ROMA, sábado, 28 de abril de 2007 (ZENIT.org).- Publicamos esse sábado um guia para compreender e acompanhar melhor a V Conferência Geral do Episcopado da América Latina e do Caribe, que terá lugar em Aparecida (Brasil), de 13 a 31 de maio de 2007, junto ao Santuário Nacional de Nossa Senhora Aparecida.
O tema oficial da V Conferência, apontado pelo Papa Bento XVI, é Discípulos e missionários de Jesus Cristo, para que n’Ele nossos povos tenham vida – “Eu sou o Caminho, a Verdade e a Vida” (Jo 14,6)
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Especial Conferência de Aparecida: Rio de Janeiro e Medellín
ROMA, sábado, 28 de abril de 2007 (ZENIT.org).- Publicamos a seguir a primeira parte do «Especial Conferência de Aparecida», um guia para compreender e acompanhar melhor a V Conferência Geral do Episcopado da América Latina e Caribe.
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I Conferência Geral do Episcopado Latino-Americano – Rio de Janeiro (1955)
A primeira Conferência Geral do Episcopado Latino-Americano foi realizada no Rio de Janeiro (Brasil), em 1955. Os trabalhos se desenvolveram no Colégio Sacré Coeur, de 25 de julho a 4 de agosto.
A reunião eclesial fora convocada por iniciativa direta da Santa Sé. O organismo responsável por auxiliar o Vaticano na preparação do evento foi a CNBB (Conferência Nacional dos Bispos do Brasil), que havia sido criada em 1952 e teve como seu primeiro secretário, nesse período, Dom Hélder Câmara.
O Papa Pio XII enviou uma carta para ser lida na abertura da Conferência e que foi tomada como horizonte de orientação dos trabalhos dos bispos. Em seu texto, intitulado Ad Ecclesiam Christi, Pio XII faz um elogio à América Latina, afirmando acreditar que “dentro em pouco”, o continente Latino-Americano “possa achar-se em condições de responder, com vigoroso impulso, à vocação apostólica que a Providência divina” parece ter-lhe “designado”. Vocação essa de ocupar “lugar de destaque na nobilíssima tarefa de comunicar também a outros povos, no futuro, os ansiados dons da salvação e da paz”. [1]
Participaram das sessões de trabalho no Colégio Sacré Coeur os cardeais latino-americanos, exceto os dois da Argentina, devido a impedimentos causados pelo regime peronista. Congregaram-se 37 arcebispos e 58 bispos, que representavam 66 arquidioceses, 218 dioceses, 33 prelazias, 43 vicariatos e 15 prefeituras apostólicas. No total, a Assembléia seria composta de representantes diretos de 23 países, 60 províncias, 350 circunscrições eclesiásticas e 150 milhões de católicos. [2]
Presidiu a Conferência como legado pontifício o cardeal Adeodato Giovanni Piazza, secretário da Sagrada Congregação Consistorial, auxiliado por Dom Antonio Samoré, secretário da Congregação para Assuntos Eclesiásticos Extraordinários.
A Conferência do Rio de Janeiro teve como objetivo central de seu trabalho “o problema fundamental que aflige nossas nações, a saber: a escassez de sacerdotes”. [3] “A Conferência estima que a necessidade mais premente da América Latina é o trabalho ardoroso, incansável e organizado em favor das vocações sacerdotais e religiosas, e faz portanto fervoroso chamado a todos, sacerdotes, religiosos e fiéis, para que colaborem generosamente numa ativa e perseverante campanha vocacional”. [4]
Os bispos clamam a que todo o povo fiel tome consciência sobre a gravidade do problema e pedem que se empreguem as armas da oração e do apostolado para enfrentá-lo.
O ardente desejo da Conferência é que a obra de vocações sacerdotais seja considerada, em todas as dioceses, como obra fundamental, insubstituível, que deve preocupar a todos, e que merece uma atenção carinhosa e efetiva ajuda de todos. [5]
Outra preocupação assinalada pelos bispos foi a da instrução religiosa. Em conseqüência da escassez de sacerdotes, os conferencistas afirmam que falta aos povos latino-americanos a devida instrução, o que faz com que o tesouro da fé católica se veja ameaçado por numerosos inimigos, que tentam arrebatar a melhor herança da América Latina.
Os bispos apontaram também na Conferência do Rio de Janeiro “a deplorável condição de vida material” em que vive a grande maioria dos povos latino-americanos, condição essa que “põe em perigo o bem-estar geral das nações e seu progresso, e repercute forçosa e inevitavelmente na vida espiritual dessa numerosa população”. “Não obstante a multidão de bens que a Providência tem depositado” na América Latina, “nem todos desfrutam efetivamente de tão rico tesouro”. [6]
Os conferencistas destacaram ainda atenção aos temas do intenso processo de industrialização, da colaboração dos leigos, da população indígena, das Missões, da imigração e do apostolado do mar.
No final da Conferência, os bispos pediram a Pio XII a criação de um organismo que congregasse os episcopados de cada nação e unisse forças da Igreja na América Latina. Esse pedido recebeu aprovação pontifícia no dia 2 de novembro de 1955, quando se erigia oficialmente o CELAM (Conselho Episcopal Latino-Americano), que teria sua sede em Bogotá (Colômbia). Com o apoio e decidida animação do CELAM, entre os anos de 1956 a 1959 foi criada a maioria das Conferências Episcopais de cada país latino-americano.
