêlos ...
O que seria de mim estando careca?
Vou me esforçar para criar uma fotografia minha sem cabelo.
PS.: Precisam colocar em categoria de texto a opção "Prosa"...