Perdeu o interesse pela vida. Deixou a barba crescer, andava maltrapilho e sujo, comia o que lhe davam, pedia esmolas nos sinais de trànsito, não respondia os cumprimentos dos amigos e, até mesmo as bênçãos fervorosas da mãe já não lhe comoviam.
Murmurava frases desconexas tipo: a abelha roxa botou um ovo cónico no galho mais alto da pimenteira; O gas carbónico limpou a barra da saia da velha pirata do Caribe nacional ou, então, Getúlio e Napoleão estão dançando um fandango sincopado no forró do arraiá de São João.
Os médicos diziam: é falta de lítio; é psicose; é doença mental grave...
Os que não entendiam de medicina comentavam a boca pequena: ele é gay e não tem coragem de assumir; foi decepção amorosa, a noiva dele deu-lhe um fora.
Escrevia em folhas soltas de papel e depois as arremessava ao vento: era cultura espalhada pelo asfalto, uma cultura atrapalhada, é bem verdade, mas sempre cultura.
Numa manhã de sol, entretanto, viran-no barbeado, limpo, acompanhado de sua incansável mãe, conversando alegremente coisas inteligíveis.
Sem lítio, sem tratamento, misteriosamente, os fios religaram no seu cérebro, voltou a ter apetite voraz pela vida, cujmprimentando os amigos, passeando com a noiva, abençoado pela bondade divina.