II Conferência Geral do Episcopado Latino-Americano – Medellín (1968)
A segunda Conferência Geral do Episcopado Latino-Americano foi realizada em Medellín (Colômbia), em 1968.
Durante os três anos de duração do Concílio Vaticano II (1962-1965), os padres conciliares latino-americanos mantiveram várias reuniões do CELAM em Roma. Ali brotou a idéia de propor ao Santo Padre a realização da segunda Conferência Geral.
Em 1966 a presidência do CELAM apresentou a Paulo VI a proposta da nova Conferência. O pontífice a acolheu com satisfação e a convocou para se realizar em Medellín, de 26 de agosto a 6 de setembro de 1968.
Sob o tema “A Igreja na atual transformação da América Latina à luz do Concílio”, Medellín apresentou-se como uma releitura do Vaticano II para a Igreja na América Latina.
A Conferência foi inaugurada por Paulo VI na catedral de Bogotá, no dia 24 de agosto, por ocasião do XXXIX Congresso Eucarístico Internacional. Dela participaram 86 bispos, 45 arcebispos, 6 cardeais, 70 sacerdotes e religiosos, 6 religiosas, 19 leigos e 9 observadores não católicos, presididos pelo cardeal Antonio Samoré, presidente da Comissão Pontifícia para a América Latina, e por Dom Avelar Brandão Vilela, arcebispo de Teresina (Brasil) e presidente do CELAM. No total, participaram 137 bispos com direito a voto e 112 delegados e observadores. [7]
Em seu discurso inaugural, pronunciado no dia 24 de agosto em Bogotá, Paulo VI sublinhou a secularização, que ignorava a referência essencial à verdade religiosa, e a oposição – pretendida por alguns – entre a Igreja chamada institucional e a Igreja denominada carismática. O pontífice também evidenciou sua preocupação com os problemas doutrinários que se percebiam no imediato pós-concílio. Insistiu em promover a justiça e a paz, alertando diante da tática do marxismo ateu de provocar a violência e a rebelião sistemática, e de gerar o ódio como instrumento para alcançar a dialética de classes. [8]
Três foram os grandes temas de Medellín: Promoção humana; Evangelização e crescimento na fé; Igreja visível e suas estruturas. Foram produzidos 16 documentos, no horizonte dos três grandes temas citados: I – Justiça, Paz, Família, Demografia, Educação, Juventude. II – Pastoral popular, Pastoral de elites, Catequese, Liturgia. III – Movimentos de Leigos, Sacerdotes, Religiosos, Formação do Clero, Pobreza da Igreja, Pastoral de Conjunto, Meios de Comunicação.
Ganharam grande repercussão os documentos sobre a Justiça, a Paz e a Pobreza da Igreja. Diante da relevância e impacto desses documentos, elementos característicos de Medellín foram as reflexões sobre pobreza e libertação.
“O Episcopado Latino-Americano não pode ficar indiferente ante as tremendas injustiças sociais existentes na América Latina, que mantêm a maioria de nossos povos numa dolorosa pobreza, que em muitos casos chega a ser miséria humana.” [9]
“(…) para nossa verdadeira libertação, todos os homens necessitam de profunda conversão para que chegue a nós o “Reino de justiça, de amor e de paz”. A origem de todo desprezo ao homem, de toda injustiça, deve ser procurada no desequilíbrio interior da liberdade humana, que necessita sempre, na história, de um permanente esforço de retificação. A originalidade da mensagem cristã não consiste tanto na afirmação da necessidade de uma mudança de estruturas, quanto na insistência que devemos pôr na conversão do homem. Não teremos um continente novo sem novas e renovadas estruturas, mas sobretudo não haverá continente novo sem homens novos, que à luz do Evangelho saibam ser verdadeiramente livres e responsáveis.” [10]
Sobre a concepção cristã da paz, os bispos apontam três características: a paz, primeiramente, é obra da justiça, pois “supõe e exige a instauração de uma ordem justa na qual todos os homens possam realizar-se como homens, onde sua dignidade seja respeitada, suas legítimas aspirações satisfeitas, seu acesso à verdade reconhecido e sua liberdade pessoal garantida”. [11]
Em segundo lugar, a paz é uma tarefa permanente, pois “a paz não se acha, há que construí-la”, e o “cristão é um artesão da paz”. [12] Em terceiro lugar, a paz é fruto do amor, ou seja, “expressão de uma real fraternidade entre os homens”, fraternidade essa “trazida por Cristo, príncipe da paz, ao reconciliar todos os homens com o Pai”. [13]
Diante do quadro de injustiça e pobreza, os bispos afirmam que a missão pastoral da Igreja “é essencialmente serviço de inspiração e de educação das consciências dos fiéis, para ajudá-los a perceberem as exigências e responsabilidades de sua fé, em sua vida pessoal e social”. [14]
Já na Introdução das Conclusões de Medellín os bispos afirmam que “a Igreja latino-americana, reunida na II Conferência Geral de seu Episcopado, situou no centro de sua atenção o homem desde continente, que vive em um momento decisivo de seu processo histórico”. [15]
“Nessa transformação, por trás da qual se anuncia o desejo de passar do conjunto de condições menos humanas para a totalidade de condições plenamente humanas e de integrar toda a escala de valores temporais na visão global da fé cristã, tomamos consciência da vocação original” da América Latina: “a vocação de unir em uma síntese nova e genial o antigo e o moderno, o espiritual e o temporal, o que outros nos legaram e nossa própria originalidade.” [16]
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[1] Josep-Ignasi SARANYANA. “Cem anos de teologia na América Latina (1899-2001)”, em Coleção Quinta Conferência – História. São Paulo: Paulus/Paulinas, 2005, p. 53.
