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Roteiro_de_Filme_ou_Novela-->Quatro Unhas -- 29/08/2016 - 08:58 (Jeanne Martins Nascimento) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos
Quatro unhas

“Oi moça bonita!”

Camélia quase desmaiou de susto ao ouvir uma voz masculina bem perto de sua nuca. Chegou a sentir o hálito quente. Escorada no balcão da barraca do tiro ao alvo. As pernas bambearam de vez, firmou bem as mãos na tábua gasta pra não cair. Ele veio, teve coragem e veio mesmo. Respirou fundo, um gole bem grande de fôlego e foi virando-se devagar tentando não deixar transparecer a ansiedade.

“Oi, tudo bem? Ta falando comigo?”

“Achei que não ia aceitar meu convite. Meu nome é José Cravo.”

“Você que me mandou aquele bilhete abusado?”

Ele riu um riso de despetalar moças com nome de flor. Era mesmo intrigante esse Zé, ria bem mais com os olhos do que com a boca e deixava a mostra uma covinha do lado direito. Ela registrou cada detalhe da cara debochada dele; sentia um desassossego, um misto de vontade de avançar nele a tapas ou cravar-lhe as unhas num abraço. Coração disparado fazia com que as pernas demorassem a recobrar a firmeza.

“Mandei. Faz dias que te vejo saindo da escola e te acompanho com os olhos, de longe. Aceita um sorvete?”

“Aceito sim, aquele do canto, bem verde!”

Foram caminhando pela festa, ela lambuzando-se com o sorvete de menta, a combinar com a barra da saia. De repente Zé toma dela a casquinha vazia e a atira num cesto do lado:

“Vem pra dança!”

Enlaça sua cintura e já saem rodopiando pelo pátio da festa de São João. Dançar faz bem pra alma, faz sorrir o corpo inteiro. Bela maneira de percebermos se gostamos ou não da proximidade do outro; é feito abraço, reação química pura, na hora já sentimos se acende ou não a chama do desejo. Há quem defenda que na dança a mulher conhece muito do homem. Se ele é gentil, desembaraçado, se sabe tomar decisões... e se ela gosta do seu cheiro. Dançaram até o fim da festa. Dali pro primeiro beijo foi só chegarem ao portão da casa dela. Já que paixão é coisa que não se explica, apenas sente-se, ela passou a noite em claro relembrando sua noite e desejando as próximas.

Zé morava em Brisa Mansa uma cidade vizinha. Todo fim de tarde vinha no ônibus da faculdade. Assim podiam se ver todos os dias. Ele fazia parte do Centro Acadêmico da faculdade, e tinha as chaves de lá. A sala ficava no segundo piso, tinha um monte de cacarecos e uma enorme janela que dava pra marquise. No canto um velho violão, cheio de nomes rabiscados a caneta, feito autógrafos desbotados pelo tempo. Cada autógrafo um nome, uma amizade, uma lembrança, uma história. Sobre o banco de madeira um velho tapete barato, desbotado e puído.

Quando sua aula acabava mais cedo Camélia ficava lá esperando por ele. Numa noite enluarada, ele convida:

“Vamos pular a janela pra ver a lua? Está simplesmente liiinda!”

Camélia pegou o velho violão e o tapete desbotado, pularam a janela, forraram o chão, acomodaram-se sobre ele. A lua cheia amarelada dando um ar romântico a noite e ao casal. Camélia pegou o violão, tirou uns acordes. Ele pediu:

“Toca aquela do Caetano que eu gosto?”

Ela sentou-se de pernas cruzadas e começou:

“Uma Tigresa, de unhas negras e íris cor de mel
Uma mulher uma beleza, que me aconteceu
Esfregando a pele de um ouro marrom, do teu corpo junto ao meu
Me falou que o mal é bom e o bem cruel!”

Ele adorava essa música, se comovia mesmo, sabe se lá porque! E seguiram cantando noite adentro.

Camélia cantava com alma, olhos nos olhos do seu Zé! Ele, um desafinado e tanto, embevecido, adorava vê-la declamando abraçada ao violão! As vezes desejava ser o violão só para ter os braços dela a sua volta e estremecer com sua voz ao pé do ouvido. Noutras imaginava ela e o violão, nua, sensualmente tocando pra ele! Nunca a tinha visto nua...

Lá pelas tantas, largou o violão, Zé deitou a cabeça em seu colo. Camélia enfiou os dedos na sua cabeleira negra. Isso o deixava tonto. Nunca tinham ido além de uns beijos e abraços. Quando ela enfiava os dedos no cabelo dele, começando da nuca até a fronte da testa, arrepiava-o a pele e as entranhas.
Aquela lua era um convite ao atrevimento... Suas mãos foram se enchendo de ousadias, percorrendo curvas, enseadas... Verdadeira aula de anatomia. Ela sentia um queimar, algo que ia do pensamento ao ventre, que chegava a arder.

Camélia e seus medos, seus pudores, seus receios...

As frases da música misturavam-se aos pensamentos e sucessão de acontecimentos “enquanto os pelos dessa deusa”... “As garras da felina” percorriam suavemente o dorso do Zé, causando arrepios de desejo!

Foram se desnudando pouco a pouco, a calça boca de sino, o tamanco, a camisa xadrez misturados pelo chão... “com alguns homens foi feliz, com outros foi mulher”...

“Ela me conta sem certeza” e viveu, sem medos os sonhos de amor com Zé!

O violão num canto ainda ecoava seu último “lamento e a manhã nasceu azul, como é bom poder tocar” o corpo e coração de quem se ama!

Camélia acorda, acaricia o negro cabelo de Zé que dorme sob o sol que surge. Senta-se no tapete, estende a mão em busca da bolsa de franjas, tira de dentro um coraçãozinho rosa, lembrança do dia que se conheceram. No verso, escreve seu próprio verso:

Se você quer marcar a ferro e fogo
Alma e pele da mulher
Dispensável é loucuras cometer
Nenhum malabarismo sequer
Basta, ao pé do ouvido, baixinho... dizer
No momento que antecede o gozo e o prazer
Sou totalmente apaixonado por você, tanto, tanto, que nem sei o que fazer!

Mais tarde Zé chega em casa com a camisa pendurada na mão. Sua irmã mais velha perguntou:

“Mano, que roxo é esse no seu pescoço?”

“Machuquei jogando bola na faculdade”

Vira-se a caminho do banheiro, e a mana dispara:

“Zé, não me enrole, apenas o jogo do amor seria capaz de deixar nas suas costas essas marcas de quatro unhas.”

Colaboração: Ângela Fakir e João Rios Mendes
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