Entrevista ao filósofo Vicente Ramos Centeno, autor de «Europa e o cristianismo»
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MADRI, quinta-feira, 26 de julho de 2007
O futuro da Europa e a «saúde da razão» passam pelo cristianismo como motor de cultura e história.
Afirma isso nesta entrevista Vicente Ramos Centeno (São Juan de la Cuesta, Zamora, 1947), doutor em filosofia e autor do recente livro «Europa e o cristianismo», publicado na coleção «Estudos e Ensaios de Filosofia e Ciência», da Editora BAC.
Professor de Filosofia em um Instituto de Bacharelado, Ramos Centeno trabalhou, em Madri, no Instituto Imperatriz Maria da Áustria.
– A Europa nada no «mar amargo da desolação espiritual», lê-se em seu livro. Estamos tão mal assim?
– Ramos Centeno: Neste meu juízo sobre a situação do espírito em nossa Europa, não inventei grande coisa. Perceba que não penso sozinho, mas em diálogo com autores que já nos avisaram há tempos sobre o que vinha, desde Nietzsche, Husserl, Ortega ou Simone Weil.
Hoje estamos no tempo do niilismo realizado. Bento XVI falou da «ditadura do relativismo» que dirige os espíritos e de que a Europa corre o risco de «despedir-se da história».
O ateísmo niilista está instalado no poder intelectual. Já não há um ateísmo humanista, mas um laicismo agressivo e bárbaro.
Não há pensadores que o perceberam e queiram pensar essas coisas que ocorreram desde 1989: o desaparecimento do socialismo como possibilidade real, o anti-semitismo crescente, a barbárie islâmica.
Nosso mundo é plebeu, é o tempo da aniquilação do que os homens amavam e daquilo em que acreditavam, o tempo da falsificação da história e do desprezo do homem.
Os filósofos mais oficiais de hoje vivem instalados na morte de Deus e até na não menção de Deus.
Naturalmente, meu juízo se refere à «cultura oficial», aos mandarins intelectuais, mas existem também os amantes da razão e da esperança cristã; não desapareceu, claro está, o sal da terra.
– O cristianismo voltará a ser na Europa o mais importante gerador de história e de cultura?
– Ramos Centeno: Não sei se voltará a ser. Digo que deveria voltar a ser, e isso espero. Estão em jogo o futuro da Europa e a saúde da razão.
Os cristãos também não devem conformar-se com ser as vítimas de futuros extermínios.
O cristianismo, que diz Bloch que é altivez e vontade de não se deixar tratar como gado, deve passar já à ofensiva. A ele corresponde hoje salvar o que é valioso da modernidade, roubar toda a verdade que pode haver na modernidade e no mundo contemporâneo para construir outra cultura.
Se o cristianismo lutou contra os totalitarismos, hoje deve fazê-lo contra o niilismo.
Já Simone Weil viu que o laicismo era obscurantista e totalitário. E Tocqueville disse: «O despotismo passa sem a fé, a liberdade não». A palavra de Cristo não pode tampouco chegar ao povo nesta cultura niilista e bárbara.
– O que quer dizer que só um cristianismo «absolutamente fiel» à fé bíblica e à razão pode ser a alma da Europa?
– Ramos Centeno: Eu falo de um cristianismo «fiel, absolutamente fiel, à sua raiz bíblica e à sua longa história de amizade com a razão». O capítulo terceiro do livro se titula «O cristianismo, Israel e Europa». Volto a propor nele o problema do anti-semitismo e as acusações atuais à teologia católica como origem do mesmo.
Eu rejeito essas acusações e explico o anti-semitismo atual como ódio ao povo através do qual conhecemos Deus e defendo, com a Pontifícia Comissão Bíblica e com João Paulo II, que o cristianismo não pode esquecer-se de sua origem. Mas, por outro lado, tampouco aceito a tese de hoje de que é preciso voltar a Jerusalém esquecendo Atenas.
O cristianismo não deve nem pode renunciar à razão nem à inculturação na cultura greco-latina.
– Quais são alguns sinais concretos de esperança na Europa?
– Ramos Centeno: Em primeiro lugar, o testemunho dos santos e mártires do século XX, tantos, por exemplo, em nossa Espanha, que não se conformam com a morte de Deus.
Os totalitarismos caíram, na Europa há um impulso para a unidade e uma busca de algo novo.
Tomamos consciência de que efetivamente «o reino da razão cresceu em meio do reino de Deus». Nós podemos ser (o niilismo já não dá nada) os verdadeiros herdeiros do melhor de nossa história e da modernidade.
O ocorrido com os países do Leste nos anima. Sabemos também que Cristo é o Senhor da história. Meu livro termina com esta expressão bíblica: Marán athá!