[2] Ibid., p. 55.
[3] Conselho Episcopal Latino-Americano. Documentos do CELAM: Conclusões das Conferências do Rio de Janeiro, Medellín, Puebla e Santo Domingo. São Paulo: Paulus, 2005, p. 20.
[4] Ibid., p. 20.
[5] Aloísio Cardeal LORSCHEIDER. A caminho da V Conferência Geral do Episcopado Latino-Americano e Caribenho: Retrospectiva histórica. Aparecida: Santuário, 2006, p. 9.
[6] Conclusões do Rio de Janeiro, op. cit., p. 24.
[7] Josep-Ignasi SARANYANA, op. cit., p. 82.
[8] Ibid., p. 82.
[9] Conclusões de Medellín, op. cit., p. 199.
[10] Ibid., p. 79.
[11] Ibid., p. 96.
[12] Ibid., p. 97.
[13] Ibid., p. 97.
[14] Ibid., p. 81.
[15] Ibid., p. 73.
[16] Ibid., p. 76.
ROMA, sábado, 28 de abril de 2007 (ZENIT.org).- Publicamos a seguir a segunda parte do «Especial Conferência de Aparecida», um guia para compreender e acompanhar a V Conferência Geral do Episcopado da América Latina e Caribe.
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III Conferência Geral do Episcopado Latino-Americano – Puebla (1979)
A terceira Conferência Geral do Episcopado Latino-Americano foi realizada em Puebla de los Ángeles (México), em 1979.
No fim de 1976, no transcurso da XVI Assembléia do CELAM, celebrada em San Juan de Puerto Rico, o cardeal Sebastião Baggio, então prefeito da Congregação para os Bispos e presidente da Pontifícia Comissão para a América Latina, anunciou que Paulo VI tinha a intenção de convocar a III Conferência Geral.
Os bispos acolheram com entusiasmo a notícia e iniciaram os trabalhos preparatórios ao evento eclesial. Paulo VI apontou como documento de referência a exortação apostólica Evangelii Nuntiandi, de 1975, na qual o pontífice analisava o que é evangelizar, qual é o conteúdo da evangelização, quem são os destinatários da evangelização, quem são seus agentes e que espírito deve presidi-la.
Paulo VI convocou oficialmente a III Conferência no dia 12 de dezembro de 1977, sob o tema “Evangelização no presente e no futuro da América Latina”. O pontífice assinalou que ela seria celebrada de 12 a 18 de outubro de 1978, mas o seu falecimento e o breve pontificado de João Paulo I fizeram com que a Conferência fosse adiada, até ter lugar de 28 de janeiro a 13 de fevereiro de 1979. Participaram 356 delegados, sendo previstos inicialmente 249, 221 dos quais eram bispos. [17]
A presidência da Conferência de Puebla esteve a cargo do cardeal Sebastião Baggio, prefeito da Congregação para os Bispos e presidente da Comissão Pontifícia para a América Latina; do cardeal Aloísio Lorscheider, arcebispo de Fortaleza (Brasil), presidente da CNBB (Conferência Nacional dos Bispos do Brasil) e presidente do CELAM; e de Dom Alfonso López Trujillo, arcebispo coadjutor de Medellín (Colômbia) e secretário-geral do CELAM.
João Paulo II inaugurou a III Conferência pessoalmente, com um discurso lido no Seminário Palafoxiano de Puebla. Essa foi a primeira viagem do Papa polonês à América e despertou o interesse de multidões. Seu discurso inaugural ditaria a marcha dos trabalhos da reunião eclesial.
O Papa assinalou em seu discurso que os bispos deveriam tomar como ponto de partida desta nova Conferência as conclusões de Medellín, “com tudo o que têm de positivo, mas sem ignorar as incorretas interpretações por vezes feitas e que exigem sereno discernimento, oportuna crítica e claras tomadas de posição”. [18] Reafirmou a indicação de que os bispos tomassem como pano de fundo da Conferência a Evangelii Nuntiandi.
João Paulo II afirmou que era “um grande consolo para o pastor universal constatar que vos congregais aqui não como um simpósio de peritos, não como um parlamento de políticos, não como um congresso de cientistas ou técnicos, por mais importantes que possam ser estas reuniões, mas como um fraterno encontro de pastores”. [19]
“Vigiar pela pureza da doutrina --indicava o Papa Wojtyla--, base da edificação da comunidade cristã, é, pois, junto com o anúncio do Evangelho, dever primeiro e insubstituível do pastor, do mestre da fé.”
O pontífice insistiu firmemente na transmissão da verdade sobre Jesus Cristo, no anúncio do nome, da vida, das promessas, do reino, do mistério de Jesus de Nazaré, “pois do conhecimento vivo desta verdade dependerá o vigor da fé de milhões de homens”.
Fez um chamado à fidelidade à Igreja, a uma antropologia fundamentada no Evangelho, ao serviço à unidade, à defesa da dignidade humana, ao cuidado da família, das vocações sacerdotais e religiosas e da juventude.
