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 | Poesias-->ASSIM NASCEU O CASAMENTO... -- 12/11/2002 - 18:02 (ALEXANDRE FAGUNDES)  | 
	
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ASSIM NASCEU O CASAMENTO...
 
 
  Para os jovens de hoje,
  que sabem pouco ou nada 
  dos obscuros milênios passados, 
  trago aqui uma síntese, 
  de um dos piores episódios 
  daqueles tempos de maldade:
  a invenção do casamento.
 
 
  Sim, meninos e meninas,
  creiam neste velho sobrevivente:
  o casamento não é o destino natural,
  não é o ápice do amor mais vivo,
  mas a mordaça que criaram para a paixão.; 
  as correntes que aprisionam o coração.
 
 
  Foi num ano que se perdeu.; 
  foi numa época de luz e flores.; 
  foi num necrotério fétido
  que o casamento nasceu.
 
 
  Parado na porta, pedindo esmolas, vi de tudo:
  velhas fofoqueiras,
  pais enciumados,
  mães interesseiras,
  mocinhas mal-intencionadas,
  rapazes drogados,
  policiais corruptos,
  prostitutas falidas,
  padres ambiciosos,
  juízes de paz,  
  advogados
  e sogras verruguentas.
  Todos juntos sob um mesmo teto.
  Sim, a escória unida para matar o amor.
 
 
  E gritou de lá o padre: 
  - Silêncio! Vamos organizar essa bagunça!
  (Pensava nas taxas que cobraria dos nubentes)
  Falou, lá do fundo, o pai mais enciumado:
  - Minha filha não me ama mais! Exijo providências!
  (Pensava nas brigas, queria o fim do romance)
  Protestaram as solteironas mal-amadas:
  - São um afronta esses namoricos de portão!
  (Não queriam mais as tentações, os calores por baixo)
 
 
  E continuou assim a assembléia:
  - Não é justo não envolver a justiça – disse o juiz de paz.
  - Não é certo amar de graça – argumentou uma mocinha interesseira.
  - Não faturo se estão felizes – lamentou a prostituta.
  - Vejo um grande potencial – planejou o advogado.
 
 
  E, dessa reunião asquerosa, nasceu o casamento.
  Na ata, logo escreveram:
  Que se dê com muita festa! (foi pedido de um cantor)
  Que se faça sempre à noite! (sugestão de um taxista)
  Que exija roupas novas! (acrescentou uma modista)
  Que seja com mesas fartas! (implorou uma doceira)
 
 
  Um ourives sugeriu grossas alianças.;  Aprovado!
  Um hoteleiro sugeriu caras viagens.;  Aprovado!
  Um lojista sugeriu presentes vários.;  Aprovado!
  Um fotógrafo sugeriu álbuns pomposos.;  Aprovado!
 
 
  Até um fazendeiro deu pitaco:
  - Que seja com chuva de arroz!
  Até uma tecelã palpitou:
  - E com lençóis novos!
  Pitacou também um construtor:
  - Quem casa quer casa!
  Palpitou também um papeleiro:
  - Com convites douradinhos!
 
 
  E todos aplaudiram.
  O dono de um bar assoviava...
  (-Terei mais fossas pra curar!)
  O detetive pulava nas mesas...
  (-Vão trair-se. Vou faturar!)
  O pastor orava chorando...
  (- Aleluia! Vou pregar a novidade!)
  Os psicólogos exultavam...
  (- Vou comprar um divã novinho!)
 
 
  E, no meio daquela turba promiscua,
  com enxofre e barulhão,
  eis que veio quem faltava:
  o próprio diabo apareceu!
 
 
  - Lá da cova onde me escondo,
  onde guardo os rancorosos,
  tive notícias desse encontro,
  e faço questão de colaborar!
  Assim berrou o demo, sob aplausos.
 
 
  Foi puxando um pano preto
  e rabiscando uns planos tortos.
  - Mudo o jeito das pessoas,
  vão achar que isso é normal!
  E todos os olhos brilharam
  ante à astúcia de satanás.
 
 
  Brindaram com cálices de fel.
  Gritaram coisas sombrias.
  Aplaudiram a maldade nascente.
  Comemoraram a mentira que acabaram de aprontar. 
  Estava criado o casamento.
 
 
  Na manhã seguinte,
  mocinhas esconderam seus seios.; 
  rapazes criaram cuecas.; 
  namorados se envergonharam.; 
  e cada flor perdeu seu perfume.
 
 
  Foram imensas as filas:
  - O meu vai ser em maio!
  - Vamos fazer ao ar livre!
  - Quer ser meu padrinho?
  - Quero a lua com mais mel!
  E assim foram, planejando os casamentos...
 
 
  Dito e feito. Estava certo o diabo:
  - Minha filha, sem casar não pode amar!
  - Você está me enrolando, Zé! Cadê as alianças?
  - Tire a mão daí! Comigo, só casando!
 
 
  E era de tal modo uma praga,
  que quem descasava, logo recasava.
  Era de tal tamanho a mentira,
  que maldisseram os solteiros.
  Era de tal sorte o embuste,
  que chamaram isso de amor.
 
 
  E os ourives ficaram ricos.
  Os botequeiros ficaram ricos.
  As costureiras ficaram ricas.
  Os músicos medíocres ficaram ricos.
 
 
  E enriqueceram os padres, que casaram os casais.
  E enriqueceram os juízes, que separaram os casais.
  E enriqueceu cada meretriz, cada psicólogo e cada advogado.
 
 
  E ninguém mais teve paz.
  E ninguém mais viu poetas.
  E ninguém mais mandou flores.
  Sumiram a lua e a paixão.
  E o tesão morreu de anemia.
 
 
  Assim nasceu o casamento, meninos.
  Na saúde e na doença,
  na riqueza e na pobreza,
  na festa e no funeral,
  só uma coisa é certa:
  foram infelizes para sempre.
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
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