O Evangelho não explicita seu nome, onde morava, o que fazia... Mas fala de “certa mulher”, talvez para amenizar o estigma que carregava há doze anos e a atormentava dia e noite, noite e dia, no corpo, na alma e no coração.
A hemorragia da qual fora acometida fizera com que com que passasse pelas mãos de vários médicos, gastando tudo o que possuía, inclusive a esperança que se esvaía com a possibilidade, cada vez mais distante, de uma cura efetiva que a permitisse viver outra vez.
Perdera tudo, mas não perdera a fé. Mesmo sabendo das conseqüências excludentes e marginalizantes pelas quais passava, não se deixava abater, não se deixava vencer, pois sentia no mais profundo do seu ser, que um raiozinho tênue de sol um dia haveria de iluminar novamente a sua vida.
Nós que estamos de fora, vivemos uma outra realidade e uma outra cultura, não temos a mínima capacidade de avaliar a desarmonia dos sentimentos, das emoções e da afetividade desta mulher. Chamá-la-ei a partir de agora pelo nome de Verônica.
A Lei era severa; o seu descumprimento, mortal. “Quando uma mulher tiver um fluxo de sangue por diversos dias fora do tempo das suas regras ou se as suas regras se prolongarem, estará durante toda a duração do fluxo, no mesmo estado de impureza em que esteve durante o tempo de suas regras. Assim será para todo o leito sobre o qual ela se deitar durante todo o tempo do seu fluxo, como o foi para o leito em que se deitou quando das suas regras. Todo o móvel sobre o qual se assentar ficará impuro, como quando das suas regras. Quem os tocar ficará impuro” (Lv 15,25-27).
Se fosse casada, de que maneira viveria esta situação? Um beijo, um abraço, um carinho, tornava-se um desejo reprimido não apenas diante daquele homem que ela amava tanto, a ponto de tomá-lo por marido, mas diante do pai, da mãe, dos irmãos, dos amigos, da família... Não poder tomar nos braços o fruto que ela gerara num ato de amor intraduzível, o filho, que crescera e ela nem se dera conta, porque a doença a consumia e Verônica não tivera olhos para vê-lo crescer; a humilhação de não ver tocado o lugar que ela tocara, o talher que ela usara, o banco onde sentara, o leito onde deitara e amara, e amara, e amara... A sua impureza tornava tudo impuro, menos a sua fé, seu restinho de esperança, menos o seu “amor que era mais forte do que a morte”.
O que a diferenciava de muitos é que “ela tinha ouvido falar de Jesus”. Vendo-o passar acompanhado de numerosa multidão, não se intimidou. Dizia de si para si: “Se ao menos tocar as suas roupas, serei salva”. Nunca passara pela sua cabeça deixar-se vencer por aquele número prodigioso de pessoas. Um fato apenas a incomodava: se alguns daqueles a reconhecessem e apontassem para ela, denunciando, de certa forma, o estigma que carregava. Mudou de pensamento. Respirou fundo, encheu-se de coragem, quebrou a última barreira que desejava subjugá-la “e aproximou-se de Jesus - por detrás - no meio da multidão e tocou-lhe a roupa. E logo estancou a hemorragia. E ela sentiu no corpo que estava curada do seu mal”.
No princípio o espanto que durou alguns minutos e que parecia tomar ares de eternidade. Depois a constatação real, verdadeira, evidente, de que a hemorragia desaparecera de maneira total. O toque da fé fora suficiente para a realização da cura de Verônica.
Sentimentos e moções são traduzidos de diversas formas; porém, a forma que expressa mais profundamente o que está escrito na alma, não se traduz por palavras nem gestos, mas pelas lágrimas que nascem de olhos sofridos e escorrem feito pérolas pelas faces sugadas daquela que nunca perdera a FÉ. Lutara até contra si mesma e saíra vencedora.
Abraçar, beijar o seu amado; encantar-se dos encantos do seu leito conjugal; tomar no colo o filho de suas entranhas depois de doze anos de sofrimento e exclusão; poder cumprimentar a família, os amigos; freqüentar lugares antes proibidos... Realmente só poderia ter sido obra de Jesus.
Você que carrega no corpo e na alma quaisquer tipos de doença, e que um dia já ouviu falar de Jesus e das curas e milagres que é capaz de realizar, descruze os braços,erga-se do seu comodismo,, exercite a sua fé, reavive a sua esperança, porque Jesus está vivo e vive no meio de nós, e no nosso meio quer realizar as maravilhas que realizou há dois milênios atrás.
Verônica aproximou-se por detrás e tocou as roupas te Jesus. A Lei Antiga foi levada à perfeição. Por causa disso você pode aproximar-se de Jesus pela frente,
E hoje é Jesus que quer tocar você através do Sacramento da Eucaristia – o sinal mais perfeito e mais presente do Amor de Deus no meio de nós. Alimento que percorre todo o nosso corpo, alma e coração, e nos restaura, e nos cura, e nos liberta, e nos faz homens e mulheres novos, em Jesus.
Acredite, confie, creia, nunca perca a esperança; lute, não entregue os pontos. Não importa quando ou como, o que importa é que Jesus quer fazer uma obra nova em tua vida como fez a obra na vida de Verônica, aquela “certa mulher”. Lembra?
Agora um segredo: na Eucaristia Jesus não vai perguntar em voz alta para que todos possam ouvir, “quem me tocou, pois senti que saiu de mim uma força?”
Vendo a tua fé, ele poderá sussurrar ao teu coração: “Meu filho, minha filha, eu te toquei; mas foi a tua fé que te salvou. Vai em paz e estejas curado, estejas curada do teu mal”. São palavras e gestos que curam o corpo, a alma e o coração.