(Publicado na Revista Prática Jurídica, Editora Consulex, nº 29, de 31 de agosto de 2004)
ARBITRAGEM NA AMÉRICA DO SUL
ORGANIZAÇÃO DOS ESTADOS AMERICANOS – OEA
A ORGANIZAÇÃO DOS ESTADOS AMERICANOS - OEA tem sua origem remota na União Internacional das Repúblicas Americanas, criada para fazer frente aos Estados europeus colonialistas. A Organização dos Estados Americanos é fruto da resolução da IX Conferência sobre Problemas da Guerra e da Paz, realizada, no México, constituindo-se em organismo regional dentro da ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS - ONU. O Tratado foi assinado, em 30 de abril de 1948, no curso da IX Conferência Interamericana de Bogotá.
Rezam os artigos 23 e 24 que as controvérsias internacionais, entre os Estados-membros, deverão ser resolvidas pacificamente, de acordo com os processos previstos, nesse Documento. Distinguem-se a negociação direta, os bons ofícios, a mediação, a investigação e conciliação, o processo judicial e a arbitragem.
A nota relevante desse Tratado assenta-se na regra de que nenhuma divergência entre os Estados da América poderá ficar sem solução definitiva.
MERCOSUL
Tratado de Assunção
O MERCOSUL foi constituído pelo Tratado de Assunção , com o objetivo de constituir um mercado comum, cognominado Mercado Comum do Sul, fundado na reciprocidade de direitos e obrigações recíprocos.
Prevê esse Documento Internacional que as controvérsias entre as partes, em virtude da aplicação desse tratado, resolvem-se, mediante negociação direta. Em caso de malogro, os Estados-partes poderão submeter o dissídio ao Grupo Mercado Comum – GMC para, se for o caso, convocar painéis de especialistas ou peritos, com a finalidade de prestar-lhe o assessoramento técnico.
Estipula, ainda, o comprometimento das partes em adotar um sistema de solução de controvérsias para vigorar no período de transição.
Protocolo de Brasília
O Protocolo de Brasília, para solução de controvérsias, previsto no Anexo III, do citado Tratado, parte integrante deste Ajuste, determinava que as controvérsias entre as partes podiam ser resolvidas, por negociação direta ou por intervenção do Grupo Mercado Comum, se o dissídio não tivesse tido solução ou apenas parte dele se resolveu.
Se, entretanto, ainda assim, as partes não conviessem, qualquer delas podia comunicar à Secretaria Administrativa seu desejo de recorrer à arbitragem, minuciosamente disciplinada, no Protocolo citado.
Protocolo de Ouro Preto
O Protocolo de Ouro Preto assinalava que se submeteriam aos procedimentos traçados, no Protocolo de Brasília, as controvérsias, surgidas entre os Estados participantes, sobre a aplicação ou o descumprimento do Tratado de Assunção, dos acordos, das decisões do Conselho do Mercado Comum, das resoluções desse Grupo e das diretrizes da Comissão de Comércio do Mercosul.
Protocolo de Olivos
O Protocolo de Olivos para solução de controvérsias, no Mercosul, derroga, a partir de sua entrada em vigor, o Protocolo de Brasília e seu Regulamento, aprovado pela Decisão CMC 17/98.
A Argentina, o Brasil, o Paraguai e o Uruguai firmaram esse acordo, visando aperfeiçoar, em caráter definitivo, o sistema de solução de controvérsias entre os Estados participantes do MERCOSUL. Prevê a criação do Tribunal Permanente de Revisão, composto de 5 árbitros titulares e 5 suplentes, para mandato de 2 anos, renovável, por no máximo, dois períodos consecutivos. O quinto árbitro exercerá a função, por três anos, proibida a recondução, segundo procedimento descrito no artigo 18.
Os árbitros são juristas, de reconhecida competência, nas especialidades, sobre o que terão que decidir, bem como acerca das normas do Mercosul.
