Quando ouvi a notícia da morte de Ronald Reagan, não pude resistir a pensar na sorte extraordinária que este homem teve na sua vida. Nascido em família modesta, Ronald Reagan foi só sair do ginásio que encontrou emprego como radialista; depois, como salva-vidas; logo mais, como entregador de telegramas; foi andando pela vida, de emprego em emprego, até que acertou com o primeiro grande trabalho - o de ator de cinema, categoria B (em filmes do mesmo código). Daí, para o palco maior, a Casa Branca, foi um salto - pulou lá pra dentro e aterrissou de pé.
Não consegui deixar de pensar na semelhança entre a morte dele e aquela que foi narrada pelo Jorge Amado no A morte e a morte de Quincas Berro D Água . Porque em ambas as vidas - guardadas as infinitas proporções entre os dois homens, o Quincas e o Ronnie - as mortes foram mais ou menos semelhantes. A primeira morte de ambos foi bem escondida - Ronald Reagan foi literalmente afastado dos olhos públicos, há dez anos atrás, quando reconheceu sua doença. Fizeram com que ele sumisse do radar. A família do Quincas fez a mesma coisa - não deixou que ninguém soubesse que o homem tinha morridos de uma grande bebedeira.
O Ronald estava vivo, lá no palácio dele, mas para o mundo, ele deixou de falar, de pensar, de existir. Só a família sabia dele.
Finalmente, veio a morte orgànica. Sem apelo - ninguém pode esconder mais nada. - O Quincas foi enterrado pela família, como se recém tivesse morrido. E foi só depois que a família do Quincas deu o sim , é que o homem foi declarado morto. - Foi só quando a dona do Ronnie disse sim , é que o semimorto apareceu como morto.
Há dez anos que RR já não participava de coisa nenhuma e nem sabia mais quem era. Sua cabeça já estava pra lá de Bagdá há muito tempo.