Lido com palavras o dia inteiro. Faz parte do meu trabalho. Além disto, gosto de palavras. Então, não só trabalho com elas, as palavras, como brinco também. E converso sobre elas, é tema de bato papo com alguns colegas - e a vida das palavras vai se incorporando à minha, sem mais.
Ontem tive um papo com um diletante em linguística (meu computador não tem trema para o u desta palavra). Ele me dizia que as palavras proparoxítonas são condizentes com efeitos agressivos - como áspero , facínora - e citou uma fornada de palavras acentuadas na antepenúltima sílaba...
Em contrapartida, recusando sua teoria, que me parecia absurda, comentei:
-- Olha só, o que você me diz então de uma palavra tão delicada como pétala ? E a mais linda de todas, ainda que não a usemos (seria mais usada em Portugal?), a linda, gostosa palavra: ÓSCULO. É uma palavra doce, ainda que proparoxítona. Para pronunciá-la temos de abrir e fechar os lábios... exatamente como fazemos para praticá-la. Ósculo, ósculo...
Enquanto eu estava dizendo isto, passou um colega espanhol... Ora, ora, pra quê... Logo foi perguntando, com um sorriso sacana:
-- ?Qué dijo Ud.? - Qué dijo Ud.... repítalo, por favor, pero despacio... despacito...
Não faltam despachados neste mundo. Mas despachei-o com um olhar que só sei fazer em horas assim...ora, vejam só, que petulància a dele... como se já não bastasse a ignorància do amador de idiomas, agora me apareceu o estudioso de ósculos... (em espanhol as duas últimas sílabam redundam em termo escatológico).
Nós nos dispersamos em seguida. Senti uma pétala vermelha em cada face... espontaneamente fico assim em situação como essa ... não pelo hispano ter tentado me embaraçar, mas sim por eu lhe ter passado um pito mudo, olhando bravo para ele.
E vim pra casa... sem dar nem receber nenhum ósculo...