Puebla teve como preocupação básica: o que é evangelizar, hoje e amanhã, na América Latina? A missão fundamental da Igreja é evangelizar, hoje, aqui, de olhos abertos para o futuro. [20]
Em sua Mensagem aos Povos da América Latina, os bispos delegados afirmavam que uma das primeiras perguntas que surgiram na reunião eclesial foi: “Vivemos de fato o Evangelho de Cristo em nosso continente?” Apesar de reconhecer a existência de “grande heroísmo oculto” e “muita santidade silenciosa, confessavam que “o cristianismo, que traz consigo a originalidade do amor, nem sempre é praticado em sua integridade nem mesmo por nós cristãos”. [21]
Clamam então à conversão e à instauração de uma civilização do amor inspirada por Jesus Cristo, pois “o amor cristão ultrapassa as categorias de todos os regimes e sistemas, porque traz consigo a força insuperável do Mistério Pascal, o valor do sofrimento da cruz e as marcas da vitória e da ressurreição”. [22]
O documento conclusivo da Conferência de Puebla tem cinco partes, cujos títulos são: I Visão pastoral da realidade latino-americana; II Desígnio de Deus sobre a realidade da América Latina; III A evangelização na Igreja da América Latina: comunhão e participação; IV Igreja missionária a serviço da evangelização na América Latina; V Sob o dinamismo do Espírito: opções pastorais.
A primeira parte abre com uma visão da realidade latino-americana, que inicia com um olhar pelos cinco séculos da evangelização da Igreja. “Nosso radical substrato católico, com suas formas vitais de religiosidade, foi estabelecido e dinamizado por uma imensa legião missionária de bispos, religiosos e leigos.” [23]
Os bispos atentam para o fenômeno da desigualdade e da injustiça na América Latina, que gera uma situação de “pobreza desumana em que vivem milhões de latino-americanos”, fato visto como “escândalo e contradição com o ser cristão”. [24]
Aos imensos desafios à evangelização, que busca promover o encontro com Cristo para transformar um contexto de marginalização, desrespeito aos direitos humanos, subversão dos valores culturais, desagregação familiar e dos demais valores cristãos, os bispos pedem que se veja o rosto concreto do povo peregrino que sofre.
As feições das crianças, “golpeadas pela pobreza ainda antes de nascer”; dos jovens “desorientados por não encontrarem seu lugar na sociedade”; dos indígenas e afro-americanos “segregados”; dos camponeses, submetidos à exploração; dos operários, “que têm dificuldades em defender os próprios direitos”; dos desempregados; dos marginalizados e amontoados nas grandes cidades; dos anciãos, “postos à margem” por uma sociedade “que prescinde das pessoas que não produzem”. [25]
A segunda parte das conclusões apresenta o conteúdo da evangelização e o que é evangelizar. “Propomos agora anunciar as verdades centrais da evangelização: Cristo, nossa esperança”; a Igreja, “mistério de comunhão, povo de Deus a serviço dos homens”; o homem, “por sua dignidade imagem de Deus”.
Os bispos enfatizam que “a evangelização dá a conhecer Jesus como o Senhor que nos revela o Pai e nos comunica seu Espírito. Ela chama-nos à conversão que é reconciliação e vida nova, leva-nos à comunhão com o Pai que nos torna filhos e irmãos. Faz brotar, pela caridade derramada em nossos corações, frutos de justiça, perdão, respeito, dignidade e paz no mundo”. [26]
A terceira parte das conclusões de Puebla refere-se à evangelização da América Latina, por meio da comunhão e participação. Aborda a situação da família latino-americana, das paróquias e pequenas comunidades, do ministério hierárquico, da vida consagrada, dos leigos, da pastoral vocacional.
Os bispos apresentam a oração particular e a piedade popular, “presentes na alma de nosso povo”, como valores de evangelização. Apontam a liturgia como o “momento privilegiado de comunhão e participação para uma evangelização que conduz à libertação cristã integral, autêntica”. [27] Destacam o testemunho como “primeira opção pastoral”; a catequese, que permite “formar homens pessoalmente comprometidos com Cristo”. Citam ainda a educação e os meios de comunicação social como instrumentos imprescindíveis de promoção humana e auxílio à instauração do Reino de Deus.
Na quarta parte das conclusões de Puebla, que aborda o tema da Igreja missionária a serviço da evangelização, os bispos afirmam que “os pobres e os jovens constituem a riqueza e a esperança da Igreja na América Latina, e sua evangelização é, por conseguinte, prioritária”. [28]
A opção preferencial pelos pobres apontada por Puebla, na trilha de Medellín, “exigida pela escandalosa realidade dos desequilíbrios econômicos da América Latina, deve levar a estabelecer uma convivência humana digna e a construir uma sociedade justa e livre”. [29]
Ao mesmo tempo em que clamam a uma “necessária mudança das estruturas sociais, políticas e econômicas injustas”, os bispos em Puebla reafirmam que esta “não será verdadeira e plena, se não for acompanhada pela mudança de mentalidade pessoal e coletiva com respeito a um ideal duma vida humana digna e feliz, que por sua vez dispõe à conversão”. [30]
Já a opção preferencial pelos jovens implica apresentar a eles “o Cristo vivo, como único Salvador, para que, evangelizados, evangelizem e contribuam, como em resposta de amor a Cristo, para a libertação integral do homem e da sociedade, levando uma vida de comunhão e participação”. [31]
“A juventude não se pode considerar em abstrato, nem é um grupo isolado no corpo social. Por isso, ela requer pastoral articulada que permita comunicação efetiva entre os diversos períodos da juventude e continuidade de formação e compromisso depois, na idade adulta.” [32]
A quinta parte das conclusões de Puebla enfatiza a vertente sobrenatural da ação da Igreja, ou seja, que é a força de Deus que impele para a plenitude a sua Igreja. Nessa trilha, apresenta opções pastorais relacionadas em muitos aspectos com a promoção humana.
