Palavras
Hoje mais uma vez perdi-me nos teus olhos e afoguei-me neles sem remédio.
Hoje mais uma vez senti que entre nós ficaram coisas por dizer. Senti as palavras vaguearem entre nós sem nos atingirem.
Senti o que tinha para te dizer empurrar, eu não sei o quê, na minha garganta sem conseguir sair e ir ao teu encontro.
Não sei o que sentiste, mas vi-te engolir em seco e senti o que tu sentiste vir ao meu encontro. Algo sem nome, mas intenso. Vi-te estender os braços para mim, senti que me querias tocar. Uma vontade quase imperativa. Não me abraçaste. Não me tocaste. Mas eu senti.
E ali ficaram as palavras no meio de nós. Vi-as rodopiarem, formarem um remoinho de emoções não confessadas, girarem sobre si mesmas e perder-se no vazio antes de voltarem para nós.
O travão que pões no teu coração trava o meu.
Mete-me medo porque não sei se é real o que eu penso que tu sentes, se são coisas da minha cabeça. Tenho medo que sejam reais, tenho medo que não sejam. Se acaso são, porque as travas? Se não são, porque sinto eu que são? O que é isso que tens para me dizer e não dizes? Porque afogas as palavras dentro de ti? Se libertardes o teu discurso, só um bocadinho, eu libertava o meu. Também sei que, se eu expulsasse de mim tudo o que tenho para te dizer, tu falavas. Mas tenho medo do teu falar. Tenho medo que me magoes.
Assim cada vez que nos vemos, ficam coisas por dizer. Um mundo de palavras soltas no meio de nós. Sem sentido. Querendo fazer-nos sentir sem o conseguir.
E sinto que elas nos puxam um para o outro.Devem ser elas aquela força que nos atrai um ao outro, e que nos faz dar voltas e mudar de posição e olhar para o lado com fingida indiferença, não querendo mostrar que ambos nos perturbam.
São elas, as palavras.
Elas querem libertar-se libertando-nos. Por isso fazem-nos sentir assim, presos no magnetismo um do outro.
Enquanto não falarmos vai ser assim.As palavras ficam dentro de nós e pesam-nos no coração. Estrangulam-no. Apertam-no. Ensopam-no em sentimentos febris e desenfreados que não conseguimos soltar.
É isso também aquele mal estar no estomago quando te vejo. Indigestão de palavras.
Não se deve deixar nada por dizer.
ft/NET
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CARLOS CUNHA/o poeta sem limites
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