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Roteiro_de_Filme_ou_Novela-->ADEUS À INOCÊNCIA - CAP. 02 -- 30/07/2005 - 16:39 (Edmar Guedes Corrêa****) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos
ADEUS À INOCÊNCIA - CAP. 02


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2


A tempestade abrandou algum tempo depois, transformando-se numa chuva fininha. Durante esse meio tempo, nossa única preocupação foi procurar nos mantermos vivos, a espera de socorro. De forma que não sobrou tempo para pensar em meu tio, embora sua presença nos teria tornado as coisas bem mais fáceis. Mas quando começou a escurecer, quando a pouca claridade começou a desaparecer, fomos novamente tomados pelo pânico. Só a ideia de ficarmos à deriva, no escuro, na imensidão do oceano, sem noção de onde estávamos e sem esperança de que alguém nos encontrasse, gelavam-me os ossos. Se não bastasse, ainda era preciso encontrar forças para dar esperanças às meninas. Ana Paula jazia inconsolável, gritando pelo pai, ora implorando para que eu fosse procurá-lo, ora dizendo que ele havia morrido.
-- Não fique assim, amiga! – disse Marcela, uma jovem de pernas grossas e nádegas redondas, traços herdados da mãe, a qual era filha de uma negra com um homem branco. – Seu pai pode ter se extraviado da gente, só isso. A onda deve ter levado ele para longe, na outra direção. Aí ele deve ter se perdido da gente. Por isso não conseguiu encontrar a gente. – disse ela, com um braço na amiga e segurando o pedaço do barco com a outra. – Se nós, que somos mais inexperientes nos salvamos, por que ele, que tem mais experiência com o mar, não se salvaria também?
-- É mesmo, prima! – falei. – O tio só se perdeu da gente. Talvez ele soubesse em que direção nadar e foi em busca de socorro. – No fundo, eu não acreditava nisso, pois certamente a primeira providência que teria tomado era nos encontrar, mas tinha de dizer-lhe alguma coisa, dar-lhe esperanças para confortá-la.
Ana Paula não ficou de todo convencida, entretanto acalmou-se por algum tempo.
A noite aprofundou-se rapidamente, mais rápido do que costumava em terra. Em pouco tempo tudo ficou na mais completa escuridão. Não se podia enxergar nem um metro à frente, pois, para complicar, a lua não ajudava. Todavia, não tínhamos alternativa. Era só esperar, esperar... até que o dia amanhecesse e então poderíamos pensar em algo, numa forma de sair dali.
Por sorte a água não estava gelada demais. Também, naquela região, próximo à linha do equador, não havia como estar tão fria mesmo. Enquanto esperávamos, tomados por um silêncio terrível, tentei imaginar onde poderíamos estar. Claro que um garoto de treze anos, com pouquíssima experiência no mar, não seria capaz de calcular muita coisa. Mas eu deduzia que, se saímos do Recife em linha reta, poderíamos estar a num raio 50 milhas da costa. Isso porém não passava de uma suposição, pois não fazia a menor noção da distância. Apenas chutei esse número ao acaso, da mesma forma que poderia ter chutado 20, 30 ou 40 milhas. A única coisa da qual havia alguma certeza era de que não seríamos encontrados com facilidade. A equipe de busca teria muito trabalho para nos encontrar, pois mesmo que encontrasse os destroços do barco, ainda sim não nos acharia. Por quê? Estava bastante claro para mim que nos afastávamos do ponto onde o barco naufragou. Eu só não sabia se avançávamos mar adentro ou se estávamos sendo arrastados para o litoral. Minhas esperanças estavam justamente nessa segunda possibilidade, pois nesse caso teríamos mais chances de sermos encontrados.
O que nos desesperava ainda mais não era só o fato de estar de noite e não enxergarmos simplesmente nada (aliás, nunca tive tanto medo do escuro quanto ali embora não estivesse sozinho), mas principalmente o cansaço, a fome e a sede. Faziam horas que não comíamos ou bebíamos uma única gota de água. Disso eu tinha certeza. Meu estômago doía consideravelmente. Marcela por sua vez reclamava amiúde que sua boca estava seca e que estava morrendo de fome.
Quando o dia amanheceu, pensei que teríamos mais um dia de sofrimento. E tudo começou a indicar que sim.
Que ironia do destino! Marcela sofreu um desmaio e quase se afogou. Justo ela, o motivo daquele passeio. Foi para agradá-la, para lhe fazer bonito que sugeri ao meu tio sairmos de barco. E ela não se afogou por pouco, pois na imobilidade do silêncio estávamos distraídos com nossos pensamentos, feito aqueles que após longas horas numa mesma estrada não encontra mais assunto. Na verdade, a fadiga e a sonolência nos deixava fracos e desorientados. De repente, Marcela escorregou, o colete salva vidas se soltou e ela começou a afundar. Por sorte, Ana Paula deu um grito e eu mergulhei atrás dela. Consegui agarrá-la pelo braço, antes que desaparecesse completamente embaixo da gente. Levamos um susto danado. E foi o suficiente para que Ana Paula descambasse novamente a chorar por causa do pai. Mas por outro lado foi bom, porque nos despertou antes que algo pior viesse a acontecer.
O milagre veio algum tempo depois, quando o sol jazia sobre as nossas cabeças.
-- Estou vendo alguma coisa ali na frente – disse Luciana, apontando com o dedo em minha direção. Além de ser a mais velha, era a mais alta de nós. Tratava-se de uma jovem de pele clara, cabelos longos e quase loiros. Era de uma beleza inconfundível, tal qual a encontrada nas grandes modelos. E embora fosse prima de Ana Paula, não se podia encontrar um único traço capaz de confirmar o parentesco. Talvez, se eu não houvesse me apaixonado por Marcela antes de conhecê-la, teria me encantado com sua beleza.
Todos viramos para olhar. Era algo ainda muito distante e não poderia ser identificado com facilidade. Para dizer a verdade achei que se tratava de uma miragem, pois aquele ponto não parecia em nada com um barco ou navio. Após olhar com mais atenção pude perceber que não se movia.
-- Vamos ver o que é. Talvez seja uma ilha – falei.
A possibilidade de encontrarmos algo que nos pudesse salvar nos deu novo ânimo. Por algum tempo esquecemos o cansaço, as dores pelo corpo, a fome e a sede e nadamos com o que ainda nos restava de disposição em direção àquele ponto.
Será que tínhamos encontrado uma ilha? Ou nossos sentidos estavam nos pregando uma peça? Não importava o que fosse, desde que pudesse nos salvar, o resto era tão somente um detalhe. Porém pouco a pouco, a medida que nos aproximávamos, aquilo foi ficando claro, mais nítido. Via-se a vegetação e o som das ondas quebrando. Ondas? Praia! Um som como aquele só pode vir de um litoral, seja ele qual for. “Então num é uma miragem”, foi a conclusão que cheguei. E de fato não restavam dúvidas: estávamos chegando numa praia. Bem, se era uma ilha ou a costa do litoral brasileiro não fazia a menor diferença, o importante era que estávamos a salvo. Quanto ao resto, quando chegássemos descobriríamos.





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