Os bispos afirmam optar por uma “Igreja-sacramento de comunhão”, que “oferece energias incomparáveis para promover a reconciliação e a unidade solidária dos nossos povos”; uma “Igreja servidora”, “que prolonga no decorrer dos tempos o Cristo-Servo de Javé através dos diversos ministérios e carismas”; uma “Igreja missionária”, “que anuncia alegremente ao homem de hoje que ele é filho de Deus em Cristo”. [33]
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[17] Josep-Ignasi SARANYANA, op. cit., p. 118.
[18] S. S. João Paulo II. “Discurso inaugural à III Conferência”, op. cit., p. 230.
[19] Ibid., p. 231.
[20] Aloísio Cardeal LORSCHEIDER, op. cit., p. 21.
[21] Conclusões de Puebla, op. cit., p. 283.
[22] Ibid., p. 288.
[23] Ibid., p. 293.
[24] Ibid., p. 299.
[25] Ibid., p. 300, 301.
[26] Ibid., p. 379.
[27] Ibid., p. 502.
[28] Ibid., p. 546.
[29] Ibid., p. 551.
[30] Ibid., p. 552.
[31] Ibid., p. 554.
[32] Ibid., p. 562.
[33] Ibid., p. 582.
ROMA, sábado, 28 de abril de 2007 (ZENIT.org).- Publicamos a seguir a terceira parte do «Especial Conferência de Aparecida», um guia para compreender e acompanhar a V Conferência Geral do Episcopado da América Latina e Caribe.
Esta terceira parte refere-se à Conferência de Santo Domingo
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IV Conferência Geral do Episcopado Latino-Americano – Santo Domingo (1992)
A quarta Conferência Geral do Episcopado Latino-Americano foi realizada em Santo Domingo (República Dominicana), em 1992.
João Paulo II a convocou oficialmente no dia 12 de dezembro de 1990, estabelecendo como tema “Nova evangelização, Promoção humana, Cultura cristã”, sob o lema “Jesus Cristo ontem, hoje e sempre” (Hb 13,8).
O CELAM fora o encarregado de preparar a Conferência, tendo divulgado o Documento de Consulta em 1991. Este, após as contribuições das Igrejas locais, transformou no Documento de Trabalho, base das discussões dos bispos e convidados.
A Conferência de Santo Domingo foi celebrada de 12 a 28 de outubro de 1992. Marcava-se no contexto da celebração dos 500 anos do início da evangelização no Novo Mundo. Ela teria três objetivos: celebrar Jesus Cristo, ou seja, a fé e a mensagem do Senhor crucificado e ressuscitado; prosseguir e aprofundar as orientações de Medellín e Puebla; definir uma nova estratégia de evangelização para os próximos anos, respondendo aos desafios do tempo. Entre bispos, peritos e convidados participaram cerca de 350 pessoas. Destas, 234 eram bispos com direito a voto. [34]
A América Latina passara por diferentes mudanças desde 1979. Havia-se alterado a situação política das repúblicas latino-americanas, passando de ditaduras de distinto matiz a regimes políticos mais ou menos democráticos. Constatara-se a derrocada do “socialismo real” e afirmava-se o neoliberalismo de cunho anglo-saxão. A violência do narcotráfico se estendia, em convivência com algumas guerrilhas. Nos anos 80 se acentuara a urbanização, evidenciando a miséria de grandes parcelas de população aglomeradas nas grandes cidades. [35]
Na Mensagem que os Bispos da IV Conferência dirigiram aos povos da América Latina, diz-se expressamente que a Nova Evangelização foi a idéia central de todo o trabalho da Conferência. Todos os fiéis, especialmente os leigos e os jovens, são convocados para a Nova Evangelização. [35]
“A IV Conferência Geral do Episcopado Latino-Americano quis traçar linhas fundamentais de um novo impulso evangelizador, que ponha Cristo no coração e nos lábios, na ação e na vida de todos os latino-americanos.” [36]
Em seu discurso inaugural, João Paulo II enfatizava que o chamado à nova evangelização é antes de tudo um chamado à conversão. “De fato, mediante o testemunho de uma Igreja cada vez mais fiel à sua identidade e mais viva em todas as suas manifestações, os homens e os povos poderão continuar a encontrar Jesus Cristo e, n’Ele, a verdade da sua vocação e da sua esperança, o caminho em direção à humanidade melhor.” [38]
Esta é a “nossa tarefa” – afirmava o Papa – “fazer que a verdade sobre Cristo e a verdade sobre o homem penetrem ainda mais profundamente em todos os segmentos da sociedade e a transformem”. [39]
João Paulo II explicava que “a nova evangelização não consiste num ‘novo evangelho’, que surgiria sempre de nós mesmos, da nossa cultura ou da nossa análise, sobre as necessidades do homem. Por isso, não seria ‘evangelho’, mas pura invenção humana, e a salvação não se encontraria nele”. [40]
“O Evangelho há de ser proclamado em total fidelidade e pureza, assim como foi conservado e transmitido pela Tradição da Igreja. Evangelizar é anunciar uma pessoa, que é Cristo”, afirmava o Papa Wojtyla. [41]
O Papa pedia uma especial atenção à catequese e à liturgia. Apontava como desafios o secularismo e o avanço das seitas. Pedia ainda um olhar especial ao clamor dos pobres, à família, à defesa da vida, às culturas indígenas e afro-americanas, aos meios de comunicação e à religiosidade popular. Destacava o “desafio formidável” da contínua inculturação do Evangelho.
