Instaurado processo de canonização de religiosa que viveu no interior de São Paulo
Por Alexandre Ribeiro
TREMEMBÉ, domingo, 7 de fevereiro de 2010
ZENIT.org
“O Carmelo é um vergel de santos. Se quiser ser santo, entre num Carmelo”. Com alegria e bom humor, as carmelitas de Tremembé (135 km de São Paulo) anunciaram a introdução da Causa de Canonização de Madre Maria do Carmo da Santíssima Trindade.
Neste domingo, 7 de fevereiro, o bispo de Taubaté, Dom Carmo João Rhoden, preside à cerimônia de introdução da Causa de Madre Maria do Carmo, conhecida como Carminha de Tremembé, fundadora do Carmelo Santa Face e Pio XII, onde hoje vivem 19 carmelitas, nessa cidade do Vale do Paraíba, interior do Estado de São Paulo.
Ao descrever o Carmelo como um “vergel de santos”, Madre Thereza Maria, uma das responsáveis pelo processo de canonização, não exagera. Santa Teresa d’Ávila, São João da Cruz e Santa Teresinha do Menino Jesus, para recordar três, são santos carmelitas doutores da Igreja.
Mas qual é a alegria de viver num Carmelo? “É viver para Ele, viver para Jesus”, respondem com sorrisos nos lábios, quase em coro, as cinco religiosas que receberam ZENIT na semana passada para conversar sobre sua Madre fundadora.
Madre Maria do Carmo (Carmen Catarina Bueno) nasceu em Itu, interior de São Paulo, a 25 de dezembro de 1898. Aos 18 anos, foi noiva. Mas, ao ingressar em um renomado colégio religioso em São Paulo, que o noivo, de família rica, indicara para que aprimorasse seus conhecimentos e se preparasse para o matrimônio, deu seu sim à vocação religiosa.
No colégio em São Paulo, em meio aos estudos humanísticos e ao amor pela literatura e poesia, depara a “História de uma Alma”, da futura Santa Teresinha. Então decide ser como a jovem de Lisieux, carmelita.
Em 1926, aos 27 anos, Carminha ingressa no Carmelo São José, no Rio de Janeiro. Ali exerce o papel de mestra de noviças, sub-priora e priora. Em 1955 deixa o Rio para ir fundar o Carmelo da Santa Face e Pio XII, em Tremembé.
Sob sua liderança e determinação, em dois anos, uma ala e meia do mosteiro estava construída. Em mais alguns anos toda área já estaria estruturada, com capela, refeitório, jardins e chácara.
Ali desenvolve sua vida em oração e humildade, virtude destacada pelas religiosas que conviveram com ela. Dedicou grande atenção à formação do noviciado e ao cuidado das irmãs de comunidade.
Em letra firme e bela, exprimiu em poemas, durante toda vida, a sofisticação de seu espírito e a total entrega ao amor de Deus.
Ao refletir sobre a morte, confessou em soneto: “Não posso mais, ó Deus meu Pai, sofrer / do céu a nostalgia que consome... / o anseio torturante de vos ver / é gozo que crucia, é dor sem nome! / Se apenas um vislumbre de prazer, / do amor que se revela e que não dorme, / o exílio transfigura e o padecer... / que então será, no Céu, saciar a fome” (...).
Madre Caminha morreu em 1966, acometida de derrame cerebral. Tinha 67 anos. Sua fama de santidade extrapolou a clausura do Carmelo em 1972. Havia o projeto de mudar o mosteiro para a cidade de Mairinque (São Paulo). Seu túmulo foi aberto e constatou-se a conservação do corpo.
“Parecia a tarde do enterro”, conta Madre Teresa Margarida, priora do Carmelo. “Até as flores estavam conservadas”, recorda a priora, que conviveu durante 10 anos com Madre Carminha.
A partir desse episódio, a fama de santidade se espalhou pelos Carmelos e comunidades. O povo de Tremembé se mobilizou e impediu que o corpo e o mosteiro completo mudassem de cidade.
Um depoimento gravado do médico que acompanhou a exumação revela sua surpresa: “Estou profundamente emocionado”, disse o Dr. Mário Degni, da Universidade de São Paulo.
No entanto, os próprios técnicos que procederam à exumação indicaram que o corpo fosse recolocado na sepultura, deixando duas aberturas, por onde ventilasse o ar, para ver se se desfazia. De fato, o corpo foi-se desfazendo, o que se constatou em exumações posteriores.
A indicação de Igreja, porém, “é não mexer”, explicou Madre Thereza Maria, que reconhece que, por desinformação, houve um erro ao fazer as aberturas no caixão.
Mas a posterior decomposição do corpo não comprometeu a devoção. O fiéis passaram a se dirigir cada vez mais à intercessão de Madre Carminha em pedidos de cura e bênçãos de Deus.
Segundo as carmelitas de Tremembé, há dois casos de milagres que já poderiam integrar o processo de canonização: o de um recém-nascido curado de uma luxação congênita no joelho (hoje uma criança de dois anos que corria pelo jardim do Carmelo um dia antes de ZENIT visitar as religiosas). E o caso de um adulto que, já desenganado pelos médicos, foi curado de peritonite aguda. Hoje é um senhor que propaga a devoção a Madre Carminha.
Deus sabe se no futuro o nome de Madre Carminha de Tremembé constará no vergel de santos do Carmelo. Mas o que a Igreja sabe é que a cada dia aumentam os fiéis que se dirigem à madre poetiza, que viveu a humildade no claustro.
De Carminha de Tremembé permanecem a fama de santidade, os belos poemas, o testemunho de vida. E também algo que, de certo modo, fica de toda religiosa de clausura, cujo testemunho fortalece a esperança e alimenta o mundo de amor.
Uma vida clarividente, refletida em versos. Escreve Carminha: “Um terno olhar de Deus em mim poisando / e do Carmelo eu vim bater à porta, / entre risos e lágrimas sonhando / ser – hóstia de Jesus, ou viva ou morta... / Custou-me o sacrifício... mas que importa, / se a dor que mora na alma vai cantando? / Se os olhos jorram pranto? A fé transporta / além e faz sorrir quem sofre amando... / Hóstia de expiação... hóstia a cantar / a loucura da cruz e o Amor supremo / que da terra meu ser desprende e arranca... / Corpo de Luz – sacrário a custodiar / na solidão, na prece e zelo extremo / minha alma – Hóstia eternamente branca!”