O Tribunal ad-hoc, composto de três árbitros, julga a discórdia entre as partes, quando se tornou impossível a solução, através da negociação direta ou da intervenção do GMC - Grupo Mercado Comum.
O Protocolo e o Regulamento disciplinam, minuciosamente, o processo e as diversas formas de solução da controvérsia, v.g.: a negociação direta, a intervenção do Grupo Mercado Comum, o procedimento arbitral ad-hoc e o recurso ao Tribunal Permanente de Revisão. , que funciona como segunda instância permanente.
João Grandino Rodas assinala que, a continuar o Mercosul, no ritmo atual, a médio e longo prazo, haverá, sem dúvida, a institucionalização dos órgãos julgadores.
Os laudos do Tribunal Arbitral Ad-Hoc e do Tribunal Permanente de Revisão serão adotados por maioria e deverão conter a fundamentação e ser assinados pelo presidente e pelos demais árbitros. Os árbitros deverão manter sigilo sobre seus votos e sobre as deliberações tomadas. Os votos dissidentes não poderão ser fundamentados. A arbitragem é de natureza confidencial.
Alejandro Daniel Perotti faz um interessante estudo sobre o terceiro laudo do Mercosul, referente à aplicação de medidas de salvaguarda sobre produtos têxteis (Resolução 861/99). O Brasil alicerçou sua posição em várias disposições do Tratado de Assunção.
COMUNIDADE ANDINA DE NAÇÕES
Guilherme Chahin Lizcano tece comentário, de invulgar interesse, sobre o novo Tribunal de Justiça da Comunidade Andina, antes denominado Tribunal Andino de Justicia del Acuerdo de Cartagena, o qual passara a ter novas funções, em vista das profundas reformas introduzidas, dentre as quais se distingue a função arbitral, não judicial, para solucionar conflitos, em virtude da aplicação ou interpretação de contratos, convênios ou acordos firmados entre os órgãos e instituições do sistema andino de integração, entre estes e terceiros, desde que as partes assim convierem. Também poderão utilizar-se da arbitragem os particulares, para dirimir os conflitos derivados dos contratos privados regidos por normas do ordenamento jurídico andino.
JURISPRUDÊNCIA DO MERCOSUL
** Para dirimir o conflito entre a República do Paraguai e a República Oriental do Uruguai, sobre a aplicação do IMESI (imposto específico interno para a comercialização de cigarros), foi constituído o Tribunal Arbitral Ad-Hoc, Mercosur, 2002/05/2002.
Decidiu o Tribunal, por unanimidade, que o Uruguai cesse a discriminação contra os cigarros paraguaios, tendo em vista tratar-se de país fronteiriço. Por maioria, mandou cessar os demais efeitos discriminatórios, no âmbito administrativo. Ainda, por unanimidade, estabeleceu o prazo de seis meses para o Uruguai cumprir a decisão arbitral. Funcionou como membro da Secretaria Administrativa o brasileiro Luiz Olavo Batista.
** Em 19 de abril de 2002, constituiu-se, a pedido da Argentina, o Tribunal Arbitral Ad-Hoc, para resolver o conflito entre esse país e o Brasil, acerca dos obstáculos opostos para o ingresso, no nosso país, de produtos fito-sanitários argentinos, em vista da não incorporação no direito interno brasileiro das Resoluções GMC 48, 87, 149 e 156, de 1996, e 71/98.
Decidiu o Tribunal, por unanimidade, invocando o Protocolo de Brasília e de Ouro Preto, que existe realmente omissão do Brasil, no que diz respeito à obrigação imposta pelos artigos 38 e 40 do Protocolo de Ouro Preto, no sentido de incorporar no ordenamento jurídico interno as citadas Resoluções, e ainda dispôs que, no prazo de 120 dias, a partir da data da notificação do presente laudo, o Brasil faça a incorporação das citadas Resoluções ao Direito interno.
De passagem por SP 5/8/2004 11:12:24