A primeira parte das conclusões de Santo Domingo intitula-se “Jesus Cristo, Evangelho do Pai”. Abre com uma bela e profunda profissão de fé. Em seguida há um breve panorama dos 500 anos da primeira evangelização da América Latina.
A segunda parte, a mais longa das conclusões, redige-se sob o título “Jesus Cristo, Evangelizador Vivo em Sua Igreja”. Apresenta elementos que serviriam de base para concretizar a estratégia evangelizadora para os próximos anos.
Ao explicitar o termo “Nova Evangelização”, os bispos afirmam que se chama “Nova” em comparação àquela que fora uma primeira evangelização da América Latina, realizada nos últimos 500 anos.
“É o conjunto de meios, ações e atitudes aptos para pôr o Evangelho em diálogo ativo com a modernidade e o pós-moderno, seja para interpretá-los, seja para deixar-se interpelar por eles. Também é o esforço por inculturar o Evangelho na situação atual das culturas de nosso Continente.” [42]
Os bispos recordam primeiramente que a Igreja é comunidade santa, pela presença nela do Cordeiro que a santifica por seu Espírito, convocada pela Palavra a pregar o Evangelho. A Igreja santa, com seu ministério profético, encontra o sentido último de sua convocação na vida de oração, louvor e ação de graças que o céu e a terra dirigem a Deus, razão pela qual a liturgia é cume ao qual tende toda a sua atividade. [43]
No desafio de implementar a Nova Evangelização, Santo Domingo enfatiza que a religiosidade popular é expressão privilegiada da inculturação da fé. “Não se trata só de expressões religiosas, mas também de valores, critérios, condutas e atitudes que nascem do dogma católico e constituem a sabedoria de nosso povo, formando-lhe a matriz cultural”. [44]
Ao delinear o rosto de uma Igreja particular “viva e dinâmica”, os bispos afirmam que é indispensável “promover o aumento e a adequada formação dos agentes para os diversos campos da ação pastoral” e “impulsionar processos globais, orgânicos e planificados que facilitem e promovam a integração de todos os membros do povo de Deus, das comunidades e dos diversos carismas, e os oriente à Nova Evangelização, inclusive a missão ad gentes”. [45]
Os bispos alentam ainda a fazer da pastoral familiar “prioridade básica, sentida, real e atuante”; traçam linhas pastorais para a promoção do sentido de unidade da Igreja, o cuidado da formação permanente de bispos, presbíteros, religiosos, o trabalho vocacional e a vida nos seminários, o ministério dos leigos.
“Um laicato, bem estruturado com formação permanente, maduro e comprometido, é o sinal de Igrejas particulares que têm tomado muito a sério o compromisso da Nova Evangelização.” [46]
Ao recordar o compromisso missionário da Igreja latino-americano, Santo Domingo afirma que há carência de explícito programa de formação missionária na maioria dos seminários e casas de formação. Diante disso, pede às Igrejas particulares que se “introduza em sua pastoral ordinária a animação missionária, apoiada num centro missionário diocesano”. [47]
Ainda no contexto do anúncio do Reino a todos os povos, a IV Conferência afirma que o problema das seitas “adquiriu proporções dramáticas”. Assim, é preciso tornar “mais presente a ação evangelizadora da Igreja nos setores mais vulneráveis, como migrantes, populações sem atenção sacerdotal e com grande ignorância religiosa, pessoas simples ou com problemas materiais e familiares”. [48]
No capítulo dedicado à Promoção Humana, os bispos delegados da IV Conferência afirmam que “a falta de coerência entre a fé que se professa e a vida cotidiana é uma das várias causas que geram pobreza em nossos países”. [49] Portanto, “a promoção deve levar o homem e a mulher a passar de condições menos humanas para condições cada vez mais humanas, até chegar ao pleno conhecimento de Jesus Cristo”. [50]
Os prelados denunciam as violações aos direitos humanos pelo terrorismo, repressão, assassínios, pela “existência de condições de extrema pobreza e de estruturas econômicas injustas que originam grandes desigualdades”. Fazem especial denúncia “às violências contra os direitos das crianças, da mulher e dos grupos mais pobres da sociedade”. [51]
Nesse sentido, pedem uma promoção mais eficaz e corajosa dos direitos humanos, comprometida na defesa dos direitos individuais e sociais do homem. Os bispos afirmam também a necessidade de comprometer-se com a defesa da vida desde o primeiro momento da concepção até seu último alento. Pedem ainda a promoção da reconciliação e da justiça.
Ao falar de promoção humana, Santo Domingo apresenta ainda linhas pastorais para os temas da ecologia, da terra, do empobrecimento, “o mais devastador e humilhante flagelo que vive a América Latina e Caribe” [52], o tema do trabalho, da mobilidade humana, da ordem democrática, da nova ordem econômica, e da integração latino-americana. Para atuar junto a esses desafios é necessário “robustecer o conhecimento, difusão e prática da Doutrina Social da Igreja nos distintos ambientes”. [53]
No capítulo dedicado à Cultura Cristã, os bispos delegados afirmam que “podemos falar de uma cultura cristã quando o sentir comum da vida de um povo tem sido penetrado interiormente, ‘até situar a mensagem evangélica na base de seu pensamento, nos seus princípios fundamentais de vida, nos seus critérios de juízo, nas suas normas de ação’ e dali ‘projeta-se o ethos de um povo… nas suas instituições e em todas as estruturas’”. [54]
Segundo os bispos, “a inculturação do Evangelho é um processo que supõe reconhecimento dos valores evangélicos que se têm mantido mais ou menos puros na atual cultura; e o reconhecimento de novos valores que coincidem com a mensagem de Cristo”. [55]
“Uma meta da Evangelização inculturada será sempre a salvação e libertação integral de determinado povo ou grupo humano, que fortaleça sua identidade e confie em seu futuro específico, contrapondo-se aos poderes da morte, adotando a perspectiva de Jesus Cristo encarnado, que salvou a vida de todos partindo da fraqueza, da pobreza e da cruz redentora.” [56]
Santo Domingo cita entre os desafios a serem enfrentados pela inculturação do Evangelho a corrupção, a má distribuição de renda, as campanhas anti-natalistas, a deterioração da dignidade humana, o desrespeito à moral natural. Como linhas pastorais, incentiva trabalhar na formação cristã das consciências, zelar para que os meios de comunicação não manipulem nem sejam manipulados, a apresentar a vida moral como seguimento de Cristo, favorecer a formação permanente de clero e laicato, acompanhar pastoralmente os construtores da sociedade. Os bispos pedem ainda ações pastorais junto aos indígenas e aos afro-americanos.
Como desafios à Nova Evangelização, os bispos apresentam ainda a “ruptura entre fé e cultura, conseqüência do fechamento do homem moderno à transcendência, e da excessiva especialização que impede a visão de conjunto”. [57]
A terceira parte do texto conclusivo da Conferência de Santo Domingo apresenta-se sob o título “Jesus Cristo, vida e esperança da América Latina. Ali se descrevem as linhas pastorais prioritárias estabelecidas pela IV Conferência.
Os bispos comprometem-se em trabalhar em uma Nova Evangelização dos povos latino-americanos, à qual todos estão chamados, com ênfase na Pastoral Vocacional, com especial protagonismo dos leigos, mediante a educação contínua da fé e sua celebração, mediante a catequese e a liturgia, fortalecendo uma América Latina missionária para além de suas fronteiras.
Os prelados comprometem-se a lutar por uma promoção integral do povo latino-americano e caribenho a partir de uma evangélica e renovada opção preferencial pelos pobres, a serviço da vida e da família; uma evangelização inculturada que penetre os ambientes marcados pela cultura urbana, que se encarne nas culturas indígenas e afro-americanas, com eficaz ação educativa e moderna comunicação. [58]
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[34] Josep-Ignasi SARANYANA, op. cit., p. 147.
[35] Ibid., p. 148.
[36] Cardeal Aloísio LORSCHEIDER, op. cit., p. 42.
[37] Conclusões de Santo Domingo, op. cit., p. 620.
[38] S. S. João Paulo II. “Discurso inaugural à IV Conferência”, op. cit., p. 588.
[39] Ibid., p. 592.
[40] Ibid., p. 593.
[41] Ibid., p. 594.
[42] Conclusões de Santo Domingo, op. cit., p. 648.
[43] Ibid., p. 654.
[44] Ibid., p. 655.
[45] Ibid., p. 663.
[46] Ibid., p. 683.
[47] Ibid., p. 693.
[48] Ibid., p. 699.
[49] Ibid., p. 707.
[50] Ibid., p. 708.
[51] Ibid., p. 709.
[52] Ibid., p. 716.
[53] Ibid., p. 725.
[54] Ibid., p. 737.
[55] Ibid., p. 738.
[56] Ibid., p. 744.
[57] Ibid., p. 748.
[58] Ibid., p. 765, 766
Especial Conferência de Aparecida: Discípulos e missionários
ROMA, sábado, 28 de abril de 2007 (ZENIT.org).- Publicamos a seguir a quarta parte do «Especial Conferência de Aparecida», um guia para compreender e acompanhar a V Conferência Geral do Episcopado da América Latina e Caribe.
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Discípulos e missionários
A V Conferência Geral do Episcopado Latino-Americano e do Caribe terá lugar em Aparecida (170km de São Paulo – Brasil), junto ao Santuário Nacional de Nossa Senhora Aparecida, de 13 a 31 de maio de 2007.
O tema oficial da V Conferência, apontado pelo Papa Bento XVI, é Discípulos e missionários de Jesus Cristo, para que n’Ele nossos povos tenham vida – “Eu sou o Caminho, a Verdade e a Vida” (Jo 14,6).
Segundo o Documento de Participação da Conferência de Aparecida, distribuído às Igrejas locais para que dessem suas contribuições, o encontro com Jesus Cristo é a raiz e o ápice da vida da Igreja e o fundamento do discipulado e da missão.
“A V Conferência nos oferece uma nova oportunidade para refletir sobre a profundidade de nosso encontro com Jesus Cristo vivo; e para perguntar em nossas comunidades a respeito da transformação de nossa vida que o Espírito do Senhor realizou em nós pelo encontro com Jesus, a respeito da coerência de nossa identidade católica e da autenticidade de nossa vida cristã, e a respeito da intensidade de nosso ardor missionário, examinando se anunciamos e damos testemunho daquele que é o Caminho e a Vida para aqueles que estão distantes dele ou ainda não o conhecem, embora o busquem.” [59]
O cardeal Cláudio Hummes, prefeito da Congregação para o Clero, em um livro intitulado “Discípulos e missionários de Jesus Cristo” [60], explica que a atitude fundamental do discípulo é ouvir. «Sentar-se diante do Mestre e ouvir, como que extasiado. Ouvir de coração aberto. Sem barreiras, deixar-se invadir pelas palavras do Mestre». [61]
Segundo o prefeito da Congregação para o Clero, nós somos discípulos de Jesus desde o nosso batismo. «Fomos levados à pia batismal, quase todos ainda na fase de crianças recém-nascidas. Ali tornamo-nos filhos de Deus e discípulos de Cristo. Começamos a ouvir falar dele, ainda nos joelhos de nossos pais. Num daqueles dias da nossa primeira infância, nossa mãe ou nosso pai nos mostrou o crucifixo da casa e disse: “Este é Jesus”. Foi um momento extraordinário em que pela primeira vez fomos apresentados pessoalmente a Ele». [62]
«Portanto --afirma o cardeal--, para sermos missionários e missionárias, hoje, será importante reavivar em nós o ser discípulo de Jesus. Isso significa sentar-nos diante dele e ouvi-lo. Deixar-nos encantar por Ele. Abrir-nos e deixar-nos invadir por Ele. Ouvi-lo como se fosse a primeira vez que temos a felicidade de estar com Ele e ouvi-lo. Deixar que o estupor e o assombro pela sua pessoa, suas palavras e atitudes inundem nosso coração. Deixar-nos envolver de novo pessoalmente com Ele e com seu projeto de salvação do mundo. Isso significará que, ouvindo a Jesus Cristo, teremos de ouvir também com Ele a realidade humana, os seres humanos e todos os seus dramas, sofrimentos, esperanças e aspirações». [63]
Já o secretário-geral da V Conferência, Dom Andrés Stanovnik, O.F.M. Cap., bispo de Reconquista (Argentina) e secretário-geral do CELAM (Conselho Episcopal Latino-Americano), falou em entrevista exclusiva a Zenit sobre o tema da Conferência de Aparecida.
«A dinâmica das relações entre as pessoas responde a aspectos profundos da natureza humana. Jesus Cristo, ao assumi-la e redimi-la, outorgou-lhe beleza e transcendência. O autêntico encontro humano leva sempre à abertura e à missão. Por isso, o discípulo que se encontra com Jesus Cristo se transforma em discípulo missionário. Não pode existir um autêntico discípulo que não seja missionário, como tampouco pode o ser humano amadurecer se não se abre aos demais. O crente experimenta que sua condição humana se transforma e enriquece pelo encontro com Jesus Cristo vivo. O tema de Aparecida é um convite a viver a experiência desse encontro e abrir-se à missão», afirmou o bispo. [64]
Segundo Dom Andrés Stanovnik, «o Santo Padre Bento XVI nos entregou o tema da V Conferência, e a primeira parte do tema diz: ‘Discípulos e missionários de Jesus Cristo’. É um forte chamado às Igrejas que peregrinam pela América Latina e pelo Caribe a encontrarem-se mais intensamente com Jesus Cristo. A Igreja, esposa de Cristo, está chamada, através do acontecimento da V Conferência, a encontrar-se mais com Ele». [65]
«Nesse sentido --destaca o secretário-geral da V Conferência--, o encontro de Aparecida é um novo impulso do Espírito Santo à Igreja, para que se encontre mais com seu Senhor e, transformada por Ele, seja mais missionária. A Igreja não pode ser missionária se não é discípula, se não renova constantemente a atitude de colocar-se como discípula diante de seu Senhor e Mestre. Para que os discípulos e discípulas sejam verdadeiros missionários, devem voltar sempre aos pés do Mestre, para estar com Ele, aprender dele, e entrar em profunda amizade e comunhão de vida com Ele.» [66]
«A missão se destaca na frase seguinte do tema de Aparecida: ‘para que n’ Ele nossos povos tenham vida’. Esta frase expressa a finalidade da Igreja: ela existe para a missão. Por isso, todo discípulo e discípula na Igreja está chamado a ser missionário. Daí também surge o motivo que reúne aos bispos na V Conferência, é a evangelização do continente em tempo atual», explicou o bispo. [67]
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[59] Conselho Episcopal Latino-Americano. Documento de Participação: Rumo à V Conferência do Episcopado da América Latina e do Caribe. São Paulo: Paulus/Paulinas, 2006, p. 36.
[60] Cardeal Cláudio HUMMES. Discípulos e missionários de Jesus Cristo: ser cristão no mundo atual. São Paulo: Paulus, 2006.
[61] Ibid., p. 14.
[62] Ibid., p. 16.
[63] Ibid., p. 19.
[64] ZENIT, Agência Internacional Católica de Notícias. A beleza da V Conferência do Episcopado Latino-Americano. Disponível em:
[65] Ibid.
[66] Ibid.
[67] Ibid.